Qual é o preço da perfeição?
Um filme que te seduz para o medo, te tira da posição de espectador e te faz viver as cenas. Uma experiência sensorial profunda. Arrepiante!
Aronofsky conseguiu! Sabe-se que um filme funcionou em todos os aspectos quando de fato toca nas pessoas que o assistem, seja de maneira que a divirta, que a faça chorar, ou criando alguma identificação da história contada ou das personagens para com o público, ou seja, qualquer coisa que mexa de verdade com o público. Na verdade assistir à Cisne Negro é muito mais que apenas uma experiência sentimental ou emocional, é física. A tensão que é criada no filme transborda da tela e faz com que o envolvimento com a trama seja tanto a ponto de enganar corpo e mente, então surge uma forte ilusão de que o espectador esteja vivendo as situações apresentadas e não mais apenas assistindo-as. Constata-se isso pelo fato de que quando a bailarina Nina (Natalie Portman) sente medo o mesmo é refletido em quem assiste, e isso se repete em demais sensações, como a ansiedade, a preocupação e a dor, dentre outras.
O diretor aqui tem muito mérito em tais positividades, com uma montagem impecável e clima criado que pode até mesmo fazer o espectador duvidar do que é real e irreal na história, entretanto não podemos esquecer que Natalie Portman é fundamental para o filme se tornar tão grandioso; a opressão que sua personagem sente da mãe (Barbara Hershey) é passada aos poucos de maneira muito verdadeira e intensa. Opressão essa que é dada por um caráter não tão original como o resto do roteiro: frustrações na carreira de Erica Sayers, mãe de Nina e ex-bailarina. Felizmente, o que poderia se tornar clichê se torna crível e verdadeiro com a ótima interpretação de Barbara Hershey, que em suas cenas de ciúme e superproteção pela filha, chega a assustar.
A extrema sensualidade envolvente que o filme possui é apenas a cereja do bolo – te seduz para o medo e para a posição de vítima – empregada em parte pela mão do diretor e parte pelo elenco feminino, com destaques para Mila Kunis perfeita no papel com sua cínica e sedutora Lily, também bailarina, e é claro para Natalie Portman que interpretando a frágil Nina não é nada menos que apaixonante. Em um momento, as duas juntas, contracenando, são responsáveis por uma das cenas mais fortes e polêmicas do filme.
Apesar do lado feminino se destacar no filme, Vincent Cassel representa bem a parte masculina, e é outro inspiradíssimo em seu papel, que vive aqui Thomas Leroy, um arrogante, porém brilhante diretor artístico e idealizador responsável pela idéia de uma nova versão de “O Lago dos Cisnes”, desnuda, com abordagem profunda e real como o próprio a define. Seus pontos mais altos acontecem nos momentos onde tenta provocar um lado mais obscuro da puritana Nina, cenas essas espetaculares.
“- Sinta meu toque, responda a ele. Vamos!” | Thomas Leroy
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“- Em quatro anos, sempre que você dança, noto sua obsessão pela perfeição, mas você nunca se solta. Nunca! Tanta disciplina para quê?” | Thomas Leroy
“- Só quero ser perfeita.” | Nina
A maravilhosa trilha sonora, em seus trechos brutos e pesados contribui bastante para a carga psicológica – nos momentos de maior insegurança de Nina – que mixada ao clima tenso da trama pode sim te fazer arrepiar. Por outro lado “O Lago dos Cisnes” é uma composição que dá as cenas de dança um toque muito maior de leveza e beleza que apenas se soma a já ótima estética de tais cenas. Ponto aqui para a fotografia de Matthew Libatique, direção de arte, e para os movimentos de câmera, principalmente ao desfecho, onde acontece o belíssimo espetáculo final.
Enfim, um filme bonito em físico e na alma, mas que também sabe ser amedrontador.
Um filme que mais que assistir é importante sentir.
Um filme que choca, mas também sabe te emocionar.
Um filme que mostra o inimaginável, o lado podre da perfeição. Sim, pois no fim todo cisne branco possui interiormente um cisne negro. Uns o libertam, outros não.
“A única pessoa no seu caminho é você.
É hora de se libertar.
Solte-se!”
Thomas Leroy
http://cappuccinomagazine.blogspot.com/2011/02/analise-estreia-da-semana.html
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