Vinte anos depois de Rent Boy (Ewan McGregor) saquear as dezesseis mil libras que a trupe conseguiu num esquema com drogas, o personagem volta de Amsterdã para a conclusão de uma história até ali inacabada. O cenário é o mesmo, o saudoso Reino Unido, que dessa vez faz parte da história quase como um lembrete de tudo aquilo que passou por ali. Diferente do exemplar que é sua matéria-prima, T2 não conta com um enredo bem estruturado, o filme aposta suas fichas no sentimento de nostalgia ao assistir uma obra de peso sobre o comportamento dos filhos daqueles jovens insanos da geração Z.
Spud (Ewen Bremmer), Simon (Jonny Lee Miller) e Begbie (Robert Carlyle), um a um se encontram cronologicamente com Mark Renton, o outrora Rent Boy. O impacto dessa colisão entre passado e presente é tão intenso que trespassa narrativa e estética, alterando a forma do objeto fílmico e o transformando numa espécie de vórtice temporal. Assim podemos dizer que o filme então se projeta como um monólogo (sim, pode ser um daqueles ditos pelo Rent/Mark) perdido vinte anos no tempo. A mensagem sobre abusos, excessos e a moral da história sobre a vida tem seu espaço tomado por uma esquizofrênica fórmula repetida de gato e rato que acompanha a perseguição dos personagens – e do próprio filme – em se encontrar como algo diferente daquilo que um dia já foram. Num raciocínio lógico, pode-se dizer que é um filme sobre outro filme.
Apesar do extenso período de tempo entre as duas produções, poucos detalhes sobre os vinte anos que se passaram são devidamente explicados, a maior parte desse tempo se é subentendida como uma repetição das mesmas atitudes, concluindo num mesmo resultado, as coisas continuam iguais. O quarteto continua cheio de problemas, em suma, boa parte provida de um amargo passado com drogas, e suas principais atividades como adultos continuam sendo as mesmas, fraudes, extorsão, pequenos golpes e delitos.
A mensagem anti-drogas e anarquismo do filme é bem genérica diante da quebra de tabus no que se diz respeito à esses temas nos dias atuais. A obra comete o erro de olhar para os assuntos apenas como observadora, não se arriscando a mais uma vez entrar de cabeça nos medos e respostas da prole de todo um contingente do público. É triste de assistir ao que poderia ser uma síntese de vários movimentos e desdobramentos sócio culturais se tornar um objeto da indústria cultural. O nome Trainspotting além de um registro livre de censura sobre um determinado período de tempo e comportamentos, também é referência de uma geração de jovens efervescente, em fase de mudanças e que ainda não sabia ao certo o que esperar da vida.
Danny Boyle está desde 1997 tentando repetir a façanha. T2, apesar de entreter dentro do atual molde das grandes produções cinematográficas, nunca alcança a projeção que seu antecessor alcançou nos anos em que foi lançado. Enquanto um dos filmes discute a abjeção de determinados nichos para com o meio, o outro se torna a abjeção. É, nesse sentido, um filme para nos lembrar outro filme.
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