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Críticas

Cineplayers

Clássico do gênero terror que, infelizmente, é pouco lembrado nos dias atuais.

8,0

Quando A Profecia foi lançado, há quase 40 anos atrás, no exato ano de 1976, o público ainda se encontrava em polvorosa com a repercussão de O Exorcista, que foi responsável por causar diversos efeitos nauseantes e (dizem alguns) efeitos até irreversíveis sobre o público, além de todos os acontecimentos trágicos e misteriosos que sondaram as filmagens do longa de William Friedkin. Tendo isso em mente, é louvável o sucesso que o primeiro filme de Richard Donner, que até aquele momento possuía pouquíssima experiência por trás das câmeras, tenha alcançado, visto que a produção corria o sério risco de ficar à sombra do feito de O Exorcista.

Assim sendo, é tão estranho quanto curioso notar o quanto A Profecia se tornou ignorado com o passar dos anos. É só reparar: nas rodas de discussões sobre quais os melhores filmes de terror já feitos, A Profecia raramente marca presença, enquanto que outros exemplares como O Bebê de Rosemary, O Iluminado, Poltergeist e o próprio O Exorcista sempre estão lá. O fato é que, mesmo com seus quase 40 anos, A Profecia permanece como um dos exemplares mais contundentes do gênero, pouco devendo a estes clássicos citados e, provavelmente, continua sendo quase tão arrepiante como fora em sua época.

Arrisco dizer que, no que concerne aos filmes de terror que usam como base as mitologias cristãs, A Profecia é o que melhor trabalhou com todos estes elementos. Baseado num livro de David Selzer (e que também escreveu o roteiro do filme), a história nos apresenta ao casal Robert e Katherine Thorn (os astros Gregory Peck e Lee Remick), cujo primeiro filho acaba morrendo durante o parto. Temendo que tal tragédia pudesse afetar sua esposa para sempre, Robert mente para a mulher e adota uma criança cuja mãe havia falecido na mesma noite, e apresenta a criança para Katherine como sendo o filho recém-nascido do casal. Anos depois, uma série de acontecimentos misteriosos começam a envolver a criança batizada de Damien (Harvey Stephens), até que chega aos ouvidos de Robert por meio do misterioso padre Brennan (Patrick Troughton) a arrepiante possibilidade de que Damien talvez seja o filho do anti-cristo.

Orçado em míseros 2 milhões (orçamento considerado vagabundo até mesmo para a época), Donner demonstra maestria ao utilizar recursos baratos para criar uma atmosfera de crescente tensão, ignorando os sustos e privilegiando o desenvolvimento da trama, o que faz com que os momentos de violência gráfica assumam um efeito de choque ainda maior. O roteiro de Seltzer, como já apontado, brinca como quer com diversos elementos da mitologia cristã, tendo como base principal o livro de Apocalipse, que retrata o fim do mundo. Mas Seltzer, confiante na inteligência do público, não sai revelando tais elementos à torto e a direito, mas vai introduzindo-os de acordo com a necessidade do momento, muitas vezes também permitindo que nós mesmos possamos construir nosso entendimento sobre o que acontece na tela.

E Donner, com o número limitado de recursos nas mãos, vai em busca de artifícios simples para atingir o espectador, como os closes fechados nos olhares dos personagens, truques e posicionamentos de câmera que valorizam a claustrofobia de alguns cenários e um maravilhoso jogo de luz e sombras, o que nos dá a constante sensação de que algo realmente maligno espreita os personagens. Donner também filmou algumas das cenas de violência gráfica mais impactantes do gênero, e que não fazem feio diante de uma certa garota violando a própria vagina com um crucifixo. É um trabalho de elaboração brilhante.

Muito da autenticidade de A Profecia também se deve ao trabalho do elenco, que conta com alguns grandes nomes que ressaltam a credibilidade da obra. Gregory Peck está excepcional como o embaixador Robert Thorn, exemplificando com perfeição as preocupações de um homem mergulhando nas próprias dúvidas e temores sobre os acontecimentos ao seu redor. Lee Remick encarna Katherine Thorn com um quê de comoção que humaniza a personagem de maneira especial, e ela acaba por ser o rosto com o qual mais nos preocupamos durante a projeção. David Warner (que para quem não lembra, foi o mordomo de Billy Zane no megassucesso Titanic) consegue se destacar como o fotógrafo Keith Jennings, que auxilia Robert na busca por respostas, enquanto que Patrick Thougton tem participação discreta como o padre Brennan.

