Durante o debate no Festival do Rio, o longa de estreia de Mavi Simão já vem suscitando comparações múltiplas, seja com o terror de Gabriela Amaral de Almeida, o cinema marginal "udigrúdi" da década de 70 e até mesmo os filmes alucinatórios de David Lynch. De certa forma, Terminal Praia Grande é tudo isso: terror, surrealismo, retrato cultural e jornada íntima.
Tudo gira em torno de Catarina, uma jovem que no início do filme acorda de uma festa que bagunçou toda a sua casa e, a partir daí, passa a lembrar os últimos dias que antecederam sua decisão final: deixar São Luís. Entre esses fatos, o reencontro com Francisco, um ex-namorado que desapareceu. Essa é a trama básica de um filme sumariamente evocativo.
Adaptado do conto Ônibus, de Júlio Cortázar, a cineasta contou que o longa também parte da sua vontade de mostrar a cultura do Maranhão para o mundo e é carregado da iconografia tipicamente associada com o ambiente: abundam imagens da fauna local, como os urubus e caranguejos evocados pelos recifenses do Chico Science e Nação Zumbi, bem como gravações em locação que dão um sentido geográfico à trama.
Em uma tour de force guiada por uma única personagem, não dá para deixar de comentar a performance central de Áurea Maranhão, centralizando muitas mulheres em uma; seja a dançarina da festa, a perdida que vaga pelas ruas, a apaixonada que olha para o amor reencontrado com uma tensão suspensa, muitas camadas sem muito contexto em um filme que se demosntra sumariamente imagético (ou até mesmo "superficial" e "tátil", como definiu a atriz).
Dentro desse caráter alucinatório, apesar da diretora dizer ter maior identificação com surrealismo do que com o terror, uma bem realizada set piece de um ônibus figura como uma assustadora cena da filmografia nacional recente. Ainda assim, nem tudo é apenas promessa e, mesmo com o caráter "doidão" frequentemente destacado, o filme se revela surpreendentemente narrativo, o que causa até um certo estranhamento: as cenas alucinatórias são contextualizadas como sonhos; os movimentos soltos, como flashbacks; e há até uma reviravolta final para ressignificar certas evocações anteriores.
Isso causa até mesmo uma impressão de uma obra mais convencional (incluindo na estética) invadindo a outra, com um filme mais básico e formulaico forçando para habitar junto a um mundo de pulsões subjetivas. E tal drama, mínimo, jamais recebe tanta importância, parecendo desimportante, ali apenas para inflar a duração e minar o desconforto estético-narrativo apresentado anteriormente.
Transbordam boas ideias; ainda que a informação final torne o filme apenas comum, as muitas trucagens, a ocasional inserção de personagens crípticos e o uso diversificado de cores e ângulos de câmera tornam Terminal Praia Grande no mínimo diferente, e que poderia ter sido mais ainda.
Crítica da cobertura do 21º Festival do Rio
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