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Pulp Fiction: Tempo de Violência

(Pulp Fiction, 1994)
8,9
Média
2047 votos
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Sua nota

Críticas

Cineplayers

Um dos melhores filmes independentes já feitos, que deu um novo gás á indústria americana e consagrou Tarantino.

10,0

Quando fui ver Pulp Fiction pela primeira vez, junto com um amigo meu em uma exibição em um canal à cabo, estava esperando bastante, por tudo o que os outros falavam sobre ele. Só não esperava que, na tela que antecede o filme, fossem aparecer tantas restrições: sexo, violência, tema adulto, drogas; ou seja, todas as opções possíveis. A única que não estava marcada era justamente tema livre. Desde já, mesmo sem essa breve tela fazer parte do filme, já estava rindo, resumindo mais ou menos tudo o que Pulp Fiction iria me transmitir pelas próximas duas horas e meia: muita diversão com o humor negro que só um gênio como Quentin Tarantino poderia oferecer.

A história de Pulp Fiction e sua estética de montagem

Antes de Pulp Fiction, Tarantino fez o também excelente Cães de Aluguel, seu filme de estréia. Dizer que começou com o pé direito é pouco, pois ele acertou em cheio em uma fórmula que viria usar aqui, 2 anos depois, de maneira mais complexa: muita ação misturada com humor negro para temperar a história contada de forma totalmente não-linear. A diferença na estrutura de Cães de Aluguel para Pulp Fiction está, basicamente, que no primeiro há um presente que vai nos guiando pelos flashbacks que o filme dá para nos explicar o que está acontecendo (no caso, o galpão usado como escape caso alguma coisa desse errado no plano). Já em Pulp, Tarantino simplesmente conta sua história de maneira completamente não linear, sem um tempo definido para nos servir de base e, mesmo assim, não nos perdemos dentro da história.

Com isso ele nos pede muito mais atenção e dá uma identidade especial no modo de contar sua história. Fora que, devido a esse estilo, podemos ver a ‘ressurreição’ de um personagem dentro da narrativa, de um modo que não tira a seriedade nem a realidade do que está sendo contado. Apenas temos duas cenas trocadas de posições na hora da montagem. Genialidade pura. Como se isso não bastasse, o nível de detalhes que enriquecem cada parte do filme aumenta de maneira incrível a diversão e entretenimento que ele nos oferece, pois a todo momento estamos ligado em como os personagens pegaram tal roupa, como eles conseguiram tal arma, o que aparece aqui e reaparece ali, essas coisas. Tudo é explicado no filme, não tem nada que esteja lá gratuitamente. Se acontecer algo no começo no filme que você não entendeu, ou que achou gratuito, qualquer coisa do gênero, pode ter certeza que antes que os créditos finais começarem a subir você já terá a resposta que procura.

Toda essa estética de montagem serve como esqueleto para contar não só uma, e sim três histórias com a temática do submundo do crime nos dias de hoje, onde todas elas possuem personagens em comum. Após uma pequena introdução onde um jovem casal de assaltantes conversa tranqüilamente sobre assaltos, Tarantino começa a contar sua primeira história: Vincent Vega (John Travolta) deve levar a mulher do chefão, Mia Wallace (Uma Thurman) para um jantar e fazer com que ela se divirta enquanto seu chefe vai para a Flórida tratar de negócios. A segunda história (já em forma não cronológica) trata do boxeador Butch (Bruce Willis), que é considerado velho para a profissão e recebe uma quantia em dinheiro de Marcellus (o grande chefão da história) para perder a luta. A terceira história tem como foco principal o personagem Jules Winnfield (Samuel L. Jackson), com Travolta como coadjuvante, que devem limpar o carro após um assassinato bem violento no banco traseiro de seu carro. Assistindo ao filme, tudo parece sem sentido e de uma maneira meio louca. Mas, parando para analisar cada ponto de ligação de uma história para a outra, vemos como o filme foi bem pensado.

