A melhor palavra para descrever O Mordomo da Casa Branca é excesso: Nesta nova empreitada do cineasta Lee Daniels há excesso de subtramas, excesso de boas intenções, excesso de personagens e excesso de atores. Assim, depois do bom Preciosa e do regular Obsessão, Daniels prova não ter aprendido muito com os erros cometidos em seus filmes anteriores e se preocupa mais em arrancar lágrimas da plateia e prêmios de jurados emotivos ao invés de se esforçar em criar uma obra consistente e minimamente satisfatória. Com isso vem o grande problema de Lee Daniels' The Butler: Sua total falta de foco. Incialmente centrado na história de Cecil Gaines, que serviu todos os presidentes dos Estados Unidos durante décadas, o filme logo se distraí e parece investir numa discussão sobre a política americana da época, logo depois dá mais atenção a dramas familiares, e na maior parte do tempo, se esquece de seu real tema: A luta da população negra por seus direitos como cidadãos e como seres humanos. E exatamente por ter diversas camadas narrativas, O Mordomo da Casa Branca acaba não conseguindo desenvolver nenhuma delas de maneira completamente satisfatória.
O roteiro, escrito por Danny Strong, não falha apenas em desenvolver o lado político da história, como também não consegue lidar com tantas passagens de tempo que o enredo propõe, recorrendo a diversos atalhos narrativos preguiçosos que prejudicam a fluidez do longa. Assim, se a didática e fútil narração em off e a necessidade de apontar o ano, e o presidente que está no poder, de quinze em quinze minutos (o que comprava, mais uma vez, que o script não contextualizar a história dentro dos vários pulos temporais) se mostram defeitos irritantes, nada se compara aos diálogos extremamente expositivos que são responsáveis por criar e encerrar subtramas desnecessárias (como o alcoolismo de Gloria Gaines). O Mordomo da Casa Branca ainda dá a seus dois primeiros atos a injusta função de martelar na mente do público – repetindo discursos morais - como a população negra era maltratada na época, criando situações que mesmo tendo uma relativa força soam repetitivas e (a partir de certo ponto) descartáveis, marcando presença apenas para chocar mais a plateia e, com isso, ter mais chances de arrecadar algum prêmio por sua “coragem”.
E quando Strong finalmente deixa um pouco de lado a questão social (que, a certa altura, já transformou o cérebro do espectador em pudim), o roteirista resolve focar em conflitos dentro da vida do protagonista, o que, novamente, acaba sendo completamente frustrante, já que a maioria – se não todos – os personagens são rasos e sem um pingo de personalidade e as relações entre eles são ainda mais artificiais (em certo ponto, por exemplo, o amor de dois irmãos é brutalmente corrompido pelo simples de terem ideologias políticas diferentes, resultando em um diálogo supostamente forte, mas que no final apenas demonstra o real propósito do cineasta). Diferente do que se espera – já que em longas similares, como A Dama de Ferro e Histórias Cruzadas, o excelente elenco conseguia se salvar, elevando o resultado final -, O Mordomo da Casa Branca tem uma lista de atores completamente desajustados e que pouco fazem em tela: Forest Whitaker apesar de ter uma interpretação satisfatória, é prejudicado por viver um personagem raso e pouco interessante (afinal, a real trama do filme está acontecendo em torno dele, e não com ele); Oprah Winfrey se salva com uma atuação sóbria e bem dosada – provavelmente a única interpretação realmente admirável – e atinge outro nível em suas últimas aparições em tela. Infelizmente, o que acontece é um verdadeiro desfile de celebridades que surgem apenas por alguns instantes e logo desaparecem da trama (Alan Rickman, Jane Fonda e Robin Williams têm no máximo duas cenas cada; o coadjuvante com mais tempo em tela acaba sendo John Cusack, com três ou quatro cenas).
Ciente de estar lidando com um material que poderia ser uma experiência minimamente emocionante, Lee Daniels abusa do melodrama e transforma momentos que poderiam ser complexos, singelos e tocantes, em situações artificiais e novelescas, levando ao extremo emocional instantes simples (um catastrófico jantar é um claro exemplo disso). Pecando até mesmo na maquiagem (Whitaker parece o mesmo do início ao fim, com exceção da calvície que surge aos poucos), O Mordomo da Casa Branca ao menos trata com respeito o sofrimento da classe oprimida por tanto tempo – mesmo que a discussão racial promovida pelo filme não se aprofunde, apostando no mesmo discurso toda vez que aborda o assunto – e se o longa se transformou em uma obra problemática e esquecível, é culpa da falta de zelo da equipe, afinal a história tinha potencial para discutir um tema sensível e analisar questões políticas significativas. O excesso de cuidado – o único deixado de fora, aparentemente – fez muita falta.
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