“O Sétimo Selo” narra o retorno do cavaleiro Antonius Block, junto a seu servo, à sua terra, 10 anos após sua partida; ao passo que nesse tempo esteve lutando nas Cruzadas. É no contexto dos horrores do pós-guerra e da devastação causada pela peste negra, no século XIV, que Antonius busca encontrar o sentido da vida, quando a morte vem lhe buscar. Na tentativa de encontrar respostas para todas as suas perguntas, ele propõe à morte que joguem uma partida de xadrez, em que o vencedor seguirá seu destino – Antonius a vida, a Morte a morte (dos outros, inclusive de Antonius). Com esse cenário promissor Ingmar Bergman discorre sobre diversos temas que sempre assolaram a humanidade: Deus, diabo, vida, morte, fé, religião e medo (do desconhecido, principalmente).
Obviamente que ao nos situarmos na época em que o filme se passa, podemos compreender melhor todos esses questionamentos. Se hoje, mais de 500 anos depois, ainda não encontramos explicação para os temas citados, as escolhas de Bergman para seu filme são extremamente pertinentes. É nessa atemporalidade que Bergman faz com que seu filme seja grandioso, afinal, apesar de todos os avanços científicos, tecnológicos e filosóficos, ainda não somos capazes de responder as questões mais básicas que se referem à existência não só do homem, mas de todo o universo. Portanto, o filme de Bergman nos propõe a pensar o quão evoluídos somos atualmente, e mais, percebermos que não somos muito diferentes daquelas pessoas de centenas de anos atrás.
Basta vermos, só pra citar um exemplo bastante evidente no filme, que a natureza humana não foi e, provavelmente, nunca será alterada. Se há séculos atrás existiam guerras muito violentas, não é confortante perceber que nossa realidade é igual (e aqui incluo a guerra do dia-a-dia). E é importante ressaltar, ainda, que essa busca existencial de Antonius parte de um ótimo princípio; após longos anos combatendo e convivendo com a morte, nada mais natural do que tentar entender o sentido da vida. Afinal, tratar a morte com normalidade é não dar atenção que a vida merece. E aí, entra um paradoxo, porque é normal morrer, mas as pessoas – como mostra o filme – só pensam na morte, quando na verdade deveriam estar mais preocupadas com sua sobrevivência, ou seja, o fato de estar vivo.
É nessa dualidade entre vida e morte – onde, uma complementa a outra – que também é discutido também o polêmico tema da religião e do papel da Igreja na vida das pessoas. Estes temas, bastante abordados ao longo da história do cinema - de forma irônica em Dançando no Escuro, de Lars Von Trier, e no clássico conflito da fé contra a ciência em O Nome da Rosa, de Jean-Jacques Annaud – são muito amplos em O Sétimo Selo. Em seu filme, Bergman não nos sugestiva a pensar isso ou aquilo sobre religião e Igreja, mas sim criarmos nossa própria visão – visão que me absterei de compartilhar com você leitor.
Bergman ainda discute sobre fé e o medo das pessoas diante do desconhecido; mais uma vez o contexto do pós-guerra e da peste negra é muito apropriado. Sem entrar em detalhes que estraguem a história do filme, podemos dizer que diferentes visões sobre a fé são bastante coerentes; não é por acaso que existe um conflito de ideais entre Antonius e seu servo, onde o primeiro busca a todo custo a existência de alguma entidade divina que possa o explicar o sentido da vida, e o segundo não acredita em nada além do vazio, como bem explicita em varias cenas. Ainda existe a visão de que a peste seja um castigo de Deus, na qual a Igreja tem um papel importante; seja no fato de incitar a população a culpar uma mocinha (a maldade está nos olhos de quem vê?), que possivelmente tenha tido um contato com o demônio, pela peste; ou nas longas marchas, compostas por pessoas doentes e aleijadas, onde ocorre automutilação, para expiar os pecados e, talvez, buscar uma permanência nesse mundo, o perdão perante Deus. Bergman também critica, mesmo que de maneira sutil, aqueles que recorrem à fé e até mesmo passam a acreditar em Deus, diabo, céu e inferno quando sê vêem em situações que nunca estiveram antes, o já citado medo do desconhecido, mostrado em cenas que se tornam cômicas. Comicidade que não para por aí, Bergman inclui em seu filme até mesmo um mini-estudo sobre o pensamento dos homens em relação às mulheres, e mesmo, que por vezes estas adições soem um pouco deslocadas do contexto do filme, criam uma variedade ainda maior.
Finalmente, após tratar todos esses temas, Bergman nos entrega um final não menos provocador, com um tom de esperança, mas ao mesmo tempo de consolação. Se existe um fato que todos conhecemos, este é de que a morte, sem exceção, algum dia virá. Por tratar de diversos temas de uma forma tão expansiva e original, “O Sétimo Selo” é um filme que ficará pra sempre na história do cinema, merecidamente. É nessas horas, em que vemos grandes filmes, que percebemos o verdadeiro sentimento de estarmos vivos.
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