Três pontos, entretanto, formam a cereja do bolo de A Profecia: Billie Whitelaw, como a misteriosa Sra. Baylock, possui uma presença assustadora e arrepiante em cena desde seu primeiro momento, engolindo as atenções para si nos momentos em que aparece. Reparem em como a atriz trabalha em cima de sua postura e olhar, algo que Donner ressalta deliciosamente com sua câmera quando faz uso dos closes fechados. Harvey Stephen segue pelo mesmo caminho, onde o ator mirim é capaz de misturar precisamente uma áurea de inocência e maleficência em seu rosto angelical e no sorriso sugestivo. Entretanto, o ápice é mesmo a trilha sonora de Jerry Goldsmith, responsável pelo único Oscar abocanhado pelo filme. Utilizando corais masculinos que entoam trechos satânicos em latim (por vezes de trás pra frente), a trilha é capaz de arrepiar os pelos da nunca até mesmo do público mais resistente, ressaltando o potencial dramático alcançado pela obra.

Pecando apenas em alguns furos no roteiro que, infelizmente, acabam por incomodar, A Profecia segue como um dos exemplares mais importantes do gênero terror, por mais que não esteja entre os mais ressaltados. Assim como no polêmico O Exorcista, o filme também carrega suas próprias tragédias durante as filmagens (vários acidentes ocorreram com alguns envolvidos na produção, e o próprio filho do ator Gregory Peck cometeu suicídio pouco antes do início das filmagens), mas a diferença é que, aqui, a qualidade da obra consegue falar mais alto.

Comentários (7)

Cristian Oliveira Bruno | sexta-feira, 13 de Março de 2015 - 10:57

Otima critica. Parabens pelo otimo momento e pelos texts cars vez maid embasados e coesos, Rafael. O filmed eh um classicp o incontestavel. Sobre a comparacao com Rosemery e Poltetgeist, o filme se equivale ao primeiro e eh MUITO MELHOR que o Segundo. Poltergeist eh ruim pra caramba. A profecia eh foda.

Luiz F. Vila Nova | sexta-feira, 13 de Março de 2015 - 19:41

Um dos melhores filmes do gênero. A trilha, a direção, as atuações e a forma como o tema é retratado fazem deste um dos filmes mais arrepiantes e marcantes do cinema. Dos filmes citados na crítica, adoro O Exorcista, O Iluminado, O Bebê de Rosemary e Poltergeist (bastante subestimado por alguns devido a seu argumento mais ameno).

Lucas Souza | sábado, 14 de Março de 2015 - 12:18

Poderia ter dado um 9,0 Rafael, o roteiro te incomodou tanto assim? Ao lado de "O Exorcista" eu assisti o filme e li os livros que são um pouquinho superiores as fitas."The Omen" surge como uma obra atemporal e possui um razoável segundo capitulo, mas o terceiro filme, curiosamente estrela por Sam Neill fechou a trilogia com chave de bosta e o quarto filme nem deveria ter sido lançado... O remake então, é um lixo. Curiosamente também o filme realmente teve várias tretas durante as filmagens, igual a "O Exorcista", teve nego que morreu, acidentes de carro e uma caralhada a parte...
Acredito que o filme não perdeu tanto prestigio assim e pelo menos pra mim é clássico absoluto e mais uma vez Rafael, parabéns por nos proporcionar a leitura de um texto coeso, sucinto, leve e dinâmico...

Yuri Mariano | domingo, 15 de Março de 2015 - 00:42

Muito bom lembrar deste clássico, me deu vontade de vê-lo novamente(ainda mais hoje em dia quando que dizem que Atividade Paranormal e outras porcarias são aterrorizantes). Dos filmes citados o meu favorito é O Bebê de Rosemary.

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