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Críticas

Tempos de Paz

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O cinema nacional vem ganhando novos ingredientes a cada ano. Um novo ator promissor aqui, uma obra inteligente acolá... tudo isso em meio às baboseiras de sempre, como "Se Eu Fosse Você", por exemplo. Citei a comédia estrelada por Tony Ramos por dois motivos: primeiro porque o filme que irei resenhar também conta com o ilustre ator no elenco, e segundo porque o diretor das duas obras é o mesmo: Daniel Filho. Falando nisso, andei lendo algumas críticas positivas sobre o novo longa internet afora, mas, como só acredito vendo, precisei ir ao cinema para checar o trabalho do cineasta. Hei de confessar que me surpreendi um bocado. Pois é, caros leitores; "Tempos de Paz", que passa bem longe de ser uma obra-prima (vale dizer), também é facilmente o melhor trabalho na cinebiografia de Daniel Filho.

O longa é inspirado na obra teatral "Novas Diretrizes em Tempos de Paz", de Bosco Brasil. À grosso modo, a história se passa no final da Segunda Guerra Mundial, quando imigrantes europeus iniciaram um processo migratório para outros países. No Brasil, o governo Getúlio Vargas impunha barreiras contra a possível vinda de adeptos do nazi-fascismo para cá. É nesse contexto que há o embate entre Clausewitz (Dan Stulbach) e Segismundo (Tony Ramos). O primeiro tenta entrar no país alegando ser agricultor, enquanto o segundo tem que interrogá-lo para identificar possíveis tendências nazistas. Nos palcos, a dupla principal era a mesma, o que explica a química entre as personagens. Além disso, a parceria ajudou na hora de transpôr a linguagem teatral para a cinematográfica. Isso, aliás, o diretor faz com bastante competência, sempre auxiliado por uma trilha sonora honesta, simples e eficiente.

Um dos pontos chave da trama é o roteiro. Posso afirmar que ele é bom e ruim ao mesmo tempo. Bom porque deixa poucos furos. A história, que é pouco extensa por si só, podemos dizer que é bem contada e vai ganhando alguns contornos bem vagarosamente - o que é interessante. Por outro lado, a subtrama que envolve o médico em busca do seu 'carrasco' é falha e muito pouco aprofundada. Daniel Filho (que por sinal interpreta o médico) poderia ter construído melhor essa parte, pois para o espectador ela fica como uma mera paisagem, apenas para agregar alguma coisa extra à história.

Tais erros, no entanto, ficam bem pequenos se comparado ao desempenho pungente dos atores. Falo aqui especialmente de Dan Stulbach - para mim uma das melhores figuras da dramaturgia nacional. Sou fan confesso de seu trabalho, desde os tempos das raquetadas na bela Helena Ranaldi (acho que todos lembram dessa, certo?). Na pele de Clausewitz, Stulbach é um show em cena. Sabe utilizar a linguagem teatral e adaptá-la de maneira magnífica. Seu personagem, destacado pelo sotaque inconfundível, é inocente e carismático, daqueles que vivenciou horrores de uma guerra sem perder a alegria e os encantos da vida. Tony Ramos, por sua vez, também agrega bons elementos ao impiedoso Segismundo - aquele que sempre seguiu ordens de seu padrinho. Seu grande erro, ou talvez falha mesmo, é ser parecido com todos os outros personagens de sua carreira. Sempre os mesmos trejeitos, sempre as mesmas caras e bocas... ver Tony Ramos em cena passa algo como: "eu já vi isso antes em algum lugar". Acho ele ótimo ator, mas com pouca capacidade de 'metamorfose', podemos assim dizer.

"Tempos de Paz" é um filme recomendável, embora seja teatral por natureza. Transformar uma obra dessas em cinema faz com que ela perca muitos elementos exclusivos do teatro. Ainda assim, Daniel Filho consegue adaptá-la de uma maneira competente, sendo muito fiel ao texto original e sem inventar modismos desnecessários. Por fim, posso dizer que a trama vale mesmo pelo embate entre dois ótimos atores com seus personagens muito bem aprofundados e conflituosos. Para os cri-críticos, algumas falhas técnicas saltam aos olhos (a maioria delas, na verdade). Reparem nos efeitos especiais... de péssima qualidade! Mas isso já é outra história...

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Críticas

Pássaros, Os

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"Os Pássaros" é daqueles filmes difíceis de resenhar, de conteúdo complexo, diferente, que aborda temas pouco comuns – especialmente para o universo hitchcockiano. Acostumado a romances, suspenses policiais e derivados, Alfred Hitchcock traz a tona nesse trabalho algo completamente novo em sua carreira: o sobrenatural. Pois é! Muito mais do que um exercício de suspense, o clássico de 1963 nos instiga a refletir sobre algo que nunca vivenciamos, sobre o que temos medo e aquilo que jamais desejaríamos enfrentar: coisas do outro mundo. Além de tudo, o cineasta mostrou para o mundo toda a sua criatividade ao brincar com um assunto tabu para as pessoas (assunto esse que gera polêmica até hoje). De quebra, Hitchcock ainda mostrou sua enorme capacidade ao brindar o público com mais um bom trabalho, apenas três anos após "Psicose" - uma de suas obras-primas.

Talvez a primeira impressão que o longa passe após seu término é: “ué, mas acaba assim mesmo?”. Sim, "Os Pássaros" acaba de uma maneira estranha, podemos assim dizer, pois o diretor constrói todo um clima de suspense para no final deixar a maioria das coisas por resolver. Para quem gosta de filmes inseridos naquela fórmula básica do começo, meio e fim, é bem provável que esse trabalho de Hitchcock seja decepcionante. Quase caí nessa, confesso, mas depois de pensar um pouco e contextualizar com a época, concluí que o cineasta executou uma grande obra, repleta de pequenos detalhes, bem filmada e assustadora.

Sim, assustadora! Embora muito dos efeitos soem como mera tosqueira (hoje em dia nem assustam mais), é bom lembrar que na época aquilo foi revolucionário, pois Hitchcock sempre esteve muito à frente de seu tempo. Ainda assim, mesmo parecendo infantil e por vezes até risível (nos dias de hoje, volto a ressaltar), o diretor consegue montar um clima dos mais intrigantes, pouco visto antes na história do cinema. O ar sombrio, aliás, ganha contornos mais tenebrosos com a ajuda da ‘trilha sonora’. Entre aspas porque simplesmente há ausência de qualquer tipo de trilha. O diretor, junto com Bernard Herrmann – seu consultor e compositor -, optou por trabalhar a trama sem músicas. Isso já fica bem claro logo no início, quando aparecem os créditos sem nenhum tipo de som além do ruído de pássaros. O filme todo é assim, repleto de ruídos de todos os tipos, o que torna o suspense ainda mais macabro e curioso.

