A imagem de uma mulher abandonando dois homens que iniciam uma briga após baterem seus carros (óbvias extensões fálicas de si mesmos) um contra o outro é emblemática em Oeste Outra Vez. A partir dela, o filme abre seu leque de personagens masculinos machucados pelo abandono e desamparo feminino. Homens que enxergam a mulher como suas posses, como seu objeto egóico de pertencimento, que acreditam piamente que fazem por merecer a presença de uma mulher ao seu lado. Sujeitos brutos e embriagados que vivem no árido sertão de Goiás, que empunham armas, mas não sabem atirar, que se abrem um ao outro separados por alguns palmos de distância, mas unidos pela cachaça e pelo desejo de vingança.
Se em Comeback: Um Matador Nunca se Aposenta, o cineasta Erico Rassi já havia emprestado com muita propriedade os diversos códigos dos faroestes de Sergio Leone e Howard Hawks, em Oeste Outra Vez, o escopo se expande. Durval (Babu Santana) está em pé de guerra com Toto (Ângelo Antônio) pelo abandono de uma mulher pela qual ambos nutrem o mesmo sentimento, Jerominho é um matador de aluguel em avançado idade contratado para dar cabo de Durval, mas ao falhar na missão, é condenado a fugir junto com Toto de Antonio (Daniel Porpino) e Domingos (Adanilo), contratados para dar cabo de ambos.
É na violência que estes homens encontram sentido para suas existências. Se não há família, se não há esposas, se não há trabalho, para ou pelo quê continuar existindo, então? A resposta (ou caminho?) para estes homens é encontrada no impulso da masculinidade e seus pactos silenciosos. A fragilidade não é uma opção viável, ela lhes tornaria fracos. Mas há espaço para a fraternidade entre estes homens, apesar de tudo. Rassi capta a homoafetividade viril destes homens, no sentido mais léxico da palavra.
A ambientação à lá faroeste de Rassi é perspicaz ao pontuar aquele realismo de macheza cruel com todo um imaginário formado pela imagem tão conhecida de homens trocando risadas e tapinhas num bar enquanto escutam os maiores sucessos e clássicos da “sofrência”. “Eu já mostrei meu muque pro sinhô?”, diz um deles em dado momento, no que parece ser a única forma que estes homens demonstram alguma troca de afeto real em meio a violência como um filme para o que move suas interações. Entre esses ares de melancolia, surpreende, e muito, o refinado no humor que o roteiro de Rassi também empresta aos seus enxutos e muito pontuais 100 minutos de projeção.
O diretor adora seus personagens, mas também não hesita em rir deles diante do absurdo e do desmedido, adicionando camadas inesperadas a própria visão de mundo de uma nota só daqueles homens. E é através dos compartilhamentos destas tragédias regadas ao lado mais cruel e desumano da masculinidade (apesar destes personagens serem o mais humanos possíveis) que Erico Rassi faz mais um de seus faroestes à brasileira, tão potente no explorar desgarrado daquelas (con)vivências quanto na força das imagens desérticas e secas tão bem capturadas pela direção de fotografia de André Cavalheira (a perseguição entre um carro e um cavalo é um DELEITE), premiada no Festival de Gramado 2024.
Um western tupiniquim que existe em nome de um amor destes personagens que confunde-se com a posse e o domínio, enquanto o único alívio afetuoso acontece entre eles mesmos e mais ninguém.
Filme assistido na 28ª Mostra de Cinema de Tiradentes.
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