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Do you like scary TV?

É possível uma série baseada em uma famosa franquia de cinema repetir o sucesso da obra original? Como manter o fôlego em uma série cujo plot principal gira em torno de um assassino mascarado perseguindo adolescentes? Em resumo, o slasher funciona na televisão? As perguntas são muitas, e não vieram do público quando anunciada a estreia da série Scream, baseada na franquia homônima de Wes Craven e Kevin Williamson. Quem se enrosca nessas dúvidas são os próprios personagens, pois o público já está cansado de saber que qualquer dúvida ou receio no universo de Pânico se reverte em seu próprio argumento e ponto de partida. Não há tempo ruim em Pânico, pois mesmo em tempos de crise, seja ela financeira ou criativa, a metalinguagem usa de certa psicologia reversa e dá um jeito de verter qualquer desvantagem em uma nova ideia. 

A nova série da MTV vem conquistando timidamente admiradores mundo fora, sendo muitos deles desconhecedores ou pouco adeptos à franquia original de filmes que se desenrolou entre 1996 e 2011. A ideia é cativar o público saudosista e ao mesmo tempo alcançar uma nova geração, pois a essência de Pânico sempre foi essa de analisar a geração jovem vigente e compará-la de alguma forma com as anteriores através de um prisma pop social. Se antes o conceito abrangia as mudanças sociais nos filmes e na vida jovem desde o filme Halloween (1978) até a segunda metade dos anos 1990, agora é 1996 que virou passado e serve de base de comparação e análise para com os tempos atuais. A mudança mais óbvia e essencial, claro, é a migração do cinema para a televisão.

Em um cenário onde cada vez mais o cinema comercial americano se prende numa reciclagem pouco criativa e sem fim, a vida inteligente vai migrando para a televisão e a geração jovem de hoje está muito mais antenada com os Walking Dead da vida do que os remakes dos slashers dos anos 1980. A linguagem televisiva americana de hoje é muito mais dinâmica, criativa, cativante e dialoga mais facilmente com o público adolescente, e por isso é mais do que natural a brilhante ideia de migrar a franquia Pânico do cinema para a TV, principalmente agora com a triste morte de Wes Craven, o diretor da tetralogia original do cinema. Pânico 4 e suas críticas e retratações da internet, da obsessão cada vez maior e mais insaciável de violência explícita e ao vivo, e da onda maldita e interminável de remakes, fez sua parte em finalizar o legado de Craven e Williamson sobre o gênero de terror dentro do cinema, e para manter Ghostface ainda relevante e interessante nada mais ousado e inteligente do que recomeçar tudo na TV, e essa é a ideia da série da MTV.

Scream possui as mesmas estruturas dos filmes de Wes Craven, e ainda engloba alguns outros clássicos do terror como Sexta-Feira 13 (1980), mas ao mesmo tempo se assume como produção televisiva e segue nos meios exigidos pela mídia. A qualidade duvidosa dos programas da MTV pode ser ignorada, como o elenco mais ou menos, visto que o vigor e espírito da obra original de Williamson é muito bem mantido e preservado. Temos todos os ingredientes para a receita dar certo: o grupo diversificado de personagens jovens, os segredos dos adultos, a cidade pequena, o fantasma de um crime não resolvido no passado, uma protagonista esperta (uma Sidney atualizada), um adolescente aficionado por terror que funciona como novo ditador das regras do gênero (um Randy atualizao), e também um lago à lá Crystal Lake que finaliza esse cenário mais que propício para uma chacina.

O desafio maior será manter esse pique fora do formato fílmico, onde toda a trama é desvendada em mais ou menos duas horas. Agora a questão é como continuar no ritmo quando temos um assassino mascarado e um sem-número de capítulos pela frente, comandados por um elenco relativamente reduzido. Não há gente o suficiente para morrer, pelo menos não entre o casting principal, e não há garantias de que cedo ou tarde o público se torne impaciente com relação a revelação da identidade do Ghostface. O fantasma de Twin Peaks (1990-1991), série de David Lynch e Mark Frost cuja receita desandou depois da precoce revelação do assassino de Laura Palmer, ainda assombra as produções do gênero na TV, e por isso a questão em volta do rosto por trás da máscara reformulada do Ghostface ainda é um mistério mesmo para os roteiristas.

Mas nada disso parece impedi-los por enquanto. Scream começa cheio de gás, ideias interessantes para manter a atenção do público mesmo fora do núcleo “quem é o assassino?” e reviravoltas rocambolescas típicas de seriados adolescentes. Sua linguagem é moderna dinâmica, e a trama principal, ainda que clichê, é muito envolvente e cria uma ponte legal com as referências de slashers oitentistas do cinema americano. Ainda é cedo para dizer se o interesse se manterá, até porque a questão não é manter o medo em si, mas sim a brincadeira satírica e divertida que sempre foi o forte de Pânico. Alguns meses e muitas facadas depois, voltamos para descobrir.

Comentários (1)

Cristian Oliveira Bruno | terça-feira, 03 de Novembro de 2015 - 06:17

É impressionante a força da franquia Pânico. Quase 20 anos depois ela continua a render novos frutos. Gostando ou não - não sou dos maiores fãs -, há de se respeitar.

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