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Quando o cinema vira jogo (e vice-versa)

O fascínio do público pela interatividade

O cinema sempre teve o poder de nos transportar para mundos imaginários, despertar emoções intensas e criar memórias duradouras. No entanto, nas últimas décadas, uma transformação silenciosa vem ocorrendo: a fusão entre o cinema e o universo dos jogos. E não estamos falando apenas de adaptações de jogos para as telonas — mas de uma nova forma de contar histórias, onde o espectador deixa de ser passivo e assume um papel ativo.

A interatividade, elemento chave nos games, começa a ser integrada ao cinema de maneiras cada vez mais sofisticadas. A linha entre assistir e jogar está cada vez mais tênue, criando um novo tipo de experiência narrativa que atrai públicos diversos.

Black Mirror: Bandersnatch e o início de uma nova era

Em 2018, a Netflix lançou Black Mirror: Bandersnatch, episódio interativo que permitia ao espectador escolher os rumos do protagonista em tempo real. Embora o conceito não fosse exatamente novo — experiências semelhantes existiram nos anos 90 em DVDs e CD-ROMs — a produção da plataforma de streaming marcou um divisor de águas.

Com qualidade cinematográfica, múltiplas ramificações narrativas e finais alternativos, Bandersnatch mostrou que era possível unir linguagem cinematográfica e lógica de gameplay sem comprometer a integridade artística da obra.

Esse sucesso reacendeu o interesse por formatos híbridos e inspirou novas produções que buscam replicar ou expandir a ideia.

O retorno das FMVs e o resgate da estética dos anos 90

Nos anos 90, os chamados jogos FMV (Full Motion Video) tentaram unir vídeo filmado com gameplay. Títulos como Phantasmagoria e The 7th Guest foram inovadores, mas limitados pela tecnologia da época. Hoje, com recursos muito mais avançados, o gênero está voltando com força.

Produções como Telling Lies, Her Story e The Complex utilizam atores reais, roteiros cinematográficos e elementos de jogo investigativo. O resultado é uma experiência que exige atenção, dedução e tomada de decisões — como um filme onde você é o roteirista.

Essa ressurreição do FMV mostra que a nostalgia pode ser aliada da inovação, criando obras que são ao mesmo tempo retrô e contemporâneas.

Quando o jogo homenageia o cinema

A influência também ocorre no sentido inverso. Jogos como L.A. Noire foram desenvolvidos com captura facial hiper-realista e enredo digno de filme noir. Já Death Stranding, dirigido por Hideo Kojima, traz não apenas estética cinematográfica, mas também um elenco de estrelas de Hollywood, como Norman Reedus e Mads Mikkelsen.

Nesses casos, o jogo não apenas se inspira no cinema — ele se estrutura como um. Há trilha sonora com curadoria de artistas renomados, fotografia planejada como em longas-metragens e até mesmo direção de cena.

É interessante observar que a linguagem do cinema não é apenas uma referência, mas uma base sobre a qual esses games se constroem. A imersão deixa de ser apenas visual e passa a ser emocional, como em um filme com o qual se pode interagir.

Os desafios da narrativa interativa

Nem tudo são flores nesse cruzamento de linguagens. Criar histórias interativas exige um esforço narrativo complexo. Cada escolha do jogador ou espectador pode abrir múltiplas ramificações, o que demanda roteiros mais robustos, gravações adicionais e testes rigorosos de usabilidade.

Há também a questão do equilíbrio: até que ponto as escolhas são realmente significativas? Muitos produtos vendem a ideia de interatividade, mas na prática apresentam apenas a ilusão de liberdade. Isso pode frustrar usuários mais exigentes, que esperam impacto real de suas decisões na trama.

Mesmo assim, quando bem executado, o resultado pode ser envolvente — como uma espécie de “filme-jogo” que respeita o tempo e a curiosidade do espectador.

Realidade virtual e o futuro da narrativa imersiva

A próxima fronteira da fusão entre cinema e games parece ser a realidade virtual. Já existem curtas-metragens pensados exclusivamente para VR, onde o espectador pode literalmente caminhar pelo cenário e testemunhar os eventos de ângulos diferentes.

Essa abordagem elimina a câmera como mediadora da narrativa e coloca o público dentro da história, com sensação de presença total. A linguagem cinematográfica precisa se adaptar, pois enquadramentos e cortes perdem sentido quando quem “mira” é o próprio usuário.

Ainda estamos nos primeiros passos dessa linguagem, mas já é possível imaginar um futuro em que o espectador será também personagem — com liberdade para explorar, agir e alterar o curso da narrativa. Seria o fim da separação entre cinema e game? Talvez. Mas certamente será o início de uma nova arte.

Curiosidades entre os gêneros

É curioso observar como até jogos simples, como o enigmático Mines, conseguem gerar tensões narrativas que lembram thrillers psicológicos. Com poucas imagens e muitos silêncios, o jogador entra em um estado de alerta semelhante ao de personagens em situações limite no cinema.

Por outro lado, plataformas como Quotex, ainda que voltadas para atividades financeiras, vêm incorporando elementos visuais inspirados em linguagens cinematográficas para aumentar a imersão e o engajamento de seus usuários. A estética cinematográfica não está mais restrita ao cinema tradicional.

O novo papel do espectador

A transformação que estamos vivendo não é apenas tecnológica — é comportamental. O público de hoje quer participar, decidir, influenciar. O modelo clássico de assistir passivamente começa a perder espaço para uma experiência mais envolvente.

E, nesse processo, o cinema aprende com os games, assim como os games aprendem com o cinema. O resultado é um território novo, fluido e empolgante, onde narrativas híbridas oferecem experiências que nenhum meio isolado poderia entregar.

No fim das contas, talvez o futuro do entretenimento não esteja em escolher entre ver ou jogar — mas em fazer as duas coisas ao mesmo tempo.

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