O desempenho do elenco contribui com o ar intrigante e sobrenatural - desde os protagonistas aos personagens menos importantes. Vale ressaltar que, como de costume, Alfred Hitchcock aparece em uma das cenas. É logo nos primeiros minutos, quando ele é mostrado saindo da loja de pássaros com alguns cachorros. Mas como o assunto aqui é outro, alguns atores merecem suas ressalvas. A bela Tippi Hedren está muito bem na pele de Melanie Daniels; algumas cenas suas, como a da cabine telefônica, por exemplo, passam um sentimento claustrofóbico impressionante. Aqui, ela está muito bem auxiliada pela maquiagem, que consegue reproduzir seus ferimentos com uma realidade admirável para aquela época. Acima de Tippi, quem merece todo o destaque é Jessica Tandy. Como Lydia Brenner, Jessica nos entrega uma personagem sinistra, enigmática e indecifrável. Suas atitudes têm pouca justificativa; é uma pessoa confusa, diabólica… sobrenatural, talvez? Para completar o trio, Rod Taylor também merece elogios: na primeira metade como o bonitão convencido e na segunda como o mocinho da história.

O fato é que com "Os Pássaros", Alfred Hitchcock se mostra capaz de obter destaque em diversas vertentes do suspense. Dessa vez sem roubos, sem assassinatos, sem vertigem, sem planos mirabolantes, sem nada comum em seu cinema. Talvez isso justifique o sucesso que a obra conseguiu ao longo das décadas, já que além de agregar elementos novos ao mundo hitchcockiano, temos ainda o ótimo trabalho de sempre, como personagens muito bem construídos, um suspense pra lá de amarrado e técnicas de filmagem impressionantes (é perceptível algumas cenas filmadas sem um único corte). Uma obra-prima das mais competentes que o cinema já viu, merecedora de muitos e muitos elogios.

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Lutador, O

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A melhor frase que pode definir essa obra de Darren Aronofsky seria: Um filme de grandes atuações! Nesse aspecto, "O Lutador" quase se equipara à filmes como "Quem tem medo de Virgínia Woolf", "Uma Rua Chamada Pecado", "Gata em teto de Zinco Quente" e o mais recente, "Dúvida". Todas essas películas tem em comum a maneira de como conseguem, acima de tudo, conquistar o espectador pelas atuações brilhantes. O filme em questão não possui um roteiro tão original quanto os filmes citados acima, mas ele é triufante ao convencer quem o assiste de que o mais importa é como os atores conduzem essa história, e essa condunção é espetacular!

Randy "Carneiro" Robinson (Mickey Rourke) fez muito sucesso nos anos 80 como um lutador de luta-livre, mas por causa de sua vida sem limites, vinte anos se passam e nós é mostrado o preço pago por Randy por essa vida 'porra-louca': agora ele vive num trailer, luta apenas nos finais-de-semana em pequenos clubes e trabalha num supermercado para complementar sua renda.

Apesar do filme ser divinamente dominado por três atores, é Mickey Rourke que chega ao sublime. Sua vida pessoal se parece com a de Randy, como o lutador, Rourke também teve uma carreira que prometia levá-lo ao patamar das maiores estrelas, entrentanto o ator acabou sendo deixado de escanteio (também por causa de uma vida sem limites) e passou a estrelar, a partir da década de 90, apenas filmes B.

Muitos acham que Rourke só foi elogiado pela sua atuação porque a vida do lutador no filme se confude com a sua própria, afinal ele também tinha se dedicado ao boxe. Mas não é nada disso, sua perfomance é tão brilhante que é impossível pensar que tudo não passou de "um ator derrotado interpretando sua própria vida". Rourke apenas fez as escolhas erradas e com isso acabou por criar nos grandes produtores e diretores uma negligência em relação a ele, passando a impressão de apenas mais um que teve uma carreira passageira, e essa situação, é claro, acontece com vários artistas talentosos.

Analisando o filme pelo filme (que é a melhor maneira de se analisar qualquer forma de arte), temos um ator que nos mostra a verdadeira arte de atuar. Rourke faz de Randy um homem apaixonado pela única coisa que sabe fazer, apesar dos seus dias de glória já terem ido embora há muito tempo. A película é basicamente sobre como uma pessoa pode (ou não) se ajustar na sociedade depois de ter vivenciado uma vida de sucesso. Randy ainda é respeitado nos clubes onde luta e uma vez ou outra é reconhecido na rua, mas isso não basta, o que ele ama é estar rodeado pela sua 'família' (os espectadores das lutas, como ele mesmo diz), entretanto essa família apenas pode ser encontrada em um número bastante reduzido aos finais-de-semana.

Mas a película não gira apenas em torno dele, Marisa Tomei (outra atriz pouco aproveitada) também dá um show ao dar vida a Cassidy, uma stripper que é amiga e affair de Randy, apesar do corpo esbelto, ela já é considerada por muitos 'velha' para os padrões dos clubes de strip-tease, mas ainda assim Cassidy tenta seguir sua vida dançando, apesar de saber que os seus dias de 'glória' já acabaram. Ou seja, temos aqui duas pessoas tentando de alguma maneira continuar simplesmente a serem o que são, tentando fazer com que o tempo não tirem deles seus únicos talentos.

Devido ao rumo que sua vida tomou, Randy possui outro grande problema, que é o de tentar reconquistar a sua filha, ao contrário de Cassidy que apesar de tudo possui seu filho ao seu lado, o lutador procura sua filha (Evan Rachel Wood) com a esperança de uma reconciliação, mas apesar de saber o que precisa para poder conquistá-la, ele falha, e numa comovente cena entre os dois, Randy fala humildemente que sabe que errou, e sabe que continua a errar, ele apenas não consegue deixar de ser o que é, uma sinceridade comovente.

E não podemos esquecer de falar um pouco de Wood, com certeza ela é uma atriz com uma brilhante carreira pela frente, ela mostrou uma ótima perfomance em 'Dúvida' e agora nesse filme ela reforça seu talento, mesmo aparecendo pouco.

