"- Você não é velha o suficiente para saber o quanto a vida é difícil.
- Claro, doutor. Você nunca foi uma garota de 13 anos."
Primeiro longa-metragem de Sofia Coppola na direção é carregado de beleza e melancolia
Filha de um dos mais consagrados diretores americanos, Francis Ford Coppola, Sofia Coppola estreou no cinema como atriz, em papéis pequenos, e foi só sob a direção de seu pai que ela teve maior repercussão, através do terceiro filme da trilogia O Poderoso Chefão, em 1990. Entretanto, sua carreira de atuação não foi muito bem recebida pela crítica, sendo inclusive vencedora de vários Framboesas de Ouro. Foi seu trabalho como diretora e roteirista que teve maior reconhecimento e a consagrou como um dos nomes femininos de maiores destaques no cinema contemporâneo. E o seu primeiro trabalho trata-se desta adaptação do romance do escritor norte-americano Jeffrey Eugenides, de 1993: “As Virgens Suicidas”.
Interessada no romance, a própria Sofia escreve o roteiro e assume a direção, realizando um filme que, por vezes, pode parecer inocente e até cômico, mas, ao decorrer da trama, vai se mostrando cada vez mais melancólico. A história é narrada em off por um dos jovens que teve sua vida marcada pela presença de cinco belas vizinhas. Mesmo passados mais de 20 anos após a história narrada, ele e os amigos ainda não conseguem tirar da cabeça o trágico acontecimento que envolveu aquelas jovens. Desde o início do filme, somos avisados sobre a tragédia iminente, e a forma como a trama é desenvolvida nos faz ficarmos cada vez mais curiosos sobre como será o tal desfecho.
Cecília (Hanna R. Rall), Bonnie (ChelseSwain), Lux (Kirsten Dunst, que nunca esteve tão linda em outro filme!), Mary (A.J. Cook) e Therese (Leslie Hayman) são os nomes das belas jovens filhas de um casal superprotetor e conservador em relação à educação e segurança de suas meninas. O pai (James Woods) e a mãe (Kathleen Turner) mantêm as adolescentes isoladas e sob observação, com receio de que algum mal possa ocorrer a cada uma delas. Curioso é que a própria superproteção dos pais irá causar a infelicidade, a insatisfação e a solidão das filhas. É importante observar que mesmo a história sendo passada na década de 1970, esse tipo de comportamento dos pais pode ser visto em várias famílias atuais no mundo inteiro, fruto de conceitos machistas ainda impregnados na sociedade.
Assim como nos seus trabalhos posteriores, Sofia nos traz problemáticas do mundo feminino e, desta vez, na posição de cinco adolescentes que vão sendo oprimidas em plena época de descobrimento sexual, na busca de um romance e na possibilidade de realizar sonhos. Tudo isso é tratado de uma forma bem delicada pelo roteiro e pelas cenas. Nota-se a excitação do olhar das meninas para os garotos que as levarão para o baile, a mordida nos lábios, o “hesitar” e depois a “entrega”. Não há nenhuma palavra, a comunicação existe pelos simples olhares e pelos trejeitos. Tais atitudes ocorrem normalmente entre jovens dessa idade e é um erro extremamente equivocado acreditar que isso também não ocorra no lado feminino.
Essas e outras temáticas já foram tratadas nos filmes de John Hughes, na década de 1980, nos clássicos “Gatinhas & Gatões” [Sixteen Candles, 1984] e “A Garota de Rosa-Shocking” [Pretty in Pink, 1986], em que as duas protagonistas se perdem no período conturbado da adolescência e buscam o garoto perfeito que a levem ao baile. A diferença da obra de Sofia Coppola para as anteriores é por tratar desse tema de uma forma mais sensível e talvez mais profunda, partindo de um lado cômico e caminhando para um lado melancólico, em que o desfecho, por mais absurdo e perturbador que seja, nos faz refletir o quão longe pode chegar um comportamento opressor em cima dos adolescentes, seja pelos pais ou pela sociedade.
Por outro lado, os pais das garotas não são expostos no filme como “vilões” ou “agentes causadores do mal”. Sua demasiada proteção é causada por pregações religiosas e por um amor incondicional e também inseguro - mal de alguns pais que não conseguem ou demoram a deixar os filhos “seguirem em frente”. Percebe-se isso quando o pai tenta, de todos os modos, ignorar o suicídio de sua filha mais nova e os questionamentos de sua proteção, sempre mudando de assunto ou fingindo que algo de errado não está acontecendo. A decisão da mãe em fazer com que Lux destrua todos os discos de rock como uma forma de castigo acaba destruindo na filha todos os seus sonhos e esperanças que as composições lhe transmitiam (observe o quanto a garota reluta em não queimar os discos do Aerosmith e do Kiss, bandas que fizeram sucesso na época com suas baladas românticas e estavam entre as favoritas dos jovens americanos).
Triste, mas não dramático a ponto de fazer chorar. Seu final pode parecer frio, mas carrega uma beleza quase poética, talvez auxiliada pela fotografia de “pôr-do-sol”. “As Virgens Suicidas” [The Virgens Suicides, 1999] marcou a estreia de uma Sofia Coppola que demonstrou ser uma promissora cineasta, e o resultado pode não ser uma obra-prima ou uma realização completa do tema, mas que é sim um trabalho competente, feito com cuidado por quem se preocupa com o assunto.
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