Saltar para o conteúdo

Críticas

Cineplayers

O elenco afiado é o grande destaque, mas o filme tem mais a oferecer.

7,0

Quem conhece um pouco de cinema sabe o que esperar a cada novo filme de Nancy Meyers. Ao longo da última década, a roteirista/diretora se especializou em realizar comédias românticas despretensiosas, presas à fórmulas, com alguns astros como chamarizes do grande público. Foi dessa forma em Do que as Mulheres Gostam, Alguém Tem que Ceder e O Amor Não Tira Férias. Assim, ninguém vai entrar no cinema para assistir Simplesmente Complicado, seu mais novo trabalho, esperando mais do que duas horas de diversão descompromissada e de uma história agradável. Felizmente, Simplesmente Complicado entrega o que promete sem maiores percalços.

O filme conta a história de Jane Adler, uma mulher em torno de seus cinqüenta anos que finalmente começa a conviver bem com o fato de ter sido trocada pelo marido. O sujeito em questão atende pelo nome de Jake, e deixou Jane para viver com uma mulher mais nova. Dez anos após a separação, o ex-casal passa uma noite juntos na formatura de um dos filhos, o que faz com que Jake volte a ter sentimentos pela esposa de outros tempos. Ao mesmo tempo, Jane conhece o arquiteto Adam, de quem começa a gosta, o que deixa a situação ainda mais complicada.

Simplesmente Complicado é, sem dúvidas, o melhor trabalho da carreira de Nancy Meyers. Seus filmes anteriores sempre seguiram uma estrutura óbvia, começando como comédia para, em sua segunda metade, resvalar para o drama, gênero no qual ela demonstrava mão pesada e forte tendência para o melodrama. Em Simplesmente Complicado, o caso é diferente. Meyers consegue atingir dessa vez um ótimo equilíbrio entre o lado cômico e o emocional, mesclando-os de maneira hábil do princípio até o final. Não há mudanças abruptas de tom ao longo da projeção, em uma clara amostra de sua evolução como cineasta. Como resultado, Simplesmente Complicado é um filme que flui de maneira agradável, sem jamais perder o ritmo ou a qualidade.

A maior conquista de Meyers talvez seja realmente no que diz respeito à comédia. Simplesmente Complicado possui momentos genuinamente engraçados, originados das mais diversas fontes: das atuações, dos diálogos ou simplesmente de gags visuais. Praticamente todas as piadas do filme funcionam – algumas, claro, melhores que outras –, o que, além de contribuir para a construção de uma experiência prazerosa, ainda facilita a identificação dos personagens com a plateia. É difícil não gostar de pessoas quando nos divertimos com elas e, assim que o espectador se sente à vontade com Jane, Jake, Adam e o resto dos personagens, a história é “vendida” com muito mais facilidade.

E grande parte disso se deve ao impecável elenco. Mesmo que este seja o momento no qual Meyers surja mais madura e criativamente inspirada, é difícil não apontar os atores como o maior trunfo de Simplesmente Complicado. Elogiar Meryl Streep já se tornou um chavão, mas é preciso tirar o chapéu para a versatilidade e o talento da veterana atriz. Streep vai da comédia ao drama sem qualquer esforço, brilhando nos dois gêneros, ao mesmo tempo em que consegue desenvolver sua personagem. Enquanto isso, Alec Baldwin demonstra (como o faz na série 30 Rock) que se tornou um excelente ator de comédia, gerando risadas com um timing impecável. Mais do que isso, os dois constroem personagens carismáticos e, principalmente, possuem excelente química, protagonizando juntos alguns dos melhores momentos do filme.

Ao mesmo tempo, John Krasinski brilha em pequenos e inspirados momentos, enquanto Steve Martin aparece bastante contido em seu papel, realmente deixando as risadas a cargo de Streep e Baldwin – ainda que tenha seus momentos, como a cena do baseado. Martin, porém, é eficientíssimo ao compor um personagem que convence a plateia de que pode ser um interesse amoroso à Jane, formando o triângulo que é o centro do enredo. Aliás, é aí que mora uma das principais qualidades do trabalho de Meyers: ela jamais faz a plateia escolher por Jake ou Adam, preferindo mostrar que os dois têm muito a oferecer para Jane. Dessa forma, Simplesmente Complicado ganha uma imprevisibilidade que não é comum às comédias românticas, uma vez que a dúvida sobre quem será o escolhido da personagem de Meryl Streep permanece até o final.

Este, aliás, é outro acerto do trabalho de Nancy Meyers. Ainda que o filme não passe de um produto e, portanto, preso a fórmulas para cair no gosto do grande público, há uma honestidade e um respeito no tratamento aos personagens. A cineasta parece cuidar para que eles não percam a personalidade construída durante o filme graças a algumas conveniências do roteiro. Claro que, por vezes, impera um certo exagero nas reações, principalmente com o objetivo de gerar risadas. Mas, se as risadas realmente surgem, quem vai reclamar? Esta característica do roteiro pode ser percebida também na resolução da história: ainda que possa desagradar a alguns, ela é, de certa forma, a única possível, coerente com tudo o que havia sido apresentado até então.

Nem tudo, porém, são flores. Meyers não consegue fugir de algumas superficialidades e resvala em lugares-comuns. Por exemplo, mostrar o sprinkler como metáfora para o sexo é um recurso que já foi utilizado até mesmo em sátiras, enquanto o encontro no qual alguém fica esperando é um clichê presente em nove de cada dez comédias românticas.  Ao mesmo tempo, persiste a abordagem unidimensional no tratamento dos personagens secundários, como a nova esposa de Jake, assim como algumas soluções temáticas fazem pouco sentido, surgindo apenas para gerar conflito na trama – é o caso, por exemplo, da reação exagerada dos filhos quando descobrem o caso dos pais.

Simplesmente Complicado está longe de ser um grande filme, mas possui em elenco afiado, personagens carismáticos, cenas engraçadas e uma história que, se não brilhante, ao menos funciona sem percalços. Não deixa de ser uma obra com objetivos comerciais, mas, quando a outra opção do gênero nos cinemas é o execrável Idas e Vindas do Amor, um filme tão bem realizado quanto esse merece uma olhada. Ponto para Meyers.

Comentários (0)

Faça login para comentar.