Diferente das técnicas mais sofisticadas usadas em "Réquiem para um Sonho" e "Pi", Aronofsk dirige a obra de uma forma quase documental, com a câmera na mão sempre mostrando as costas de Randy, como se ele sempre estivesse pronto a entrar num ringue. A cena que mostra seu primeiro dia como balconista é comovente ao mostrar as costas do lutador e os gritos dos espectadores, nessa cena temos a certeza que o lugar de Randy não é ali, só existe um lugar apropriado para ele, o ringue. As cenas de lutas, apesar de serem de certa forma coreografadas, são magníficas, Rourke consegue passar com tanta verdade a paixão de Randy pela luta-livre, que em nenhum momento sentimos nojo ou asco do esporte praticado (e olha que eu detesto lutas).

Por fim, não se deixe enganar pensando que a obra é apenas mais uma sobre 'luta de boxe', um derivado de Rocky ou Menina de Ouro, ele é muito mais que isso, é uma obra pura e simplesmente sobre um ser humano, que como um verdadeiro exemplar dessa espécie, fez escolhas erradas, se é que pode ser chamado de 'errado' alguém que não consegue deixar de ser o que é.

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Rosa Púrpura do Cairo, A

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Um filme realmente estranho, mas no melhor sentido que possa se atribuir à essa palavra. Ao mesmo tempo que é de uma poesia e beleza indescritíveis, tem um peso em alguns momentos insuportáveis. O filme é pessimista, uma grande alegoria à sujeira humana por meio de um conto de fadas.

Aqui, o mestre Allen nos transporta à vida de Cecília (Mia Farrow), uma moça simples, com um péssimo emprego, um marido que a maltrata e a explora, vivendo às suas custas. Além disso, o filme se passa em plena Grande Depressão pós-crise de 29, o que torna toda a situação ainda mais angustiante, haja visto que o clima de pessimismo imperava na vida de todos, e não só de Cecília. E, para completar, ela também perde o emprego (é, realmente, nada tem dado muito certo). Entretanto, ela ainda mantinha sua única diversão: ir todas as noites ao cinema assistir ao mesmo filme, "A Rosa Púrpura do Cairo", estrelado por Gil Sheperd (Jeff Daniels), que vive Tom Baxter, o protagonista que é a perfeita representação do homem dos seus sonhos.

Então, num belo dia após várias visitas ao cinema, Baxter, encantado pelos olhos de Cecilia, resolve (para espanto de todos) sair da tela do cinema e fugir com sua nova amada para viver o que há de melhor no mundo real.

É, isso mesmo, você não leu errado. Durante uma das exibições do filme, Baxter simplesmente pára e resolve sair da tela do cinema para o mundo real. À partir daí, a lógica “foge” do roteiro como Baxter do filme.

À partir daí, há um certo alívio cômico (que faz-se presente por todo o longa, mesmo nos momentos mais tensos). Damos bastante risada com os inconvenientes da 'fuga' de Baxter, como o resto do elenco do filme desesperado sem poder dar continuidade ao roteiro, os demais “Baxter's” querendo sair das telas em salas de exibição pelo resto do país, entre outras coisas totalmente surreais. Porém, o foco permanece sempre no casal e nas descobertas de Baxter sobre o nosso mundo.

Tudo isto, na verdade, acaba sendo uma grande alegoria para nossa visão e conceitos de um “ideal” de mundo, de vida, sempre envolto pelos paradoxos e contrastes dessa idealização.

A fuga de um personagem fictício para o mundo real, este achando que 'aqui' é onde se encontra a felicidade, onde tudo é belo e maravilhoso. E sendo guiado justamente por alguém que queria estar 'do outro lado', longe dessa realidade pesada, crua.

Então, com a chegada de quando Gil Sheperd, interpretando o ator que vive Baxter nas telas (Jeff Daniels em dois papéis), que a “mensagem” do filme começa a ganhar forma.

Cada uma dessas vertentes de ideais é representada por um dos personagens centrais da trama. Baxter é um verdadeiro personagem da fase clássica do cinema, completamente estereotipado - o Daniels demonstra tal personagem com uma atuação bastante “canastra”, inclusive, bem enfática ao arqueótipo do “galã” - e carregado de valores “belos” (não seria incoerente citar que ele poderia ter saído de um filme do Capra, inclusive). A ele, ficou o cargo de representar os idealistas, pessoas carregadas de conceitos de valores inatingíveis, sempre otimistas. Já Sheperd (assim como Cecília) representa o mundo real, mostrando-se tanto mais frio, racional, quanto “sacana” em dados momentos (até seu porte, trejeitos e modo de vestir são diferentes, mais imponentes).

Baxter é o que há de mais encantador no filme. Na cena do restaurante, por exemplo, ele tenta pagar um jantar caríssimo para Cecília com dinheiro falso. Quando vê que não consegue, que seu ‘dinheiro cenográfico’ só vale em cena, ele simplesmente se levanta e fogem. Em tese, ele deveria ficar ciente disso, mas novamente, algumas cenas após, lá está ele dando o mesmo dinheiro a um mendigo, e com pleno olhar de satisfação por estar ajudando a um necessitado, como se não lembrasse que aquele dinheiro de nada adiantaria. E é essa persistência dele em querer manter-se 'puro' (mesmo que sem saber disso) que vai contrastar tanto com Sheperd.

Os diálogos entre ele (Sheperd) e Cecília revelam que ele nada mais é que uma pessoa normal, um ator com certas ambições profissionais, que tem medo e receios, que conhece a vida e sabe o quão as coisas podem ser difíceis de verdade, ou seja, o total oposto de seu personagem.

E isso, de certo modo, encanta Cecília. Ele não tem a magia do outro, mas era alguém real, que parecia com ela. Daí fica a dúvida. Porém, ela não tem muito tempo para pensar nisso. Há o reencontro com Baxter e, num dos momentos mais mágicos e belos do filme, ele a leva para dentro do filme, onde a presenteia com vestidos caríssimos, levando-a para jantar em um restaurante finíssimo, cercada de grandes celebridades, todos ricos e pomposos. Pela primeira vez na vida, Cecília teve uma experiência digna de seus maiores ídolos do cinema.

Todavia, essa noite de encanto era apenas o prólogo ao momento mais difícil de sua vida. À volta, Cecilia se encontra frente à uma escolha entre seus dois novos amores, entre a mágica e fantasia com os quais tanto sonhara e a segurança de uma realidade difícil, mas ainda assim real. A escolha seria fácil, em tese, afinal qual de nós pensaria duas vezes antes de cair de cabeça num mundo perfeito onde tudo é puro glamour? Mas ali estavam os pequenos detalhes entre os dois que aos poucos nos foram jogados na trama.

