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Críticas

Cineplayers

Um eficiente reinício para a série, que tem tudo para agradar tanto fãs quanto os não-iniciados.

7,0

J.J. Abrams é um cara corajoso. Somente alguém com muita ousadia – ou uma certa tendência ao masoquismo – aceitaria reformular completamente uma das séries mais cultuadas e veneradas de todos os tempos. Criada há mais de 40 anos por Gene Roddenberry, Jornada nas Estrelas solidificou-se, com uma dezena de filmes e séries de TV, como um dos grandes ícones da cultura pop, fazendo com que personagens como Kirk e Spock adentrassem no imaginário popular. Até mesmo quem não nasceu naquela época já ouviu falar do oficial de orelhas pontudas ou da nave Enterprise.

Mesmo com todos os milhões de seguidores, Jornadas nas Estrelas enfrentava, há anos, um declínio de popularidade, permanecendo viva graças à memória dos fãs que acompanharam as aventuras da tripulação original (antes do Picard de Patrick Stewart assumir). Assim, nada mais óbvio para o estúdio do que imaginar uma completa reinvenção de Jornada nas Estrelas, buscando atingir um novo público e aproveitando para fisgar os nostálgicos trekkers que fariam de tudo por ver a equipe mais uma vez nas telonas. Eis que chegamos, finalmente, ao Star Trek de J.J. Abrams.

Escrito por Roberto Orci e Alex Kurtzman (responsáveis pela idiotice conhecida como Transformers – O Filme)¸ Star Trek mostra como a tripulação original acabou se juntando na Enterprise. James Kirk é um jovem impetuoso e rebelde, que decide partir para um treinamento na Federação. Enquanto isso, Spock é um brilhante oficial que, obviamente, tem suas desavenças com Kirk. Quando uma nave pede socorro, ambos acabam se unindo na nave Entreprise, junto ao resto da equipe, para combater o Capitão Nero, um romulano que busca vingança pela destruição do seu planeta, ameaçando acabar com a Terra.

Pois a notícia é boa: Star Trek é um filme repleto de qualidades, uma produção que certamente agradará tanto os fãs quanto os iniciantes no universo da Entrerprise. J.J. Abrams não tem a menor ambição de construir algo mais do que um típico filme-pipoca, que apenas entretém por duas horas, mas o faz com extrema eficiência. Abrams é um cineasta que sabe como capturar o público e oferecer exatamente que ele quer, sem menosprezá-lo – como pode ser percebido na série Lost e em Missão Impossível 3 –, o que acontece novamente aqui. Star Trek é um filme divertido, que equilibra bem enredo e personagens com cenas de ação empolgantes e efeitos especiais nada menos que impecáveis.

O primeiro aspecto a ser destacado é a reverência de Abrams, Orci e Kurtzman ao material original. São diversas referências à série clássica, algumas delas que até iniciados irão perceber, como a presença de Leonard Nimoy e a narração final sobre “audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve”. No entanto, os roteiristas e o cineasta não se limitam às amarras e atualizam a história e personagens o tanto quanto necessário. Modificam, não desrespeitam. Ainda que as características básicas das personalidades se mantenham, Orci e Kurtzman acrescentam novas camadas e criam uma trama ágil, que exige atenção para ser compreendida – quem piscar o olho pode perder o fio da meada sobre às viagens no tempo. Quem quiser, pode até encontrar homenagens a Star Wars, como o planeta de gelo e a briga na perfuradora, que remetem ao planeta Hoth e  à cena de ação sobre o poço do Garlacc no universo de George Lucas.

No entanto, ainda que o enredo funcione em aspectos gerais, o roteiro peca em diversos pontos, principalmente ao acelerar alguns momentos que mereceriam maior cuidado. Por exemplo, nada é dito sobre o que fez Kirk mudar de ideia e decidir embarcar com os novos recrutas após recusar o convite do comandante Pike. Além disso, o relacionamento entre Spock e Uhura se limita a duas cenas, a primeira delas ocorrendo praticamente pela metade do filme, o que causa estranhamento no espectador. São alguns pequenos detalhes que poderiam – e deveriam – ser melhor trabalhados, mas que acabam sendo esquecidos, como se fosse prejudicial ao ritmo exigido de uma produção comercial norte-americana.

