Na posição contrária dos atuais (de 1999 para cá, mais ou menos nessa ordem) filmes de horror, ou como se chamam, as famosas sagas de terror que predominaram a imaginação dos filmes no cinema lá nos Estados Unidos, e também no mundo, principalmente nas décadas de 1980 e 1990; este novo Halloween exclui não só alguns filmes de continuidade da saga, ele faz mais que isso, e acaba definitivamente excluindo o que “há de podre” depois do clássico filmado em fins da década de 1970.
Quero dizer com isso o que todo mundo já sabe que acontece, principalmente na continuação ou no remake de sagas de terror pós-1999: personagens estapafúrdios, cenários escuros, fotografia sequer é trabalhada, tanto faz o jogo de continuidade e a predominância não pelos sustos, mas pelos cofres cheios – o que não acaba por ocorrer, já que o público mostrava um certo cansaço depois de exaustivos sexta-feiras 13 e horas do pesadelo. Embora este segundo conseguisse manter um pouco mais a sua originalidade com o avanço da saga.
Mas o que o Halloween de 2018 traz de novidade? A questão é que parece mais um Silêncio dos Inocentes (The Silent of the Lambs, 1991) do que um Alien vs. Predador 2 (2007), ou seja, tenta manter um mínimo de trabalho e coerência estética, desenvolvimentista e por aí vai. Mas calma leitor, não estou comparando o clássico intocável do terror com um simples filme da “saga” do psicótico e amendrontador Michael Myers. Mas houve essa tendência aqui, e isso é louvável e pode trazer bons frutos para os fãs do gênero de estilo fílmico.
Volta o terror sutil com toda a sua força, dando preferência ao inesperado, ao inusitado e como jus ao nome: ao horror de fato. Sem cenas computadorizadas que fazem mortes violentas, que precisam dar medo, parecer um jogo bem elaborado de videogame. Como não comparar a cena de perseguição com a de Silêncio dos Inocentes? O que dizer da cena em que Laurie Strode (Jamie Lee Curts) some após cair de uma janela para a grama, como Michael sumira, no original de 1978? Ainda mais pé no chão, como a película vem sendo abraçada pelas críticas mais positivas, é o questionamento inicial de se de fato, um assassino de 5 pessoas em uma noite de Halloween seria algo tão apavorante assim nos dias de hoje (onde a violência, tanto nos Estados Unidos quanto em qualquer outro lugar, mesmo no Brasil) chegou a níveis alarmantes.
A resposta vem em Laurie Strode, em uma experiente Jamie Lee Curts, traumatizada até o osso, transpirando aquela noite há 40 anos atrás, sendo puramente cicatrizes. Laurie Strode também representa uma vítima perante a sociedade contemporânea, onde logo depois dos acontecimentos, suas conexões com o fato ou o seu trauma não são respeitados, logo sendo afastada da sociedade que produz figuras como Myers. Isso ocorre fatualmente, e não seria diferente com uma vítima de estupro ou por aí vai.
O Halloween de 2018 é tudo isso: sobre traumas, sobre cicatrizes, um filme de terror que tenta ser bastante pé no chão e consegue. Mas é ainda mais além, sendo desde o início, ao apresentar a casa armada até os dentes de Laurie, um jogo de gato e rato, caçador e presa; sem sabermos definitivamente quem é a caça e quem é a presa. Tudo aquilo que foi feito em Halloween 2 (2009) de Rob Zombie, uma verdadeira palhaçada, muito inferior, creio, a qualquer coisa que tenha sido feita com o nome de Michael Myers e Laurie Strode, e sendo significativo para o exemplo que trago de atuais filmes de terror, escuros, sem continuidade e ocos.
O diretor, da qual desconhecia anteriormente, David Gordon Green, passa uma sensação de filme grande: os planos-sequências que seguem Michael, que creio não aparecer desde os primeiros de Carpenter na série, parecem residir mais em um filme que busca uma estatueta no Oscar do que uma saga de terror. Só que não nos foi entregado um simples filme de gênero, muitas vezes eu até esquecia que se tratava de uma figura como Jason ou Freddy Krueger, e isso é bom; é bom que o cinema, de qualquer estilo, busque novas tendências, formas e análises. Por isso o Halloween de 2018, desde os letreiros iniciais com aquela abóbora crescendo na tela, é revigorante. E ser revigorante em um nome tão batido, é bastante louvável, mostrando que outros filmes podem seguir o seu exemplo.
Tão nostálgico, que até Nick Castle, que interpretou Myers no original de 1978, interpreta o psicopata novamente. Assim, crianças ou adolescentes, até mesmo adultos que não conhecem o original, podem ver no cinema e em casa este bom filme sem nada deixar a desejar por não ter assistido os anteriores, criando quem sabe, uma nova onda de admiradores de Halloween. Talvez diferente de quem vá ao cinema e assista A Hora do Pesadelo (A Nightmare on Elm Street, 2010) ou Friday the 13th (2009) e ficar mais desempolgado do que empolgado.
O emponderamento das três irmãs também fica evidente, e a cena final do filme lembra bastante a capa de Três Mulheres (3 Women,1977) de Robert Altman, juntando a superação, através da luta, de um fantasma que persiste ao passado e ao presente. O Bicho Papão, o mal puro como dizia o Doutor Loomis no original, provoca nessas três mulheres uma final iniciação que um elo novo é construído, contra o medo que a figura de Myers representa.
Ignorar todas as sequências posteriores é deveras interessante, criando uma ligação ainda maior com o, digamos assim, revolucionário filme original. E como a continuação de Carpenter, feita alguns anos depois, mas como se fosse na continuação da noite de terror, os produtores e o diretor do novo Halloween que aqui comento, já pensam em uma continuação, na minha opinião deveras bem vinda. E também fico feliz que esperaram a recepção de 2018 para dar continuidade ao filme, mostrando mais uma vez que há projeto e intenção de fazer bom cinema, e não de vender um enlatado por alguns dólares.
A continuidade do trabalho de Dead Cundey, diretor de fotografia dos dois primeiros Halloween's, também foi mantida e como um todo, desenvolvida. Não só nos planos-sequências, mas nas filmagens subjetivas, onde o suspense não é entregue de forma barata, mesmo que saibamos de onde o "vilão" irá aparecer. Michael Simmonds constrói uma estrutura cênica com tudo o que havia de bom no original, somando ao cinema mais contemporâneo, como por exemplo a utilização de fundos escuros com a nova tecnologia em HD ou o Bullet time dos olhares entre irmãos. O clima de Halloween também fica bem complexo com a continuidade de luz e sombra, luz e sombra no avanço dos cenários.
Apesar dos excessos e problemas, pouquíssimos destes vindo de tentativas de lugares-comuns e mais da coragem de fazer ago diferente, se pensarmos em um próximo trabalho, que este venha ainda mais evoluído, e sem medo de inovar em um terreno quase religioso para alguns fãs.
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