Na luta com Monk (Dany Aiello), marido de Cecilia, Tom não se machucou, pois por ser fictício, ele não sangrava, sentia dor (ele sequer "despenteava"). Ele era virgem, nunca havia "feito amor", pois nesses momentos, "a tela escurecia e a cena cortava", o fade os consumia. Ele era impossibilitado de sentir qualquer prazer além dos que estavam no roteiro. Eram limitações com as quais Cecilia haveria de lidar. Do outro lado, Sheperd, como dito antes, real, e por isso tão capaz quanto.

Cecilia pensa e escolhe ir com 'o real' e, numa das cenas mais tocantes e “pesadas” do filme (e que sempre me leva às lágrimas), ela profere a fala que resume o que Woody Allen quis dizer aqui:

"- No seu mundo as coisas sempre acabam bem. Sou uma pessoa de verdade.. Não importa o quanto eu me sinta tentada, devo escolher o mundo real.”

A sua vida difícil num mundo imerso em dor e pessimismo (vide o contexto da época onde a trama se desenvolve) a havia ensinado que não tinha como melhorar. Ela se sentia condicionada àquele sofrimento e duvidava de tudo que não fosse a dor. A esperança era duvidosa.

Tom volta ao seu 'mundo' e Cecilia se prepara para fugir com Sheperd para Hollywood, onde poderia ter o melhor de dois mundos, da fantasia do cinema e da segurança da realidade.

Aqui, a crueldade desse “conto de fadas” se manifesta em seu ponto máximo: Sheperd não está esperando por ela. Após terminada sua missão de fazer com que seu personagem retornasse ao filme, partiu no primeiro avião de volta ao 'seu mundo'. Cecilia abandonara sua casa em busca de um novo romance que não a esperou. Sem o marido (que mesmo um traste, ainda era o dono da casa - e, após tantas humilhações, não a queria mais por lá), estava sozinha e completamente perdida. A única coisa que lhe restava era dinheiro suficiente para uma última entrada no cinema.

O filme não era o mesmo, um novo havia substituído o 'problemático', dessa vez um musical com Fred Astaire. Cecilia senta e começa a olhar pasma para o casal de protagonistas dançando. À medida que a cena se desenrola, vemos Sheperd no avião, com um olhar perdido e uma expressão de tristeza. O foco volta ao olhar admirado de Cecilia e os créditos sobem.

Realmente, é um final carregado de pessimismo e que soaria um tanto quanto incoerente perante a mágica e beleza de toda a história. Mas não seria esse o castigo de Cecilia por não se arriscar? Somos levados a crer que, por mais que busquemos um refúgio em uma fantasia, sempre estamos presos à essa realidade assombrosa. Devemos buscar um equilíbrio que Cecilia não tinha. As sucessivas idas ao cinema para ver o mesmo filme demostravam seu desespero em se agarrar a alguma coisa boa, pois esta sabia que ao término da exibição, ela voltaria a ser uma fraca submissa e que, justamente por isso, havia perdido a grande oportunidade de sua vida.

Tudo bem, o mundo pode parecer terrível (e às vezes eu concordo que pareça - e seja), mas será que isso não é culpa nossa? Temos, sim, todo o direito de sonhar, assim como Cecilia sonhou. Contudo, entre tantos “direitos”, devemos levar mesmo até os extremos o de sermos covardes como ela foi? Ou será que aquela covardia é algo ao qual estamos condicionados, algo do qual não se pode fugir e que nem deve ser chamado de covardia propriamente dita, apenas uma reação natural ao nosso mundo?

Isso (e me perdoem a expressão clichê que virá a seguir) é algo que somente cada um de nós pode dizer, afinal temos essa liberdade. O próprio Allen deixou isso claro, fez esse 'balanço' no roteiro, equilibrando a fala citada há pouco, extremamente pessimista, com um desfecho belíssimo e com um toque de esperança (e que também sempre me leva às lágrimas à cada vez que revejo - e há vezes que coloco o DVD somente para ver esse trechinho):

"-Adorei cada minuto ao seu lado e nunca vou esquecer daquela noite que passamos juntos na cidade.

- Adeus!"

Num lance de gênio, Allen deixa em nossas mãos definir qual a escolha de seus personagens. Ou alguém pode dizer com certeza se a expressão de tristeza no olhar de Sheperd no avião era de dor por ter perdido um grande amor que acabara de surgir ou por simples remorso por ter usado da pureza de Cecilia? E o olhar admirado dela nos momentos finais, assistindo ao filme do Astaire, seria uma expressão de tristeza, de desgosto pela oportunidade perdida ou mais um encantamento, uma outra fuga que ali surgira com o novo 'astro' em cartaz?

A única certeza que fica é a de que os sonhos por si só não se sustentam, esta passada pelo destino de Baxter (personagem que representa o idealismo e a pureza cega e inocente dos sonhadores), em outra cena sublime: abandonado por sua amada, volta ao filme, o restante do elenco finalmente pode ir à “festa no Copacabana” e ele, sozinho, suspira e, de cabeça baixa, sai de cena (e mais uma vez me pego chorando).

De resto, se Cecília e Sheperd foram felizes em suas escolhas, assim como o equilíbrio entre nossos sonhos e nossas possibilidades, cabe a nós decidir.

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G.I. Joe - A Origem de Cobra

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Fui até o Aurélio procurar uma palavra que definisse o que eu senti ao sair da sala de cinema depois de assistir 'G.I. Joe - A Origem de Cobra'. Não encontrei, porque mas acho que ninguém, nunca, em algum momento se sentiu assim em todo o mundo, motivo pelo qual eu acredito que esta palvra ainda nem exista.

O filme começou e aquilo na tela do cinema estava tão desastroso que me motivou até a sacar uma folha de papel e um lápis da minha mochila e começar a tomar nota da sucessão de calamidades que eu enxergava. Em 30 minutos de anotações dei-me por satisfeito, porque, além disso, tudo o que passava na tela eram repetições de todos as calamidades que eu já havia anotado. Antes, quero deixar claro que não brinquei com os bonecos de 'Comandos em Ação' quando pequeno, tampouco sei de sua história. Tudo que escrevo abaixo é fruto do que vi na tela do cinema. Vamos ao que anotei:

1º Gente, o que é aquela cena inicial de batalha? Os tiros vindo da nave a menos de 20 metros de distância e a pessoa-alvo ainda tinha tempo de gritar: "Oh, my God!! Bomb! Bomb!" antes de ser atingido. Como assim? Dá tempo?

2º Tirando o Dennis Quaid, que interpreta um papel vergonhoso, quem naquele filme atuou de maneira competente? Eu digo: ninguém!