E ritmo não falta a Star Trek. Desde a ótima cena de abertura e das apresentações de Spock em Vulcano e de Kirk ao som dos Beastie Boys, Abrams pega o espectador pelo pulso e somente larga quando os créditos finais começam a aparecer. O cineasta constrói uma cena empolgante atrás da outra, não somente graças aos efeitos especiais, mas devido a um trabalho de direção hábil e uma montagem repleta de energia. Star Trek jamais deixa a bola cair, ainda que Abrams ocasionalmente apele para alguns recursos desnecessários, como o excesso de planos com a câmera de lado ou balançando. Ainda assim, o filme conta com diversas seqüências de ação irrepreensíveis, como a já citada do início, aquela sobre a perfuradora e o final envolvendo o buraco negro.

Mas o que realmente faz Star Trek funcionar não é o espetáculo visual, e sim os personagens. Era fundamental para o reinício da franquia que Kirk, Spock e cia. conseguissem transmitir carisma e estabelecer uma dinâmica eficiente, o que realmente acontece. Claro que não se exige, agora, uma química igual a que os atores originais possuíam, mas a nova produção inicia de maneira eficaz esse relacionamento que certamente será melhor desenvolvido em futuras produções. Star Trek é a história do nascimento de uma amizade e do surgimento dos laços entre uma equipe, e Abrams jamais perde o esse foco, mesmo em meio às feéricas explosões no espaço.

Claro que os méritos dessa conquista também se devem – e muito – ao elenco. Chris Pine surpreende no papel de Kirk ao carregar o filme com naturalidade, exibindo uma bem-vinda comicidade e retratando o espírito rebelde e contestador do personagem sem se tornar irritante. Ao mesmo tempo, Zachary Quinto demonstra talento ao conseguir transmitir a natureza conflituosa de Spock, preso entre a razão e a emoção. Mas é quando os dois dividem a tela que Star Trek realmente demonstra todo o seu potencial. A química entre Pine e Quinto é ótima e todos os momentos entre os personagens – sejam os cômicos, os dramáticos ou os de ação – convencem sem maiores problemas e, acima de tudo, transmitem a sensação de que algo realmente está sendo erigido ali.

Já em relação ao restante do elenco, o resultado é mais irregular. Se Zoe Saldana encarna Uhura com naturalidade e sensualidade, Simon Pegg exibe mais uma vez seu timing cômico invejável como Scotty e Leonard Nimoy surge completamente dono de seu personagem (em não apenas uma homenagem, mas um papel fundamental à trama), Karl Urban e Anton Yelchin parecem exagerados como McCoy e Checov. Enquanto isso, Winona Ryder e Jennifer Morrison (do seriado House) são completamente subutilizadas, assim como Eric Bana no papel de Nero. Aliás, se há um grande problema em Star Trek é esse: o vilão jamais parece à altura da tripulação da Enterprise.

Contando ainda com uma ótima trilha sonora de Michael Giacchino e bons momentos de humor, Star Trek é um belo ponto de partida para uma franquia que tem tudo para voltar a conquistar admiradores. O filme não tem a ambição intelectual da série original, mas também não se propõe a isso. É feito com o objetivo de divertir e, visto por essa ótica, é muito bem sucedido. E o melhor: deixa o espectador querendo acompanhar novas aventuras de Kirk, Spock e de toda a tripulação da Enterprise. Ponto para Abrams e toda a sua coragem.

Comentários (2)

Kennedy | terça-feira, 18 de Junho de 2013 - 19:19

Nossa, minha opinião quanto a esse filme é quase que a oposta ao que está nesta crítica. Superestimado.

Patrick Corrêa | domingo, 13 de Julho de 2014 - 00:18

Um entretenimento bem conduzido pela direção e bem interpretado pelo elenco. Como não-iniciado na série, fiquei satisfeito.
Boa crítica!

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