Além dos detalhes citados e o modo como a história é contada, outro aspecto que chama a atenção no oscarizado roteiro de Pulp Fiction (sim, vencedor do Oscar na categoria) é o modo como Tarantino trata sobre assuntos extremamente delicados de maneira peculiar. Os diálogos são fortes e extremamente bem construídos, na maioria das vezes apresentando um humor negro sobre diversas ações que não deveriam ser engraçadas, a naturalidade com que as drogas e a violência são tratadas no dia-a-dia dos personagens, enfim, uma visão única sobre os assuntos abordados. E como as histórias ‘parecem’ estar desconectas uma das outras, tudo parece ser uma bagunça generalizada, temos a razão para o letreiro explicando a palavra Pulp no início do filme, ganhando o seu sentido dentro do contexto principal.

John Travolta

Após um promissor início de carreira, Travolta estava em pleno esquecimento quando recebeu o convite para atuar em Pulp Fiction. Recebeu irrisórios 150.000 dólares para encarnar o papel do marrento Vincent Vega, sem imaginar que o personagem seria considerado como uma ‘renascença’ do ator no mundo cinematográfico. Tarantino escreveu uma seqüência inteira só para Travolta, logicamente a que ele dança no bar com a personagem de Uma Thurman. Nos momentos de tensão, como a cena do banheiro na casa de Butch ou então a cena final da história de Jules Winnfield, Travolta está perfeito. Seu olhar, o jeito de falar, enfim, nunca vi o ator tão bem em um papel como aqui neste filme.

Samuel L. Jackson

Impossível não pensar que é um queridinho de Tarantino. Protagonizou simplesmente dois dos três filmes do diretor: este em questão e Jackie Brown, que também é ótimo. Lógico que protegido é apenas uma maneira de se falar, pois em ambos o trabalho o ator está perfeito. Os papéis são parecidos, tudo bem, mas a diferença da frieza de Jules Winnfield para a malandragem do traficante de armas Ordell Robbie só é perceptível por causa do excelente trabalho do ator. O cabelo e o bigodinho que ele usa em Pulp é um caso a parte: imortalizou a imagem de Jackson. Nas cenas de tensão, Jackson consegue impor um ar que não nos deixa respirar enquanto a cena não termina, principalmente quando começa a recitar a passagem da Bíblia de Ezequiel, que fala sobre vingança.

Bruce Willis

Não tem um papel muito diferente do que estamos habituados a vê-lo fazer. Durão, violento, desejado, enfim, nada de novo. Porém, as situações impostas por Tarantino fazem com que Willis viva o melhor personagem de sua carreira. É impossível não lembrar de sua fuga no táxi (o fundo usado na cena é maravilhoso!), o modo como trata o relógio herdado do pai (e como este o conseguiu também), o momento na loja em que ele vai largando uma arma após ver outra melhor (minha cena preferida), enfim, são muitas e muitas cenas importantes para o personagem de Willis, que fecha o ciclo correto da narrativa de Pulp Fiction.

Uma Thurman

Divide com Travolta a importância da primeira história, porém com menos intensidade, sendo uma coadjuvante de luxo. Encarna com um charme magistral Mia Wallace, a mulher do chefão de Travolta. O modo como a atriz interpreta o uso de drogas é fantástico, principalmente na parte final de sua história, quando todo o rolo desencadeia aquela dificílima situação para Vincent. Sua interpretação, nesse momento, é marcante, pois você consegue ficar tocado com a cena pesadíssima que a atriz está nos emprestando o talento. Está presente no novo filme de Tarantino, Kill Bill, que foi dividido em duas partes, com a primeira chegando no início de 2004 nos cinemas brasileiros.

Quentin Tarantino

Para quem não sabe, costuma fazer uma pontinha em seus filmes. Aqui não é diferente e ele atua como Jimmie, o homem que cede a casa para que Travolta e Jackson limpem o carro na terceira história. Sim, ao contrário de muitos diretores que se arriscam a fazer o mesmo, ele está muito bem no papel (tanto que atuou em outros filmes sem ser de sua autoria). Ele aqui estava indeciso entre dois papéis para atuar. Não sabia se fazia Jimmy, o dono da casa, ou o traficante que Vincent compra suas drogas. Decidiu-se por Jimmy não pela facilidade de interpretação, e sim porque queria estar atrás das câmeras quando acontecesse a cena da overdose. Convenhamos, foi muito feliz na escolha, uma vez que a cena é chocante e consegue alcançar todas as suas pretensões.