3º A cena em que o avião entra naquele 'quartel general' sob uma duna no deserto foi de chorar: capricho nenhum com os efeitos visuais e isso ocorre durante todo o filme. Todos os efeitos são um verdadeiro lixo cinematográfico para os padrões atuais! Algumas cenas chegam a ser bizarras por lembrarem filmes de ficção-científica da década de 70. Pasmo, em determinado momento cheguei a pensar que pudesse ser uma nova onda retrô de efeitos visuais.

A cena em que a Torre Eifel despenca realmente impressiona quando vista no trailer, aí na sua casa. Mas na tela grande ficam claros os descuidos com os efeitos visuais.

FATO 1: Qualquer game pra PlayStation1 deixa os efeitos visuais deste filme no chinelo.

4º 95% do filme é composto por cenas de ação com efeitos visuais RIDÍCULOS, como já disse. Os outros 5% são uma tentativa parva de: desenvolver os personagens; explicar o motivo das cenas de ação; desenvolver algum diálogo, por mais torpe que seja, entre os personagens e fazer aquelas piadinhas 'carne de vaca'.

Um exemplo desastroso da tentativa de desenvolver um personagem é quando os nijas 'branco' e 'preto' se encontram para lutar um contra o outro. Num flash (que se você piscar perde), o diretor tentou mostrar que os dois personagens se conheçiam desde a infância, como que para dar um peso maior àquela batalha. Num segundo Flash Back, a história de ambos retorna na tentativa de mostrar o porquê do ódio que existe entre os dois. Tudo absolutamente dispensável pela maneira torpe como foi tratado.

5º Não entendi o papel daquela sequência inicial na França, em 1920, em que o dito cujo é condenado a usar uma máscara de ferro quente. O filme não se dá ao trabalho de explicar isso, o que poderia ser interessante, para perder tempo com bizarrices. Parece que todos aqueles minutos foram apresentados para retornar num único diálogo ao final do filme que tenta passar a mensagem "Nunca venda armas para os dois lados". Hein? Em caso contrário foi tudo pra encher linguiça mesmo.

6º Dei graças a Deus quando aquele ninja branco matou o general intepretado por Denis Quaid, porque o personagem dele é tão grotesco que chegava a incomodar. Mas quase morri de desgosto quando ele retornou, ao melhor estilo 'Fênix vem das cinzas', quase no final do filme. O roteiro nem se dá ao trabalho de explicar como ele conseguiu se recuperar, talvez por pensar que ninguém notaria isso. Aff!

8º Este descaso com o desenvolvimento dos personagens afeta o filme em outros inúmeros pontos. Por exemplo, se com o assovio de Zartan, personagem de Arnold Volsloo, nas cenas finais você não entender que ele usurpou o, mais do que nunca, britânico presidente dos EUA. Meu querido, culpe o roteiro porque isto não é problema seu. Você não possui nenhum tipo de deficiência congnitiva.

FATO 2: O filme não se dá nem ao trabalho de enfatizar este que seria seu grande trunfo, assim, muitas pessoas acabam não compreendo o pouco de enredo que existe naquilo. Resultado: um vácuo do tamanho do Faustão.

7º Piadas que não conseguem mover um músculo da sua face rumo ao riso e cenas clichê completam.

No mais, o filme é uma mistura de falta de criatividade, decadência de Hollywood, desleixo e pouco caso com o espectador. O que eu chamaria de Poliesculhanbose Múltipla, isto é, o produto final é uma somatória de todos os erros que ocorreram durante seu desenvolvimento.

DICA: Se você é uma pessoa de bem não perca seu tempo nem seu dinheiro indo assitir a um filme desses. Eu sei que no momento não existem muitas opções em cartaz, mas olhe lá, tem 'Cocoricó - As aventuras na cidade' que promete ser muito melhor do que qualquer 'G.I. Joe - A Origem de Cobra'.

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Espiã, A

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Fazendo a conta para dados recentes, a partir de "A Lista de Schindler" diversos filmes com a temática Segunda Guerra Mundial/Nazismo foram jogados no mercado. Alguns de ótima qualidade, outros nem tanto. O assunto sofre de tal desgaste que recentemente o cineasta Bryan Singer também resolveu fazer seu longa ambientado na época, só que com um porém: falado em ingês. Alguém deve estar se perguntando: ué, mas como um filme que fala de nazismo e é ambientado dentro dos quartéis da SS pode ser falado em inglês? Pois bem, essa dúvida ninguém sabe ao certo responder, mas é fato que o resultado até que ficou razoável.

Paul Verhoeven é holandês, experiente e com uma série de sucessos de mercado no currículo. Entre eles, o famoso "Robocop" e "Instinto Selvagem", com a sensual Sharon Stone. O cineasta, que nos últimos anos se tornou figurinha carimbada em hollywood, já dirigiu bons filmes em sua fase holandesa – um grande exemplo é o polêmico "Sem Controle". No entanto, depois de tantos anos fora do mercado europeu, poucos acreditavam que ele poderia produzir novamente um excelente filme cult. Longe de ter a capacidade de um "A Vida dos Outros", por exemplo, mas ainda assim muito bonito, bem feito e com umas sacadas bastante inteligentes (a do chocolate com a insulina, por exemplo).

O diretor volta à sua terra natal e conta a história de Rachel (Carice van Houten) , uma judia holandesa que vê sua família morrer pelos nazistas quando tentavam fugir para a Bélgica. Depois do trágico ocorrido, ela se junta à resistência holandesa contra os germânicos. O enredo ganha novos contornos quando um abastecimento de armas que chegaria para a resistência é descoberto; com isso, os membros que faziam parte do carregamento ficam sob custódia no quartel general nazista. É aí que entra a personagem de Rachel, que recebe nova identidade (Ellis de Vries) e se infiltra entre os germânicos com objetivo de seduzir o oficial maior Ludwig Müntze (Sebastian Koch).

Ao mesmo tempo em que conta uma bela história, Paul Verhoeven jamais deixa de lado sua veia hollywoodiana. O cineasta dirige suas cenas com um estilo próprio: faz um retrato de forma agitada, cheio de reviravoltas, cenas eletrizantes, fugas, tiros – tudo aquilo que as grandes massas adoram. Ainda assim, foi capaz de criar um drama competente, que se foca no sofrimento de sua personagem principal – sem nada na vida, traída, enganada… desta maneira, Verhoeven agrada a todos: aos partidários do estilo "Duro de Matar" e aos que gostam de um drama bem contado e inteligente. Além disso, faz uso da música - no melhor estilo hitchcockiano - para criar um ótimo suspense em cima do destino das personagens e dos acontecimentos subsequêntes.

