A princesa solitária.
Desde pequena, Carrie Fisher parecia destinada a alcançar as estrelas de uma forma ou de outra. Filha de dois grandes astros do show business americano, a atriz Debbie Reynolds e o cantor Eddie Fisher, ela nasceu em meio às mais brilhantes celebridades de Hollywood, em meio ao mundo de sonhos e ilusões que a levaram numa jornada de muitos altos e baixos que fizeram sua fama dentro e fora das telonas.
Nascida em 21 de outubro de 1956, em Los Angeles, Califórnia, até que demorou para Carrie Frances Fisher seguir carreira artística. Quando tinha três anos, o pai abandonou sua mãe para se tornar o quarto dos sete maridos de Elizabeth Taylor, uma separação bombástica e exaustivamente explorada pela mídia, o que acabou expondo mais ainda a pequena Carrie à vida pública. Solitária numa relação difícil com a mãe alcoólatra e o irmão mais velho Todd Fisher, ela viu Debbie fracassar um segundo casamento com o magnata dos calçados Harry Karl, que torrou toda a fortuna da família e obrigou Reynolds a trabalhar sem parar nos palcos, na TV e no comando de um cassino em Las Vegas. O resultado foi que, com apenas 13 anos, começou a fumar maconha, sendo que aos 20 já estava experimentando LSD e cocaína. Fugindo da vida expositiva e dos delírios da mãe, ela mudou-se para Londres em 1973 para passar o ano estudando atuação no renomado Central School of Speech and Drama, onde desenvolveu a vontade de seguir carreira no cinema.
Quando voltou para os Estados Unidos, já foi escalada para seu primeiro filme, o cult Shampoo (idem, 1975), ao lado dos astros Warren Beatty, Goldie Hawn e Julie Christie. Embora não tenha chamado muita atenção, logo ela viraria um dos maiores ícones do cinema ao ser escalada para viver a Princesa Leia na primeira trilogia da saga Star Wars, de George Lucas. Leia não foi somente um papel que projetou Fisher como também acabou virando parte da persona dela, e os anos em que trabalhou nos três primeiros filmes rendeu inclusive um livro de memórias escrito pela atriz, intitulado The Princess Diarist, onde ela inclusive revela sobre o caso que manteve com o colega de elenco Harrison Ford, que na época era casado e pai de dois filhos. A Princesa Leia, líder da Aliança Rebelde, acabou também se tornando um símbolo feminista do cinema, sendo uma personagem independente, politizada, guerreira, corajosa e figura central para o pontapé inicial da saga. Poucas personagens femininas ganharam tamanho peso e protagonismo no cinema comercial americano, sendo hoje idolatrada em especial pela sua imagem de curiosos figurinos e penteados intergalácticos.
Com o sucesso estrondoso de Star Wars foi difícil para Carrie conseguir se livrar da Princesa Leia e ao longo de mais de trinta anos de carreira ela nunca de fato se desvencilhou da monarca espacial mais querida do cinema. Nos anos 1980, estrelou muitos filmes, mas se destacou apenas em Hannah e Suas Irmãs (Hannah and Her Sisters, 1986), de Woody Allen; Os Irmãos Cara de Pau (The Blues Brothers, 1980), de John Landis; e Harry e Sally: Feitos um Para o Outro (When Harry Met Sally..., 1989), de Rob Reiner. Nesse meio tempo, em 1983, passou por um tumultuado casamento de menos de um ano com o músico Paul Simon, marcado por muitos escândalos e idas e vindas. Em 1985, foi diagnosticada como portadora de transtorno bipolar e em 1987 lançou mais um livro autobiográfico, dessa vez relatando os problemas com o vício de drogas e sua relação tumultuada com a mãe, no best-seller Postcards of the Edge.
Mas os holofotes só se voltaram para ela novamente em 1990, quando decidiu adaptar seu best-seller para o cinema, assinando o roteiro de Lembranças de Hollywood (Postcards of the Edge, 1990), que lhe rendeu a indicação ao BAFTA de melhor roteiro, a mais importante nomeação de sua carreira. No sucesso dirigido por Mike Nichols e indicado a dois Oscar, Carrie foi interpretada por Meryl Streep e Debbie Reynolds por Shirley MacLaine. O sucesso do roteiro revelou um talento promissor para o ramo, de forma que se tornou uma requisitada script doctor, tendo revisado vários textos que posteriormente foram premiados no Oscar. Como atriz, desacelerou o passo e sobreviveu aos anos seguintes fazendo pontas de luxo e aparições em filmes populares. Dentre todas, o destaque vai para sua rápida participação em Pânico 3 (Scream 3, 2000), no qual brinca numa sacada autorreferencial com o sucesso e maldição trazidos pela personagem da Princesa Leia. Também durante os anos 1990, escreveu mais dois livros de sucesso, além de ter se tornado mãe de Billie Lourd, em 1992, fruto de seu namoro de três anos com o agente de talentos Bryan Lourd.
De 2000 em diante rareou ainda mais suas participações no cinema em frente às câmeras, com destaque para sua participação hilária em Mapas para as Estrelas (Maps to the Stars, 2014), no qual interpreta a si mesma em um filme que traduz muito a vida de pessoas como ela, que ao longo dos anos foi tão duramente castigada pela exposição excessiva da vida artística em Hollywood. Mas, obviamente, seu maior destaque recente foi a reaparição como Leia Organa na nova trilogia de Star Wars, que começou com o capítulo VII, dirigido por J.J. Abrams. Agora uma general e mãe do novo vilão da história, Leia volta a ter um papel de peso na saga, participando também em um voice-over no spin-off Rogue One e já prometida para a continuação no capítulo VIII, que está em fase de pós-produção e contará também com a presença da filha única da atriz, Billie Lourd.
Infelizmente, Carrie Fisher sofreu um ataque cardíaco e, depois de alguns dias internada, não conseguiu resistir, falecendo em 27 de dezembro de 2016, pouco tempo após completar 60 anos. Nunca escondeu seu desgosto com o show business, a quem culpou pela maior parte de seus problemas pessoais, tendo dito em certa ocasião a famosa frase: “Não se encontra carinho de verdade em Hollywood porque todos sabem fingir afeição muito bem”. Embora uma figura muito adorada e também muito polêmica, sempre se considerou, de acordo com seus registros autobiográficos, uma pessoa muito solitária. Para os fãs e gerações que a acompanharam ao longo de tantas décadas, Carrie deixa um vazio imenso no coração do cinema de fantasia, e só nos resta desejar, por fim, o que qualquer fã da saga Star Wars poderia desejar: que a força esteja com você, Princesa!