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Críticas

Cineplayers

Quando Larrain encontra Ben Affleck.

7,5

No (idem, 2012) tem uma linha de narração que muito se assemelha ao recente Argo (idem, 2012), de Ben Affleck. Os roteiros de ambos se casam por meio de passagens parecidas e de elementos de dramatização idênticos. Extraídos de uma fórmula pouco arriscada, os dois contam histórias verídicas por meio de herois individuais que, de alguma forma apoiados em famílias momentaneamente descontruídas, conseguirão êxitos aparentemente impossíveis.

Dentro desta receita, contextualizam o espectador com cenas reais em meios às ficcionais, trazem informações históricas, criam momentos de drama com liberdade em relação aos fatos - assim podem trazer falas mais cinematográficas para o andamento do que é contado - e, ainda, acrescentam humor de tanto em tanto tempo para refrescar a plateia durante um filme sério, tenso, mas capaz de ser leve quando, sabe-se lá por que, julgaram necessário. Por esses motivos, apesar de bons filmes, os dois sucumbem em parte a uma olhada mais criteriosa.

Em No, Pablo Larrain conta o plebiscito convocado pelo governo do ditador Augusto Pinochet, em 1988, para dar uma falsa aparência de legitimidade popular ao seu governo autoritário. O referendo, aliás, fora convocado apenas como forma de arrefecer as pressões internacionais e mostrar que o povo concordava com o governo dele. O que ninguém esperava, nem mesmo os partidários do Não, era que a propaganda fosse capaz de despertar na população a sensação da chegada de novos tempos. Assim, abria-se a porta para a derrubada do governo ditatorial. E, enfim, o começo de um novo Chile, como pregavam os jargões vendidos pelo publicitário René, interpretado por Gael García Bernal.

Profissional novo e de relativo sucesso, ele é chamado para trabalhar pela opção Não na eleição. Pouco engajado politicamente, René aceita o desafio muito mais interessado no potencial publicitário da empreitada do que nos ideais dos grupos de esquerda. Ele é um cara de fora que aparece com a visão de mercado para vender um produto, no caso, a queda do regime. Ele está longe das estratégias políticas dos partidos de oposição, que torcem o nariz para seus métodos. Os militantes de esquerda acreditavam na necessidade de mostrar um Chile de opressão e mortes arbitrárias, de total ausência de liberdade, como forma de chamar a atenção da população para o problema.

O primeiro desafio de René, portanto, é interno. Enquanto ele prefere explorar o sentimento de mudança, por meio das mesmas técnicas pensadas para comerciais de refrigerantes, todos exaltando a juventude e a chegada de novos tempos, os políticos de oposição preferiam denunciar a cruel realidade chilena sob o comando de Pinochet. Isso porque alegavam que o plebiscito seria manipulado - e por isso perdido -, mas era a única oportunidade de levar a agenda da democracia ao conhecimento das massas. Era um pequeno, mas precioso tempo de televisão para, pela primeira vez depois de anos, mostrar uma visão de sociedade diferente da que estava no poder. 

Com a estratégia desenvolvida por René, toda a equipe dos comerciais do Não começa a ser vigiada constantemente e ameaçada por soldados do exército. O clima de paranoia reforça o ar de missão impossível da empreitada, assim como em Argo, mas aqui caminha para um final mais sóbrio. Até lá, a ameaça surge de todos os lados. O chefe de René na agência de publicidade, além de tudo, trabalha para a campanha do Sim, em contato direto com generais do exército.

Só que No tem uma fórmula que pasteuriza momentos históricos para uma digestão agradável. Tem semblante de que se aprofunda nos fatos, mas nunca os desenvolve satisfatoriamente, além de apelar para a família como elemento dramático fundamental. Mas vale ressalvar a fotografia proporcionada pela câmera U-matic da década de 80, que transmite a impressão de imagens de arquivo.

O maior problema é que No, às vezes, passa a ideia de estar mais interessado no sucesso da publicidade como negócio de venda do que na própria história da queda da ditadura. E são nesses momentos, em que o roteiro parece querer ser vendável para o máximo de pessoas possíveis, na mesma lógica da campanha do No, é que Plabo Larrain vê seu filme perder força.

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