Falando neles, quem rouba o longa para si é a ainda jovem holandesa Carice van Houten. A atriz tem um desempenho pungente e literalmente enche os olhos em cena. Carice aproveita a profundidade de sua personagem para executar um ótimo papel, ora transparecendo o drama de uma menina que sofre muito com a Segunda Guerra Mundial, ora sabendo usar todo o seu charme para seduzir o principal oficial nazista. A jovem ainda é bem sucedida em demonstrar seus conflitos internos, desde a perda de seus pais, até participar da resistência e se apaixonar por um inimigo.

A ausência de marketing em cima da trama fez com que ela ficasse pouco tempo em cartaz nos cinemas por aqui – uma pena. O filme se insere dentro de um gênero saturado, mas mesmo assim consegue se destacar por ter uma história muito bem contada. Talvez pudessem ter cortado um pouco do final, já que ele se estende sem muito propósito. É bem verdade que a maior parte das reviravoltas ficam para os minutos derradeiros, mas creio que elas poderiam ter sido condensadas em menos tempo. Há também alguns erros históricos por parte de Paul Verhoeven, que parece ter tomado pouco cuidado nesse quesito. Um deles, por exemplo, acontece logo após o término da guerra, quando nos é mostrado os QG’s nazistas ocupados pelos aliados – uma inverdade. Errinhos à parte, "A Espiã" é mais um belo trabalho vindo do cinema europeu. Me impressiona a regularidade vinda dos filmes de lá…

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Rede de Intrigas

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O filme favorito do famoso diretor/roteirista, Paul Thomas Anderson é tudo que podemos assistir nos filmes do mesmo. Em "Rede de Intrigas" vemos uma imagem muito distante do que imaginávamos ser a televisão, pois ele faz um retrato bem crítico resultando em uma das melhores sátiras da história do cinema.

Howard Beale(Peter Finch) é um apresentador de TV que teve seus momentos de glórias, com altos índices de audiência. Entretanto, quando ele perde sua esposa acaba perdendo audiência por isso. Quando anuncia que irá se suicidar ao vivo no programa da semana seguinte, o público fica perplexo ao saber do devido problema emocional de Beale, gerando mais audiência fazendo os responsáveis pela rede de TV se aproveitarem da situação. Beale acaba sendo o protagonista de um novo show, sendo considerado o profeta louco.

O filme pode até não ser a primeira sátira no mundo do cinema, mas acabou desencadeando outros filmes sátiras, como Assassinos Por Natureza(criticando a mídia e a violência) e Sangue Negro(criticando a igreja e a ambição). O que torna o filme tão bom é fazer uma sátira muito ácida de uma das maiores potências que caem sobre o mundo inteiro, a televisão. Criando situações que ao nosso ver são absurdas, mas que são bem possíveis no mundo televisivo. Como a dos terroristas, onde a emisora faz um acordo com eles para a criação de um documentário, uma das cenas mais controversas na minha opinião.

Os personagens estão espetaculares, cada um exercendo sua função sobre o outro. Howard Beale é apenas um "objeto" que a rede de televisão usa para levantar cada vez mais a audiência, caso o contrário ele é apenas lixo. Outro personagem interessante é Diana Christensen(Faye Dunaway) que vive sua própria vida pela TV, percebemos que em todos os seus diálogos ela cita televisão, seriados e como gerar mais audiência, até quando está com seu amante, Max Schumacher(William Holden) ela continua falando sobre a emisora. Isso que torna o mundo televisivo mais "cruel", a exploração das outras pessoas e a soberania exercida dos executivos sobre os "objetos" de uso, os empregados.

O resultado dos personagens é igual a sua caracterização, espetacular. Peter Finch e Faye Dunaway estão incríveis como os protagonistas, nos mostram uma sensação bem real de como são os funcionários da televisão. Peter Finch fazendo o homem louco, mas honesto na grande empresa. Ele é aquele que não sabe de nada do que está se passando, tudo está sendo discutido pelas suas costas, até no final trágico do filme. Faye Dunaway faz a produtora da programa de Beale, demonstrando uma grande atuação e a caracterização de um "workaholic" televisivo que faz de tudo para alcançar o objetivo mais valorizado, o Ibope.

A produção, direção e o roteiro são muito bons. A dupla Sidney Lumet e Paddy Chayefsky criam esta incrível sátira de forma dramática, perturbadora e chega até ser engraçada. Na minha opinião um dos melhores roteiros já feitos na história do cinema.

Cenas muito engraçadas e ao mesmo perturbadoras acontecem no filme. Como a de Howard gritando a frase que deixou o filme com sua marca registrada: "Eu estou furioso, e não vou mais aturar isso". Mostrando como o público são os únicos que podem deter as injustiças que acontecem neste mundo. Outra cena bastante interessante é o diálogo entre Howard e seu chefe Arthur Jensen(Ned Beatty), apresentando uma revelação muito perturbadora, falar que hoje em dia são as empresas que tem o maior poder, enquanto a democracia é algo que não tem valor e que muitos não consideram importante.

Rede de Intrigas é uma obra-prima das sátiras que deveria ter sido visto por todos, aliás nossa sociedade é uma "rede de intrigas".

Críticas

Apocalypse Now

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Aproveitando o período das férias, tirei meus dias de ócio para assistir a filmes diversos. Já gostava muito de Francis Ford Coppola, afeição motivada pela trilogia O Poderoso Chefão, especialmente as duas primeiras películas, que atingem o patamar de perfeição para mim. Nisto, busquei outro clássico do diretor: Apocalypse Now. Lançado originalmente em 1979, ganhou uma versão estendida em 2001, com 50 minutos a mais, minutos retirados na época do lançamento original devido à preocupação do diretor com o sucesso comercial do filme – a produção de Apocalypse Now foi extremamente onerosa -. Rebatizada de Apocalypse Now Redux – revisitado, em latim-, foi esta a obra que pude apreciar.

O enredo trata da busca do desertor Coronel Kurtz (Marlon Brando) pelo Capitão Willard (Martin Sheen). Supostamente o coronel teria enlouquecido e estaria no comando de um exército de fanáticos no Camboja. O início já mostra a mente perturbada do Capitão Willard, e no decorrer da narrativa a sensação crescente de loucura, caos e horror é reforçada. Aí reside o grande questionamento da obra: A loucura generalizada de uma guerra sem propósitos. O filme entremeia este questionamento com outros aspectos, como a crítica política especificamente sobre a Guerra do Vietnã, os hiperestímulos relacionados ao sexo e o imperialismo europeu na Ásia.

