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Críticas

Cineplayers

Sam Mendes retrata com mão firme o conflito no Iraque nos anos 90, apesar de não fazer provocações à política americana atual.

8,5

Jarhead é o jargão americano que se refere ao corte de cabelo dos soldados, difícil traduzir o termo para o português mas "Soldado Anônimo" transmite relativamente bem a idéia que o título original tenta passar. Baseado num livro autobiográfico, Mendes aproveita a Guerra do Golfo para criar um retrato do soldado americano, o que já foi feito em filmes sobre a Segunda Guerra e o Vietnã várias vezes mas que, por ser mais atual, faz com que a identificação com a platéia seja maior e por isso mesmo mais incômoda.

Mendes é um diretor seguro e sua narrativa forte prende a atenção desde as primeiras cenas, uma melhora depois do insípido veículo de Tom Hanks em Estrada Para Perdição. O uso de música dos anos 90 e da fotografia inspiradíssima de Roger Deakins ajudam a embalar a trajetória do soldado Swoff, interpretado pelo Jake Gylenhaal que é um dos melhores atores jovens em Hollywood no momento, ele empresta credibilidade ao personagem que nada mais é do que um jovem americano comum jogado em uma situação que beira o absurdo. Mendes até se permite um certo surrealismo, como na bela cena em que Swoff encontra um cavalo coberto de petróleo em pleno deserto.

A Guerra do Golfo foi a primeira marcada pelo uso extensivo de tecnologia e aos soldados não restou quase nada para fazer, muita gente erroneamente entra no cinema esperando ver batalhas mas essa guerra não foi assim, o filme utiliza isso para se aprofundar na psique dos soldados, de como o tédio e o isolamento os afeta e também rende várias cenas de humor. Mas além das situações cotidianas, Mendes também revela alguns aspectos perturbadores como a demonstração de racismo durante a exibição de Apocalipse Now e nas diferenças entre as classes, com o conflito entre o ignorante soldado redneck vivido por Evan Jones e os outros nitidamente mais abastados. Há de se destacar também no elenco de apoio o ótimo Peter Sarsgaard que vive o enigmático e desequilibrado Troy, o oscarizado Jamie Foxx não me impressionou mas a culpa é mais do roteiro, seu sargento não foge do clichê e ainda possui uma fala nitidamente voltada para aliciar jovens espectadores a se alistarem.

Muito se criticou Mendes por não utilizar o filme para comentar a atual situação no Iraque, mas se engana quem pensa que é um trabalho puramente de entretenimento. Apesar de não ser o foco do filme, há críticas à incompetência e até desumanidade do exército americano, mostrando os soldados sendo usados para testar drogas não aprovadas, aos próprios preconceitos e hipocrisia americanas, e ainda mais presente são as inúmeras menções à Guerra do Vietnã, fica impossível não estabelecer o paralelo entre o que acontece hoje e o que aconteceu nos anos 70 apesar dele não fazer isso de maneira direta.

Apesar de não ter tido a coragem de ser mais contundente em relação aos problemas políticos atuais, Soldado Anônimo é um dos melhores do ano pela excelente direção, pelas interpretações fortes e pelas imagens, a cena da chegada na região dos poços incendiados é a minha escolha para uma das belas vistas em 2005 e, sobre a Guerra do Golfo, é sem dúvida o filme mais relevante.

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