7,0
Após a grande epopéia de sentimentos que foi Amantes Eternos (Only Lovers Left Alive, 2013), Jim Jarmusch resolveu minimizar a grandeza de suas histórias e explorar a mediocridade do ser humano. Em Paterson (idem, 2016), que concorreu à palma de ouro de 2016, o diretor proliferou temas sobre rotina, aceitação, vivência, mas também passou um lírico contexto sobre o descobrimento usual da vida.
O longa conta a história de Paterson, um pacato motorista de ônibus na cidade de Paterson, em Nova Jersey, que gosta, em suas horas vagas, de escrever poesias sobre o simples, o cotidiano. Assim como os poemas do personagem, Jarmusch fez, neste aqui, um simples filme bem coordenado; acessível para os novos e lúdico aos conhecedores, vazio em pretensões, porém, cheio de bons momentos, alicerçados por uma condução narrativa bastante eficiente, momentos engraçados e sutilezas remotas, ainda que perca sua maciez com o andar da história.
O filme conta com três personagens importantes: nosso protagonista, interpretado por Adam Driver, que apesar de não se expressar muito bem, consegue imprimir toda uma insegurança do personagem e solidificá-la em tela; além de viver uma vida mediana, guarda seus poemas - sua verdadeira paixão - como algo muito intimista, deixando apenas sua esposa lê-los. Sua mulher, interpretada por Golshifteh Farahani, que faz um trabalho excepcional como uma mulher que vive de arte às custas do marido, entretanto, sempre deixando suas ambições visíveis, sendo a força do casal, algo bem caricato, porém verossímil aos olhos mundanos. E o cachorro, que funciona, junto com o chefe de Paterson, como o alívio cômico e a válvula para o andar narrativo.
Jarmusch, como poucos, consegue tirar muita substância do comum, com uma linguagem amigável e sem aquela arrogância cinematográfica intrínseca a várias obras contemporâneas. Ao longo do filme, acompanhamos o protagonista escrever dezenas de novas poesias, estas de conteúdo bem trivial (por exemplo, sobre um fósforo e sua embalagem), que são escritas em tela, geralmente à imagem de uma paisagem campestre ou cachoeiras bem fotografadas - isto é a prova do bom humor e da constante ironia do diretor, escarnecendo a indústria do cinema de hoje em dia, onde a forma, muitas vezes, está acima do conteúdo.
Neste aqui, a cidade se identifica como um dos personagens principais também - junto com o motorista e sua família - pois, mesmo se estabelecendo numa simplicidade conjectural, o longa consegue criar uma atmosfera bem icônica, coisa que o diretor sabe fazer bem e sempre usa em seus filmes. Os dois (cidade e ser humano) estão conectados entre si, parece que um não vive sem o outro; o personagem se mostra como o brilho esquecido da cidade e soma grandeza às terras. Ele é alguém bem singelo e inocente, assim como o local em que vive: tem repulsa a celulares, computadores e tecnologia em geral, sua única diversão é ouvir o que os outros têm a dizer e botar a cabeça para funcionar. Porém, Jarmusch é bem claro quanto a essa integridade: é mostrado como um defeito se tratando do personagem, uma complexidade que tem de ser resolvida e, porventura, uma crítica a esse tipo de conservadorismo específico.
Mesmo sem muito o que contar, a metragem define bem seus posicionamentos alegóricos, edificando isso em um final de pura interpretação, distinta a cada um. Com uma sinceridade textual satisfatória, gerida por uma autenticidade sublime, rara nos dias atuais, Paterson, sem dúvidas, é uma das obras mais enigmáticas dos últimos tempos; não por reviravoltas da narrativa ou complexidade do enredo, mas, simplesmente, por sua atmosfera genérica sucumbir tanto o nosso timbre sensitivo, mesmo com tão pouco. Não há quase nenhuma emoção característica à obra, mas há tanto sentimento pós-sessão - externo a todo filme -, uma sensação agridoce. Todavia, a jornada vaga do motorista para uma nova descoberta sensorial é cheia de banalidades e passagens ordinariamente aventurosas, fazendo com que a condução rítmica do filme perca sua exuberância e o tempo demore a transitar em diversos momentos.
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