Nas cenas adicionadas podemos ver o destino das coelhinhas da Playboy, presas num acampamento americano sem comando, e todo o lado psicológico que esta exposição pode causar,ainda há a cena do acampamento francês no Camboja, em que toca-se a questão do imperialismo europeu e todos os ranços entre as próprias nações dominantes e mais uma vez o lado feminino, na viúva francesa solitária. Nas cenas incluídas, o debate causado pelo filme se torna mais abrangente, apesar de deixar a narrativa mais pesada e lenta.

Nas cenas originais, destaco a clássica cena do ataque de helicópteros a uma vila vietnamita ao som de Marcha das Valquírias, além da cena do trajeto de barco no rio ambientada com Satisfaction, dos Rolling Stones e o sacrifício final, em que um boi foi verdadeiramente sacrificado, em outra cena controversa de Francis Ford Coppola, que já havia exposto uma cabeça de cavalo real no primeiro Poderoso Chefão. A loucura é marcante em todo o filme, e a iluminação alaranjada, realça ainda mais a idéia de calor enlouquecedor e desconforto. Por fim, difícil é distinguir quem, de fato é louco e assassino. Atenção para a atuação de Robert Duvall, interpretando o Tenente-Coronel Kilgore e a pequena participação de Harrison Ford, como o Coronel Lucas.

Todos estes componentes formam mais um filme memorável para a carreira de Coppola, e uma ousada provocação à cultura belicista estadunidense, num trabalho sonoro, visual e psicológico impactante e perturbador que põe em xeque a validade de uma guerra alheia, ou ainda de uma guerra, qualquer que seja, e os efeitos devastadores que ela pode ocasionar, nos que se relacionam com o conflito, diretamente e indiretamente. Triha sonora perfeita, fotografia perfeita, ângulos incomuns e inovadores, cenas de guerra convincentes numa produção primorosa. Um clássico.

"Você não tem o direito de me julgar. Tem o direito de me matar, mas não de me julgar.”

Coronel Kurtz

Críticas

Harry Potter e a Ordem da Fênix

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A série do bruxinho mais querido do mundo passou por uma grande metamorfose durante todos esses anos. No início, sob a batuta de Chris Columbus, era bem fiel aos livros e perdia muito tempo expondo as maravilhas daquele mundo fantasioso. No terceiro filme, Alfonso Cuarón deu start num processo de amadurecimento da série - e foi bem recebido pelos fans e pela crítica. "Harry Potter e o Cálice de Fogo" tinha tudo para ser a grande obra-prima até aqui, mas falhou em alguns aspectos: sua primeira metade ficou enfadonha, perdendo muito tempo naquele vai-e-vem entediante de hormônios adolescentes. A segunda parte, no entanto, é eletrizante; o torneio tribruxo dá uma gás extra ao episódio. Mike Newell pouco durou na cadeira do diretor, deu lugar ao inexperiente David Yates – que para mim endireitou de vez a série.

"Harry Potter e a Ordem da Fênix" até aquele momento era o capítulo mais sombrio entre os que já haviam sido feitos. O clima criado por Yates, para os que tem boa memória, é bastante parecido com o do filme sucessor (Enigma do Príncipe). As brincadeiras pré-adolescentes ficam um pouco de lado; em seu lugar, entram personagens mais maduros, mais interessantes. A volta do Lorde das Trevas acompanha a série para uma temática completamente distinta do que já havia sido feito. Assim, posso afirmar categoricamente que o quinto filme introduz o espectador ao caos instalado no mundo bruxo a partir do retorno de Voldemort. O diretor recria esse clima muito bem, sempre auxiliado por uma ótima fotografia e efeitos especiais de primeira linha – alguns deles até impressionam pela extrema realidade.

Na parte da história, o roteirista Michael Goldenberg assumiu o lugar de Steve Kloves. Aqui, ele trabalha com um pouco mais de liberdade, mais distante da obra original. Ainda assim, algumas partes ganham contornos estranhos, como no próprio início: Duda vai provocar Harry Potter, o bruxo se invoca e do nada aparecem dementadores. No livro é ao contrário: antes dos dementadores aparecerem, Harry vê o primo se despedir dos amigos e vai atrás dele para atazaná-lo… vai entender esses roteiristas? De resto, Goldenberg faz um bom trabalho, escolhe boas passagens e faz um filme interessante até para os menos familiarizados com a obra de J.K Rowling. Mesmo assim, a saga do bruxinho nos cinemas continua sendo voltada única e exclusivamente para os fans - infelizmente.

A partir do Cálice de Fogo, vemos que os atores evoluíram bastante, especialmente Emma Watson e Rupert Grint. Daniel Radcliffe, por sua vez, é pouco carismático, parece amedrontado com o tamanho do seu personagem e é um dos elos fracos dessa série; seu relacionamento com Cho Chang é simplesmente risível (e a atriz pouco colabora para isso mudar). O elenco mais experiente pelo menos sempre segura a bronca: Michael Gambon, Jason Isaacs, Helena Bonham Carter, Gary Oldman, Alan Rickman, Maggie Smith… se há uma coisa boa para os que detestam Harry Potter é o elenco de apoio, pois conta com astros de primeira grandeza. Em "Harry Potter e a Ordem da Fênix" também vemos novos personagens, como o da professora Dolores Umbridge, interpretada por Imelda Staunton. A atriz consegue achar o tom certo para a insuportável bruxa, ora irritantemente serena, ora diabólica – um ótimo papel! Quem também merece suas ressalvas é Ralph Fiennes. Mesmo deformado e com a aparência ofídica, ele nos entrega um um lorde das trevas macabro e aterrador.

"Harry Potter e a Ordem da Fênix" marca a estreia de David Yates no comando da série. Com competência, o diretor faz um dos melhores filmes até aqui, bem mais maduro, menos bobinho e mais sombrio. Como de praxe, o figurino e a trilha sonora merecem elogios, bem como as cenas de luta. Aquela batalha final contra os comensais da morte e o duelo entre Dumbledore e Voldemort gozam de uma beleza imensurável – pelo menos o alto investimento é justificado de alguma maneira. Há, contudo, que se esperar pelos dois últimos episódios; os fans, como esse que vos fala, esperam por duas obras-primas, cheias de energia, bem contadas e de tirar o fôlego. Vamos esperar…

www.moviefordummies.wordpress.com

Críticas

Suspiria

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Dario Argento é um dos mais cultuados cineastas do dito "Cinema Fantástico" e, ao lado de Mario Bava e Lucio Fulci, um dos maiores expoentes do cinema de horror italiano (e mundial).

