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Críticas

Cineplayers

Falta de ideias não estraga o filme original. Apenas o diminui, desnecessariamente.

1,0

Coube ao desconhecido diretor John Erick Dowdle a função de assumir uma bomba certeira: refilmar cena-a-cena o muito bem-recebido [REC], terror espanhol que merecidamente conquistou público e crítica em 2007. Já é sabido que o público norte-americano não gosta de legendas (e isso estende-se ao público médio brasileiro que, se tivesse opção, nunca leria uma linha sequer nos cinemas); assim como já é sabido que as boas ideias não estão no cinema comercial dos Estados Unidos, com raríssimas exceções. Então não foi realmente surpresa quando Quarentena foi anunciado, para ser lançado apenas um ano após o original. Sendo assim, há dois públicos para este filme: o que assistiu a [REC] e o que acha que esta é uma produção original.

O primeiro público não verá nada de novo aqui. A história segue fielmente o filme espanhol – repórter fazia matéria no corpo de bombeiros quando passa a acompanhar um chamado misterioso a um prédio, que acaba sendo isolado do mundo exterior sob a suspeita de um vírus contagioso, e logo coisas aterrorizantes começam a acontecer e as pessoas começam a morrer. O filme segue o mesmo estilo, filmado em primeira pessoa, da perspectiva do câmera da rede de televisão (algo visto recentemente em Cloverfield - Monstro). Não há qualquer tentativa de fugir do script ou de criar algo em cima do material anterior, garantindo tensão zero ao primeiro tipo de público, que só assiste a Quarentena por curiosidade e para ver como ficou o clímax nesta nova versão. O clímax, lembrando, é o que tornou [REC] um filme a ser notado: os últimos 15 minutos são espetaculares, uma aula de tensão. Aqui, isso se perde.

O segundo público verá um filme de qualidade inferior, atuações piores, que parecem tentar imitar os espanhóis a todo momento. Mas, ainda assim, verá um filme com um leve teor de originalidade. O fato do elenco ter alguns nomes razoavelmente conhecidos (Jay Hernandez e Rade Serbedzija, por exemplo) não faz a menor diferença, pois nem [REC] fora um filme de atuações; bem pelo contrário, ele sempre esteve no limite do ridículo. Quarentena entra nesse limite, pois a pouca naturalidade encontrada antes perde-se completamente aqui. Os atores parecem não saber agir perante os fatos sobrenaturais, principalmente porque ao mesmo tempo têm de fingir que tudo aquilo é verdadeiro, sentindo-se incomodados com a presença de um câmera ao seu lado o tempo todo.

Mas é claro que cobrar grandes (ou mesmo boas) interpretações de atores em um filme de horror tão gráfico quanto esse é covardia, e o que mais acaba incomodando é o roteiro, que nada mais é do que uma preparação para o tal clímax assustador. O desenvolvimento dos personagens existe de forma adequada para o gênero, e felizmente não há merchandising exarcebado (algo que ajudou a destruir Cloverfield). O uso excessivo de efeitos especiais computadorizados estraga um pouco a experiência, mas o diretor beneficia-se sempre dos ambientes escuros para tentar esconder isso o máximo possível. A fotografia, portanto, é adequada à proposta. Parte da apreciação da experiência (pois [REC] e Quarentena foram criados para serem experiências cinematográficas) depende do quanto você conseguir ignorar as óbvias inconsistências do roteiro: o fato da bateria da câmera ter tanta durabilidade; o fato de que, mesmo em momentos de vida ou morte, o câmera não para de filmar etc.

Comercialmente falando, esta refilmagem representou um sucesso moderado nas bilheterias norte-americanas, talvez não o suficiente para que uma sequência seja lançada tão cedo. Na Espanha, [REC] 2 já chegou aos cinemas onde passou com resultados medíocres. O melhor seria deixar a ideia de lado e investir em algo original, na medida do possível. Para os executivos de Hollywood, isso não faz sentido, é claro. Quarentena por si só é um terror ordinário, sem dúvida inferior na execução com relação ao original. Quando analisado como uma refilmagem, é motivo de riso, não por ser realmente menor, menos tenso e menos bem interpretado, e sim porque essa foi uma das grandes palhaçadas a que o público foi submetido recentemente, em uma demonstração de total incompetência criativa.

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