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Críticas

Cineplayers

Sam Mendes ataca novamente os Estados Unidos. Sutilmente, claro, agora fazendo um filme anti-guerra.

6,0

Sam Mendes depois que ganhou notoriedade com Beleza Americana virou um diretor pretensioso. Estrada para Perdição era lotado de diálogos auto-importantes e de uma tentativa de se criar poesia de uma forma um tanto quanto exagerada. O filme, embora muito bom, acabou sendo mais visual do que conteúdo. Soldado Anônimo não é muito diferente. Começa como uma "homenagem" descarada a Kubrick (as aspas são dúbeis, afinal pouco e cria e tudo se copia, certo?) e sua sequência inicial de Nascido para Matar, praticamente sem tirar nem pôr. Depois homenageia também Apocalypse Now passando o melhor de sua trilha sonora e sequências de guerra.

E esses são os dois melhores momentos do filme todo. Baseado em um livro escrito pelo soldado Swofford na vida real (aqui interpretado pelo sempre bacana Jake Gyllenhaal), narra a sua participação na campanha "Tempestade do Deserto", acontecida na Guerra do Golfo na primeira metade da década de 1990. O filme gasta um tempo bem razoável preparando o clima para uma guerra que prometia repetir o Vietnã, porém todos sabemos que, comparativamente, ela foi rápida e com um número de baixas mínimo para os Estados Unidos. Enfim, não despertou "emoção" nenhuma.

E o filme é basicamente sobre isso: o vazio da guerra. Através de seus personagens (sobretudo o próprio Swofford) acompanhamos alguns meses dos soldados no Kwait, país vizinho ao Iraque, onde quase nada acontece. Quando o filme começava a engrenar em sua ação ele termina. Quase inesperadamente. E esse é o terceiro melhor momento do filme. É como uma pegadinha com o espectador, que deve pensar "agora vai começar pra valer". E a guerra acaba. Um total anti-clímax, que define bem o espírito do filme, que por sua vez define bem o espírito do que foi a Guerra do Golfo.

Nesse sentido, de ser uma espécie de filme anti-guerra, Sam Mendes conseguiu realizar muito bem o seu trabalho. Inclusive decepcionou muita gente que pensava que veria uma nova obra-prima sua, a primeira sobre uma guerra. Os espectadores mais desavisados vão certamente se decepcionar, já que este não é um filme de ação. É uma espécie de drama pessoal para o personagem de Swofford e sua visão aborrecida da guerra.

A tentativa de se criar um grupo de personagens inesquecíveis é que acabou sendo meio falha. Todos os grandes dramas de guerra possuem sempre um grupo de soldados que recebem um tratamento especial do roteiro, para o público aprender a gostar deles em uma espécie de jogo "o meu preferido é este aqui". Porém nem um deles, nem mesmo Swofford, que não queria nem saber da guerra (repare que sua grande preocupação é mesmo o fato de não querer ser traído pela namorada enquanto está no Oriente Médio), ou então o Sargento Sykes (Jamie Foxx, numa boa interpretação após ter conquistado o Oscar), que não apresenta conflitos interessantes (uma conversa entre ele e Swofford, à noite no deserto, tenta negar isso, mas não é o suficiente para fazê-lo um personagem bem desenvolvido), enfim, nem um personagem é forte o suficiente para ficar marcado pelo espectador. E há muitos deles, como o quase débil-mental, o arrogante, e por aí vai. Ou são estereótipos cansados ou, como nos dois casos específicos citados acima, são simplesmente personagens chatos.

Pretensioso o diretor Sam Mendes continua sendo. Os textos auto-importantes, geralmente identificáveis por frases de efeitos, continuam existindo, principalmente no último ato do filme, quando os soldados retornam aos Estados Unidos e retomam as suas vidas. Cenas estranhas como a de um cavalo solitário em pleno deserto mostram as intenções do diretor em colocar açúcar onde realmente não seria necessário.

Soldado Anônimo pode ser considerado uma espécie de filme anti-americano (zomba de uma guerra que foi considerada incrivelmente importante para os Estados Unidos), mas que não chega a ser interessante para os outros povos, ao contrário de filmes como Dogville, que servem como uma crítica realmente relevante ao império de Bush. Ainda assim com seu humor diferenciado e uma bela fotografia clara (porém fica horrível ler as legendas brancas no cinema - obviamente isso não é desmérito do filme) o filme pode ser recomendado, desde que não se espere nenhuma nova obra-prima de um ainda novo e promissor diretor.

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