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Críticas

Cineplayers

Quando eu quis ser Ashton Kutcher.

6,0

Se o projeto de um filme parte de um roteiro tão banal quanto o de Sexo Sem Compromisso, o grande desafio de seu diretor passa a ser o de dar dignidade ao material e fazer dele, quando em contato conosco na sala de cinema, uma experiência aceitável como passatempo. Mesmo longe da melhor forma o veterano Ivan Reitman, diretor de clássicos cômicos dos anos 80 como Os Caça-Fantasmas (Ghostbusters, 1984), encara o desafio e faz desta comédia romântica bobinha um filme que, em seus melhores momentos, traz o mérito de deixar o sorriso estático no rosto e um pequeno desejo de viver aquela história – quer dizer: com a Natalie Portman, quem não gostaria?

O conflito central é um velho clichê da vida – bem mais do que dos filmes. Podem dois amigos fazer sexo regularmente sem manterem um relacionamento estável entre si? Ou ainda: sem se apaixonarem um pelo outro? É desta tentadora ilusão (e duvido de quem diga que já não pensou nisso) que partem nossos protagonistas, interpretados por Ashton Kutcher e Natalie Portman, que se conhecem na infância, se reencontram na adolescência e acabam finalmente se beijando – e em seguida transando – depois de formados e empregados, após um encontro inesperado que rende um dos bons achados cômicos do filme.

Ambos vivem em meio ao fuzuê da classe alta de Los Angeles. Adam, filho de um famoso apresentador de televisão, é aspirante a roteirista. Emma, ovelha-negra da família, uma médica solteirona que aguarda o casamento da irmã. As personagens que os cercam fazem parte do grupo dos velhos clichês de Hollywood: o pai doidão, o gay afetado, o rival que paga de amigo da moça pra comer pelas beiradas, a irmã boazinha que é o orgulho da família, lésbicas fogosas, amigos que só pensam em sexo, etc. As situações construídas acerca destes personagens também vagam entre aquilo que já foi visto em outros filmes e algumas tiradas cômicas funcionais. O básico para um filme do gênero ser aceitável.

E qual seria, afinal, o motivo pra essa porcaria toda agradar? Não sei precisar se por conta da minha queda pela Natalie Portman ou da força dos méritos construídos entre o trabalho dela, de seu diretor e de seu invejado cúmplice de cena, mas ver Emma se entregar gradativamente ao desejo e, mais tarde, ao amor – mesmo se tratando de Ashton Kutcher, o que é meio inacreditável – de Adam é uma experiência que faz justiça àquelas descrições lá do início, superando suas barreiras e as limitações evidentes do material para proporcionar uma sessãozinha de filme de casal agradável.

Muito pela personagem de Portman ser bem mais interessante do que outras pelas quais a agora oscarizada atriz foi ovacionada recentemente. As barreiras sentimentais que constroi entre si e os relacionamentos amorosos não partem de afetações – do tipo “não sou de ninguém, rapaz” - ou imposições enfiadas na narrativa para confortar sua estranheza – como problemas de criação, traumas ou outras asneiras utilizadas sem dó por Hollywood para justificar personagens “diferentes”. Também sequer é vista como alguém “diferente” pelas lentes de Reitman. É uma mulher fria, porém jamais frígida; mulher que, embora resistente a eles, é passível de sentimentos; é humana e apaixonante.

Por conta disso, terminar Sexo Sem Compromisso desejando Emma (ou Portman, tanto faz) acaba sendo praticamente irresistível. Dureza mesmo é não remoer o filme em algum sonho apimentado às quatro horas da manhã.

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