Todos os méritos do sucesso de Pulp Fiction são dele. Gastou apenas 8 milhões para fazer um dos melhores filmes da história e faturou mais de 200 ao redor do planeta. Além do já supracitado método de montagem que usou no filme, tem o controle total dos atores e dos espectadores durante todas as duas horas e meia que dura seu filme. Escolheu por diversas vezes planos longos, mas que nunca cansam ou ficam desinteressantes, devido ao texto bem escrito feito por ele mesmo. Um exemplo disso é, logo no começo do filme, quando Travolta e Jackson vão fazer o servicinho que tem de fazer para o chefe e vêem que estão adiantados. Nesse momento, passam-se mais de 2 minutos com os dois conversando sobre maldades ou não de uma massagem que uma lenda diz ter feito seu chefe jogar um homem pela janela. Sem os espectadores perceberem, Tarantino já está criando um clima para as seqüências que viriam logo a seguir, quando Travolta sai com a esposa do chefe. Ele também utiliza diversos ângulos de câmera pouco convencionais que funcionam perfeitamente ao invés de nos deixarem incomodados com as cenas.

Girl, You´ll Be a Woman Soon

Outro ponto fortíssimo de Pulp Fiction é sua trilha sonora. A idéia de uma revista que Tarantino denunciou querer alcançar em seu filme é reforçada toda por ela, que é muito agitada e nos mantém sempre ligados ao que está acontecendo na tela. Depois de ver o filme, fico com a música tema de Uma Thurman na cabeça por dias e dias, toda hora cantando. Coincidência ou não, enquanto estou aqui, redigindo este texto, levantei e fui até a cozinha pegar algo para beber. Lá estava meu pai, cantando exatamente a música em questão, e olha que ele não é nenhum fã incondicional de cinema. Foi coincidência mesmo.

Finalizando

Pulp Fiction é uma obra genial. Grandiosa e pretensiosa também, mas que deu certo. Quentin Tarantino, com essa sua segunda obra, provou que veio para revolucionar o cinema independente americano, dando um novo fôlego à ele. Existem muitos sites sobre a obra, com curiosidades, ordem certa dos acontecimentos, erros da produção, enfim, é só dar uma procurada, não precisa ser nem profunda, que você irá satisfazer sua curiosidade. Mas não se esqueça do que falei no início da análise: ele é violento, confuso e vai pedir sua atenção para ser bem aproveitado. Se seguir bem essa receita, você terá um dos melhores bolos cinematográficos em muitos anos de cinema.

Prós:

+ História contada de modo não-linear que se encaixa perfeitamente no final;
+ Humor negro afiadíssimo com assuntos e situações delicadíssimas;
+ Atuações fantásticas de todos os atores;
+ Tarantino inspiradíssimo;
+ Não fica cansativo em nenhum momento, nem repetitivo;
+ Detalhes enriquecem a trama;
+ Trilha Sonora.

Contras:

- Edição do DVD nacional

Comentários (9)

Cristian Oliveira Bruno | terça-feira, 03 de Dezembro de 2013 - 21:46

Um dos grandes filmes da história. É sempre um prazer assistir Pulp Fiction. Muito divertido, genial, inteligente e original. Parabéns, Tarantino!!!

Lucas Moreira | quinta-feira, 03 de Julho de 2014 - 12:12

"Você sabe como eles chamam o Quarterião com Queijo em Paris? __ Eles não chamam de Quarteirão com Queijo? __ Não, por causa do sistema métrico deles, eles não sabem que porra é quarteirão. __ Como eles chamam? __ Eles chamam de Royale with Cheese. __ Royale with Cheese. Como eles chamam o Big Mac? __ Big Mac é Big Mac, mas eles afrescuram para Le Big Mac. __ Le Big Mac. Como eles chamam o Whopper? __ Não sei, não fui no Burger King. Mas você sabe o que eles põem nas batatas fritas na Holanda em vez do ketchup? __ O que? __ Maionese. __ Minha nossa! __ É sério, eu vi. E não falo de um tiquinho no cantinho do prato, eles afogam a porra da batatinha naquela merda."

Um dos melhores diálogos do cinema.

Nilmar Souza | quinta-feira, 03 de Julho de 2014 - 13:58

A sequência é tão foda quanto .. o papo sobre massagem, Ezequiel 25:17, dps aquela aterrorizada básica e um ratátátá pra fechar com chave de ouro.

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