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Críticas

Cineplayers

Terror com validade vencida.

1,0
Que o cinema de gênero vive uma 'era de ouro', é algo já explicitado em diversos textos e análises críticas, tanto do ponto de vista do mercado quanto da recepção pública; o site já conta com diversos críticos de grandes filmes de terror e suspense somente nessa década a impressionar positivamente e encontrar lugares de destaque dentro do pensamento cinematográfico recente. Nada disso criou uma blindagem no gênero, que continua propenso a esbarrar em equívocos como qualquer outro grupo de filmes. Isso nos leva a esse longa dirigido por Sylvain White, francês de nascimento mas praticamente um funcionário padrão da TV americana há quase 10 anos. White dirigiu episódios para mais de 15 séries diferentes desde o retumbante fracasso de Os Perdedores, a adaptação de uma HQ que ninguém viu.

Embora esse novo longa seja de orçamento considerado baixo para os padrões americanos (10 milhões), era um produto de encomenda feito para explorar a imagem dessa lenda urbana nascida e disseminada na internet. O tal 'slender man' seria uma figura longilínea e sem rosto, que captura adolescentes para a sua espécie de dimensão. Nada muito aprofundado é explorado sobre ele no filme; sobre ele ou sobre qualquer outra coisa, sendo esse o principal dos inúmeros problemas da produção. Não há possibilidade de torcer por nenhum personagem ou se importar com seus problemas, sejam eles existenciais ou sobrenaturais, porque o roteiro não explora absolutamente nenhuma camada sobre qualquer um deles. O vazio que ocupa a realidade de uma das protagonistas é reverberado no próprio filme, que carece de interesse.

Há uma situação antiquada e nada problematizada no filme que é a situação do feminino no cinema de gênero. Os códigos que um longa como Corrente do Mal debateu e difundiu entre as produções é empobrecido aqui, reutilizando a imagem feminina para questões antiquadas, como a depreciação da liberdade e da rebeldia, o extermínio dos que obtém a informação enquanto a ignorância é beneficiada, e situar a mulher como propagadora do infortúnio, com o único homem 'infectado' tendo o sido por influência feminina. O filme por si só já apresenta todas essas questões de profundo mau gosto, que o coloca num degrau negativo sem que o filme em nenhum momento satirize ou metaforize isso; são apenas valores vencidos e trazidos de volta a tona sem contextualização, apenas para entreter. E nem isso o filme consegue fazer.

De realização burocrática, o filme aposta na ausência de iluminação para fazer valer seu clima. Refém de 'jump scares', nem esse artifício pobre é utilizado da maneira correta, provocando pouca ou nenhuma tensão; um exemplar da escola típica do terror que vem sendo feito indiscriminadamente desde os anos 70 se propor a não ir além de qualquer escapismo e não conseguir nem o mais básico de acerto, é no mínimo preocupante. Em determinado momento, conseguimos ver com o desleixo da parte técnica que a intenção era apenas conseguir uns trocados na bilheteria, e até nessa forma mais primal da diversão o filme falha, provocando profundo enfado, repetindo sequências e situações não por padrões narrativos e sim por cansaço puro e simples, e essa sensação atinge o espectador em cheio.

Pra encerrar, outro ponto nevrálgico não é alcançado. Ainda que nenhum gênero precise ser referendado por referências do extra campo, o terror e o suspense foram filmes que sempre cresceram diante do olhar externo. Toda vez que analisados sob a luz das discussões prementes, um filme se sobressai, de A Noite dos Mortos Vivos e O Cabinete do Dr. Caligari a Abismo do Medo e It. O grande problema de Slender Man não é não ter referências que ecoem na sociedade, mas não saber fazer, ou fazer pela metade, ou seus roteiristas e diretores tratarem isso de maneira porca. O filme ensaia discussões sobre o poder da internet, sobre a depressão adolescente, tenta mascarar essas causas no poder atrativo de um homem mascarado/figura demoníaca, mas se o roteiro de David Birke (qual a verdadeira personalidade desse roteirista, essa ou a de 'Elle'?; não é possível que a mesma pessoa escreveu as duas obras) não consegue ao menos desenhar suas protagonistas, dando dados a umas e negando a outras, ele não conseguiria dar uniformidade a questões maiores. E tudo fica na tentativa, infelizmente... o material enquanto premissa nem era ruim, mas o mínimo desenvolvido não leva a lugar algum.

Comentários (2)

Gabriel Fagundes | quinta-feira, 23 de Agosto de 2018 - 20:06

Boa Carbone! Texto bem legal, já sei que não vou ir ao cinema assistir

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