Sua filmografia é carregada de contrastes, com tantos "altos" quanto "baixos". Porém, mesmo nos seus trabalhos mais fracos, é impossível não reconhecer o seu enorme talento na direção. Suspiria é um dos seus filmes mais conhecidos e aclamados. Sempre presente em qualquer "top" minimamente digno de filmes de terror, é o ápice de seu apuro estético e dos maiores exemplos de sua habilidade de manipular as sensações de medo e tensão do público.

Ambientado na Alemanha, o filme conta a história de Susan Bannion (Jessica Harper), uma jovem americana que recebe um convite para ingressar como aluna na conceituada Escola de Balé de Escherstrausse, sede dos principais acontecimentos da trama. Chegando lá, logo na entrada, depara-se com uma jovem desesperada em fuga. Ao tocar o interfone, uma voz feminina alega que sua presença não é bem vinda e a manda embora. Somente no dia seguinte, após passar a noite num hotel, Susan finalmente é recebida pela diretoria da academia, a vice-diretora Madame Blanc (Joan Bennett) e a professora Tanner (a ex-musa Alida Valli), que dizem não ter conhecimento de quem possa ter sido a pessoa que a negou entrada na noite anterior.

À partir daí, vemos Susan interagir com as demais internas da escola, chegando a fazer amizade com Sara (Stefania Casini) e demonstrando interesse pelo jovem Mark (Miguel Bosé), também aluno que paga sua estada na escola prestando serviços gerais à diretoria. Ela também é informada que Patty (Eva Axén), a moça misteriosa que esbarrou nela na noite anterior, havia sido brutalmente assassinada, o que já a deixa receosa. Sua desconfiança aumenta quando ela passa a presenciar fatos estranhos dentro da escola, como barulhos à noite, vermes caindo do teto, indivíduos soturnos (como o mordomo ou uma das copeiras) e sensações ruins (chegando a desmaiar durante uma aula e, pouco tempo após, recuperando-se como se nada tivesse acontecido - e um misterioso sono que a faz acreditar estar sendo dopada), além do desaparecimento de sua amiga Sara (que havia alertado-a da presença maligna que ela sentia estar presente no prédio) que a levam a pesquisar sobre o local.

Durante suas investigações,faz contato com o psiquiatra Dr. Frank Mandel (Udo Kier numa pequena - mas importante - participação) e o Prof. Milius (Rudolf Schundler), autor de um livro sobre bruxaria, que a conta da lenda de Helena Markos, conhecida como “Rainha Negra”, poderosa feiticeira que havia morrido num incêndio quase um século antes naquele mesmo local, o que, aliado à morte de Sara, sua amiga, confirma suas suspeitas de que a escola é amaldiçoada, servindo como local de culto à antiga bruxa.

O argumento é bem simples e a abordagem do roteiro mais ainda, este, por sua vez, cheio de furos. Entretanto, a grande força do filme está justamente na parte estética. Argento cria um clima de tensão extrema baseado essencialmente nas imagens e nos sons.

Assim como no seu trabalho anterior, o também genial (e ponto mais alto de sua carreira) Prelúdio Para Matar, o diretor procura ignorar certos pontos “lógicos” e passar ao espectador uma atmosfera de pesadelo, oscilando entre o real e o bizarro, tudo em detrimento da construção de um clima de medo extremo.

O trabalho de cenografia é fantástico. Como de costume no cinema italiano pós neo-realismo, o uso das cores se sobressai e ganha vida como um personagem. Isso, aliado à meticulosa estilização nas cenas de mortes, todas de uma violência gráfica brutal, carregadas de um “profondo rosso” que viria a ser uma das características mais marcantes de toda a filmografia de terror do Argento, fazem de Suspiria um verdadeiro espetáculo visual e exercício de tensão.

Logo nos primeiros instantes, no caminho de Susan do aeroporto à escola, somos deleitados com o jogo de cores dos reflexos no vidro do táxi. Tons entre o vermelho e o azul fortes, alternados à cada relâmpago, entregam o que será o grande clima do filme. A cena da morte por enforcamento, minutos após, é tida como uma das melhores do filme, tanto pelo aspecto visual, quanto pela trilha sonora atordoante (tal sequência, inclusive, foi responsável por me deixar com medo permanente de janelas à noite). A chuva de cacos do vitral e a poça de sangue jamais sairão de minha cabeça.

Argento também faz uso de planos mega abertos, como na “belíssima” cena da morte do cego, focando as “sombras” passando nas paredes, dominando todo o espaço ao redor, procurando assim dar uma maior noção da dimensão do mal que os espreitava.

A trilha sonora é outro “personagem”. Fugindo da quase predominante trilha clássica usada nos filmes de terror, Argento embala os grandes momentos de seu filme com o rock da banda Goblin, com uma musicalidade pesada perfeita complementada por “suspiros” e gemidos de dor ao fundo, apresentada sempre em tom crescente, nos conduzindo lentamente à agonia.

Em alguns momentos, o volume alto da música sobrepondo-se aos gritos das personagens chega a ser realmente atordoante. A sensação ao ouvi-la é de que estamos realmente rodeados pelos mesmos demônios que dominavam o velho prédio. Seu ápice é alcançado nos momentos finais.

A "Mãe dos Suspiros" gritando (ao mesmo tempo em que gargalha ao coro de uma legião de demônios) “You want to kill me! You want to kill me! Hell it’s beyond that door ... The living dead!” é um dos momentos mais aterrorizantes e perturbadores que já presenciei em um filme.

Entretanto, muitos pontos fracos do roteiro são visíveis. Furos enormes que deixam alguns fatos importantes com pouca ou nenhuma explicação (como qual seria o envolvimento de alguns personagens importantes nos rituais de bruxaria, o destino de outros e a real motivação dos que veneravam a “Mãe dos Suspiros”). Porém, isso acaba sendo o de menos dentro desta obra.

Suspiria pode ser tida como a essência da contribuição do Argento para o cinema: a predominância da construção da atmosfera sobre o conteúdo. Todavia, a força das imagens que ele nos passa é tamanha que até mesmo o roteiro, um dos pontos-chave de um filme, e as atuações chegam a ser, em dados momentos, irrelevantes. E conseguir isso é um mérito de poucos. Somente gênios (e doentes) como Dario Argento têm esse dom.

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