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Críticas

Cineplayers

Um filme tecnicamente esplendoroso, mas com conteúdo e valores que não fogem dos filmes comerciais de Hollywood.

5,0

Um dos meus filmes mais esperados dos últimos meses é, sinto dizer, uma decepção para mim. Excluindo-se os excepcionais valores técnicos da produção, O Último Samurai perde preciosos pontos quanto entram em cena elementos como realismo, diálogos e conteúdo. Cheio de momentos pretensiosos, o diretor  Edward Zwick, do regular mas altamente premiado Tempo de Glória (cujo tema é a Guerra Civil norte-americana) tentou criar um épico de larga escala, cheio de lições de moral e significado. O problema é que tudo que ele conseguiu, e isso pode ser facilmente sentido já lá pelo meio do filme, foi criar um filme que encante o grande público com momentos visuais de tirar o fôlego e filosofia rasa de botequim. Uma análise um pouco mais profunda desmascara esse “véu” Hollywoodiano sem problemas.

Em primeiro lugar temos a história, um palco para os Estados Unidos se meterem novamente na briga dos outros (se bem que aqui eles foram chamados para isso), e se o objetivo foi criticar justamente esse fato, o tiro saiu pela culatra, já que o personagem de Cruise, o capitão Nathan, entra herói (bêbado, é verdade, mas ainda assim consagrado no seu país) e sai herói do filme (se vivo ou morto, só vendo para descobrir). Nathan é contratado pelos japoneses para derrotar um grupo de samurais rebeldes no país, e terá que lidar e ensinar um exército despreparado enfrentando experientes guerreiros, cheios de virtudes e coragem. Essa parte é mostrada muito rapidamente, pois logo Nathan é capturado pelos samurais e é onde a parte filosófica do filme começa (e mesmo ela sendo piegas, ainda assim é a parte mais interessante do filme).

Nathan aprende sobre os verdadeiros valores dos guerreiros, choca-se com uma cultura milenar muito diferente da norte-americana e ainda tem que resolver diversos conflitos internos. Aí o filme começa a falar de honra, coragem, vergonha, entre outros tópicos que poderiam enriquecer muito qualquer filme. Mas todos eles são tratados muito superficialmente (mesmo que o filme tenha mais de duas horas e meia de duração), com pinceladas tão descaradamente Hollywoodianas, que mesmo a boa (não mais que isso) interpretação de Tom Cruise não motiva a nos encantar com as idéias que são passadas. Em toda a parte do cativeiro de Nathan com os samurais, o diretor preocupa-se mais em mostrar uma tentativa de romance do personagem com a esposa do homem que ele matou (que sempre soa muito forçada) e também uma tentativa de redenção do personagem, bêbado e humilhado, que tenta aprender os preciosos valores samurais, do que realmente encarar tais valores com amor e ousadia (sei que isso é bastante subjetivo, mas não há melhor maneira de ser explicado). Embora tudo isso soe interessante, não consegue despertar muito interesse, pois o personagem de Nathan não é bom o bastante, e sempre parece destoar muito de tudo que o cerca, por ser visivelmente uma caricatura jogada forçosamente pela máquina de fabricar emoções chamada Hollywood. Pode entreter, mas não passa disso em momento algum.

Creio que o melhor elemento não-técnico de todo o filme seja a interpretação de Ken Watanabe, mesmo que perto do final seu personagem seja ridicularizado com situações risíveis de roteiro, deixando-se submeter a falas e a atos que realmente não condizem com o que se espera de um samurai tão sábio quanto foi dado a aparentar que ele era. Toda a parte do filme a partir do seu resgate, já mais para o final, pelo “personagem-Hollywood” Cruise, é demasiada inacreditável para ser levada à sério (um exemplo: conseguem convencer um guarda imperial de que ele, Nathan, é o presidente dos Estados Unidos, numa tentativa de criar humor para o filme, mas que acaba ofendendo a inteligência dos japoneses e do espectador). Ainda assim, o ator nos oferece uma dose de lições muito boas, e é o que mais se aproxima de realmente nos dizer algo que tenha significado e conteúdo, sem cair numa caricatura pré-moldada feita para emocionar.

Com tanta coisa contra (há um ataque ninja totalmente deslocado, desnecessário e confusamente filmado na parte do cativeiro ainda, só para citar outro exemplo de fragilidade do roteiro), pelo menos o filme é realmente bem produzido. Com orçamento enorme (perto dos US$ 150 milhões), não era para menos. As recriações de época são fantásticas (inclusive de cidades japonesas, com composições que mostram toda uma cidade em uma só tomada – belíssimo!). A fotografia, principalmente na parte em que Nathan está com os Samurais, é também muito graciosa, com muito verde, casas rústicas, flores (maravilhosas) e horizontes coloridos que parecem uma obra-prima da pintura. A trilha sonora, de Hans Zimmer, ficou muito boa, embora não apresente nenhum momento de beleza em particular, apenas fazendo seu papel dentro do possível. Não deve ganhar nenhum prêmio importante, se me perguntarem.

A batalha final (obviamente, você já sabia que o filme tem uma, certo!?) tem tamanho quase épico, foi filmada em campo aberto na Nova Zelândia (novo “point” para produções épicas norte-americanas, ao que parece), com o uso de centenas de figurantes. Fora uma tomada de muito longe dos combatentes, o filme não utiliza computação gráfica nas cenas de batalha para aumentar os exércitos, o que é realmente bom e torna tudo mais real e crível. Não há excesso de sangue no filme, embora ele seja razoavelmente violento e não recomendado para crianças, ainda que hoje em dia a maior parte delas esteja acostumada a ver violência tanto quanto desenhos animados.

Kurosawa, que criou filmes incríveis do tema, com valores sólidos e apresentados de forma a fazer pensar, como Os Sete Samurais e Ran, não foi igualado por um estúdio norte-americano desta vez (e, sinceramente, nunca esperei por isso). O filme tem valores que teoricamente poderiam criar uma história sensacional de perda e redenção que, mesmo sendo clichê só pelo tema, tinha tudo para se tornar um novo clássico. Mas o diretor e roteirista jogaram sempre a favor do divertimento fácil (que pra mim não funcionou, o filme é chato de qualquer forma), e não desenvolveram tais valores como seria necessário para criar o tal clássico. A sensação geral é a de se ver um filme muito bem acabado, mas escrito para espectadores de cinema casuais.

Comentários (1)

Victor Henrique Schmidt Timm | terça-feira, 27 de Janeiro de 2015 - 21:04

Esse filme é muito bom, não tem explicação uma nota 5. Isso que é foda, falta de critério.

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