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Críticas

Cineplayers

Releitura sem tração.

5,0
Há 5 anos atrás, o diretor norueguês Hans Peter Molland apresentou seu longa O Cidadão do Ano, que teve uma carreira larga pelo mundo, para um filme dessa nacionalidade. Com passagem em festivais importantes e pelo circuito, o filme é um thriller com toques de humor cáustico repleto de violência e que conseguia facilmente ser visto como a matéria-prima de um remake americano, estrelado exatamente pela pessoa que acaba ocupando o cargo de fato; sai Stellan Skarsgard, entra Liam Neeson. O diretor continua o mesmo, no entanto. No comando da versão americana de seu produto, Molland encara o desafio de apresentar a novas plateias seu projeto, sabendo que com a visibilidade, seu roteiro tão interessante teria chance de reverberar mais. A forma como ele escolhe para situar seu "novo" filme é o grande desafio.

A trama é rigorosamente a mesma: um cidadão exemplar de uma pequena comunidade que sobrevive embaixo de inverno constante é condecorado com um título honorário pelos seus préstimos locais. O que ele faz? Dirige o limpador de neve das estradas. Em determinada noite, seu filho entra em confronto com o grupo de traficantes locais a quem deve e é assassinado. Com o casamento destruído e devastado pela dor, esse homem resolve não apenas matar um por um da organização, como criar uma teia de destruição em massa que coloque seus membros uns contra os outros. Aos poucos, o filme nos apresenta a todos os vértices dessa trama, seus conflitos particulares e seus desdobramentos mediante o efeito dominó criado pela trilha de mortos que se acumula. Essa sinopse poderia ser utilizada para qualquer das duas versões, tendo em vista que a adaptação do material praticamente intocou o roteiro.

A partir do momento que o material original foi transposto quase 'ipsis literis' em seu argumento e desenvolvimento, o trabalho de Molland enquanto realizador fica ainda mais arriscado; como organizar novo material imagético que você já tratou anteriormente? A saída dele não poderia ser mais preguiçosa, resumindo seu trabalho a limpeza de todos os excessos gráficos, ou seja, retirando da obra tudo o que originalmente era um diferencial. Então todas as sequências arriscadas do ponto de vista estético são amenizadas, resultando num produto frio como o ambiente retratado. Se no original a temperatura era equiparada tendo em vista a constante tensão que eventualmente se rompia em violência, a economia de textura imposta aqui é um impeditivo narrativo, que cria diferencial justamente no que sua matriz tinha de mais sedutor.

No elenco, não há um destaque na linha de frente, embora seu elenco seja composto por Neeson e Laura Dern, entre outros. Mas perdido como uma espécie de participação especial do filme se encontra uma figura que salva o projeto do lugar de repetição. No início dos anos 90, o então astro Steven Seagal estrelou uma sucessão de filmes de relativo/grande sucesso nos cinemas, e em um deles o vilão foi imortalizado. O título era Fúria Mortal, dirigido por John Flynn (de A Outra Face da Violência) e que contava com o antagonismo do arrebatador William Forsythe, que seguiu marcado por essa figura anos afora. Pois ele é recuperado no filme com um personagem envolvido em todo o imbróglio criminal, mas que guarda profunda humanidade, ideal para a figura ameaçadora de Forsythe quebrar um possível estereótipo e conferir credibilidade e empatia. 

Tirando esse ponto quase exclusivo, o filme se sobressai apenas para quem não conhece o título original, que pode embarcar na repetição de tiques e brincadeiras da produção. Mesmo para quem é espectador exclusivo da produção americana, fica a sensação de que o potencial completo do seu universo não é explorado, quase empalidado por suas escolhas seguras. A quem procura novo exemplar do cinema que Neeson tem entregue a bordo do comando do esteta Jaume Collet-Serra, também vai se decepcionar tendo em vista que Molland não se esforça nem um pouco para entregar de maior polimento. É um produto de consumo ligeiro, sem capricho de embalagem, apenas um criminal que não alcança os lugares que poderia, e que mais uma vez coloca contra a parede a necessidade de remakes onde nenhuma revitalização seja feita. 

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