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Críticas

Cineplayers

O horror das relações humanas em visita aos sonhos de um adolescente.

7,0

Zumbilândia está mais próximo de Férias Frustradas de Verão do que de Todo Mundo Quase Morto e isto, a rigor, diz praticamente tudo sobre o filme. Na obra de Greg Mottola, Jesse Eisenberg é James, personagem que carrega nos ombros a responsabilidade de representar uma parcela de uma geração que, em virtude dos avanços da tecnologia e da globalização, cresce ao mesmo tempo tão mais conectada com o mundo quanto distante do contato direto com as peças que o compõem. Surgem, como conseqüência, as dificuldades de relacionamento quando este não passa pelo filtro conversor de um computador e a insegurança sempre latente na menor das exigências de um contato físico (como a sonhada primeira transa do protagonista, personagem que tanto pode pertencer a 1982, ano em que se passa a história, quanto a 2010).

Pois Zombieland me parece exatamente o mundo com o qual James sonharia caso tivesse fumado algumas gramas a mais antes de dormir. Columbus, o personagem de Eisenberg neste filme de Ruben Fleischer, é em prática uma extensão do James de Mottola. Solitário, inseguro e inteiramente dependente da tecnologia, passa as noites em casa à base de pizza, refrigerante e videogame, e enxerga na inconsistência do casamento dos pais, por sinal outro reflexo dos novos tempos, um bom motivo para temer relacionamentos, apesar de desejá-los. E realmente deseja. Seu grande sonho é mais tradicional do que qualquer outro: quer uma garota para afagar os cabelos e dar o ombro para deitar. Nada mais que isso. Quer apenas um relacionamento como conhece nos filmes mais românticos, apaixonante e sem complicações.

A imagem de afeto perseguida por ele é finalmente alcançada, numa precisa inversão de expectativa. “A primeira garota que entra na minha vida e ela tenta me comer”, diz ele, depois de descobrir na marra, após ceder o ombro para sua vizinha gostosa se reconfortar, que o mundo foi contaminado através de um hambúrguer e todos seus habitantes se transformaram em zumbis ferozes e famintos. Pois Columbus inicia sua jornada através dos relacionamentos humanos justamente quando o mundo que conhecia se transforma em um caótico cenário de depredação, com gente comendo gente, mortes e sangue, assim como nos jogos que jogava. Ele fica preso, então, a uma realidade semelhante à de seu imaginário, mas mais do que nunca deseja fazer parte daquele mundo de pessoas reais que tão pouco aproveitou, e que gostaria de ter aproveitado muito mais.

O olhar de Fleischer por sobre esta parcela plugada diretamente com as conseqüências da globalização, basicamente formada pela juventude que evoluiu junto dela, é de uma precisão e contundência dignas de Mottola, hoje a grande referência a se bater sobre o tema. Diante do filme-de-zumbi, gênero bastante revisitado e conseqüentemente desgastado nestes últimos anos, o diretor constrói uma narrativa que se assemelha aos videogames e insere seu protagonista em uma realidade que domina de forma mais eficiente do que sua própria vida. Columbus determina regras, cumpre missões e estuda friamente sua checklist antes de dar qualquer passo, e é desta forma que se torna um dos poucos sobreviventes desta jornada insana. Ele, duas garotas safadinhas (não no sentido sexual, afinal uma delas tem apenas 12 anos – mas, também em virtude dos jogos que jogava, sabe até mesmo atirar) e um brutamontes que certamente seria o herói nos filmes de antigamente, mas que na Zombieland passa aperto perto da molecada.

Com bom humor, as já tradicionais referências à cultura pop (como afinal estamos imersos em um sonho de James não poderia deixar de tocar os gloriosos Velvet Underground na trilha-sonora) e algumas cenas de morte bastante criativas (incluindo uma engraçadíssima participação de Bill Murray e sua mansão em Hollywood – que concentra alguns dos melhores momentos do filme) Zumbilândia é um filme que passa voando (ou seria correndo?) e, especialmente, sem que a perspectiva fuja sequer um momento do âmbito pessoal. Afinal, dane-se a sociedade, a grande catástrofe de Zombieland é a de um garoto buscando o amor em meio a um mundo consumido por zumbis.

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