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O Urso de Ouro bisa o poder feminino, chegando de mansinho no penúltimo dia do Festival e arrebatando o júri com o experimentalismo e a potência cênica de Touch me Not (um título que por si só já celebra a decisão suprema da mulher sobre seu corpo), da diretora romena Adina Pintilie. 

O prêmio chega um ano depois do Urso de Ildiko Enyedi por Corpo e Alma, que inclusive está indicada ao Oscar de estrangeiro, e marca também o segundo Urso da Romênia na década, depois do Instinto Materno de Calin Peter Natzer. O corajoso e para muitos incômodo filme de Adina retira as barreiras que separam ficção e documentário quando ela mesma se filma e coloca na tela pessoas com dificuldades sexuais e afetivas, criando um mosaico que aos pouco a une a uma outra cineasta como uma espécie de alter ego, justamente a mulher da frase do título, que não suporta o toque do outro. O filme enfileira personagens em sua narrativa e vai criando sua rede de empatia entre pessoas que precisam no fundo da mesma coisa: respeito, e quem sabe, um abraço. 

Muitos acharam que a proposta ousada de Adina seria a porta de entrada e certeira para o prêmio Alfred Bauer (que outorga propostas diferenciadas em linguagem cinematográfica), mas aparentemente o júri se viu conquistado de tal maneira que o provável vencedor pensado anteriormente teve que contentar com dois prêmios outros, um deles exatamente o Alfred Bauer. Digo isso porque o outro único vencedor que saiu com dois prêmios nessa noite alemã foi Las Herederas, o paraguaio que arrebatou o FIPRESCI presidido pelo brasileiro Mario Abbade e também o prêmio de atriz para Ana Brun, além do citado troféu para ousadias estéticas. Touch me Not também levou outra outorga, o prêmio para diretores estreantes.

Outra mulher que Berlim é apaixonada por tradição levou o segundo lugar na noite, a polonesa Malgozarta Szumowska e mais um petardo político-social de nome Twarz, que investiga a construção de uma estátua do Cristo Redentor no interior da Polônia que almeja ser maior que a carioca. O filme promove mais um prêmio berlinense para a diretora, que tinha sido a melhor diretora por Body, seu filme anterior. Já o prêmio de direção desse ano foi pra um moço conhecido do público, um tal Wes Anderson e sua animação em stop-motion Ilha dos Cachorros, o prêmio mais surpreendente da noite.

O Brasil faz a festa desde ontem. Além de Julia Murat ser uma das produtoras de Las Herederas, o filme também ganhou hoje uma menção especial para Ex-Pajé, documentário de Luiz Bolognesi cujo título é auto-explicativo. O filme de Maria Augusta sobre o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff O Processo causou comoção na Alemanha e saiu com o terceiro prêmio do público entre documentários. E pra consagrar, o prêmio Teddy para filmes de temática LGBTQ foi todo nosso: ficção para Tinta Bruta, de Filipe Matzembacher e Márcio Reolon, documentário para Bixa Travesty, de Kiko Goifmann e Claudia Priscilla, além de uma menção especial para Obscuro Barroco, filme da grega Evangelia Kranioti sobre a travesti Luana Muniz e sua vida no Rio de Janeiro.

Abaixo, a lista de vencedores:

URSO DE OURO - 'Touch me Not', de Adina Pintilie

GRANDE PRÊMIO DO JURI (URSO DE PRATA) – 'Twarz' (Mug), de Małgorzata Szumowska

PRÊMIO ALFRED BAUER (URSO DE PRATA) – 'Las herederas' (The Heiresses), de Marcelo Martinessi

DIREÇÃO (URSO DE PRATA) – Wes Anderson , por 'Ilha de Cachorros' 

ATRIZ (URSO DE PRATA) – Ana Brun, por 'Las Herederas' 

ATOR (URSO DE PRATA) – Anthony Bajon, por 'La Prière' 

ROTEIRO (URSO DE PRATA) – Alonso Ruizpalacios and Manuel Alcalá, por 'Museo' 

CONTRIBUIÇÃO ARTÍSTICA (URSO DE PRATA) – Elena Okopnaya, por 'Dovlatov' (figurinos e direção de arte)

PRÊMIO PARA FILME DE DIRETOR ESTREANTE - 'Touch me Not', de Adina Pintilie 

TEDDY BEAR - 'Tinta Bruta', de Filipe Matzembacher e Marcio Reolon (ficção) e 'Bixa Travesty', de Kiko Goifmann e Claudia Priscilla (documentário) 

JÚRI ECUMÊNICO: 'In the Aisle', de Thomas Stuber