Lupas (11)

Polanski é bom filmando enclausuramento social e conspirações. Na linha de Escritor Fantasma é um suspense sóbrio, elegante e uma reconstituição histórica que ganha folego por meio da comunicação escrita e diplomacia arrojada.

O caso Dreyfus não é apenas sobre injustiça. É sobre o poder das instituições na modernidade, sobre preconceito, sobre reformular o aparato jurídico em busca da verdade. Sabe-se que as narrativas podem ter diversos vieses e que, muitas vezes, a verdade é apenas questão de ponto de vista. Milimetricamente construído (ambientação soberba), o fato não comporta interpretações: não se trata de afirmar a inocência categoricamente, mas de fazer o sistema aceitar (sem ruir) a fragilidade das provas.

Versão muito boa do Caso Dreyfus, reconstitui a participação de Zola (não tão focada como no longo de 1938). Aqui os olhos estão no ambiente militar, maravilhoso, e o contraste do padrão ordenado quando o questionável surge. Técnico pra caramba, Dujardin bem como nunca esteve. Muito bom ver um filme francês com sanidade, caso raro. Polanski é diferenciado demais.

Émile Zola, consagrado escritor francês, considerado criador e representante mais expressivo da escola literária naturalista além de uma importante figura libertária da França. Foi presumivelmente assassinado por desconhecidos em 1902, quatro anos depois de ter publicado o famoso artigo J'accuse, em que acusa os responsáveis pelo processo fraudulento de que Alfred Dreyfus foi vítima.

Obra histórica que conecta ao íntimo de Polanski. Sua relação judaica, o faz espremer uma realidade injusta, cruel mas que em muitos momentos na obra passa do tom e se torna uma caracterização "malvada" dos personagens aqui. Dujardin(Picquart) está perfeito nessa busca pela verdade e ao mesmo tempo numa desconstrução de seus ideais e de uma imagem equivocada que projetava do exército. Garrel(Dreyfus) irreconhecível, ótimo mesmo com pouco tempo em cena. Obra irregular para o nível do diretor.

Polanski usa as ferramentas do cinema para esculpir outro grande longa em sua filmografia.

Ajuda a pensar em como a França "caiu" praticamente sem resposta nas mãos dos nazistas na Segunda Guerra Mundial.

A história do roteiro talvez seja uma das mais importantes biografias que mereça ser repetidamente contada, uma vez que os desdobramentos do "caso Dreyfus" (ainda continuamos com erros "em nome da razão de estado") mudaram não só a percepção da Justiça na França, como influenciaram todo o ordenamento jurídico atual relativo à ampla defesa. Polanski foi bastante meticuloso na construção da trama conspiratória, porém, acabou atropelando fatos importantes na reta final, como a acusação contra Zola.

É quase impossível não aproximar Roman Polanski, diretor de “O Oficial e o Espião”, do capitão Dreyfus, vítima de um ignóbil erro judiciário. Não seria uma forma nem tão sutil assim de dizer ao mundo que ele é tão inocente quanto Dreyfus e igualmente massacrado por uma mídia que busca produzir culpados a qualquer custo? Pode ser que essa tenha até sido a motivação do projeto. Se foi assim, porém, Polanski mostrou-se hábil para escapar da armadilha.

Optando por um cinema à moda clássica, Polanski exibe um manifesto a favor de justiça e à luta pela verdade que muitos preferem deixar encoberta. Tanto Dujardin quanto Garrel (pouco presente em cena) mergulham em seus personagens e entregam atuações enérgicas aliadas a uma bela reconstituição de época.

Roman Polanski em sua melhor forma. Filme que nos faz refletir sobre muitas questões contemporâneas - em especial sobre como as estruturas de poder fazem de TUDO para se manterem, eliminando qualquer um que se faça desnecessário.