Não é fácil fazer um filme cujo enredo aborda as implicações da morte iminente sobre a consciência humana, um tema que é recorrente no cinema. Emma Thompson conseguiu transmitir com muita intensidade a condição de paciente terminal em Wit (2001), do diretor Mike Nichols. Em Still Alice (2014), Julianne Moore desempenha impecavelmente a devastação da vida que se exaure diante de um precoce Mal de Azheimer.
O Tempo que Resta (2005), de François Ozon, percorre o mesmo caminho e não há como deixar de fazer associações diretas com outras produções do gênero. Nesse sentido, e é o que parece resultar em frustração para alguns, esse é um filme diferente.
Com Emma Thompson e Julianne Moore, somos levados às sensações das protagonistas, às suas angústias e medos. São personagens absolutamente inquietantes e que nos conectam absurdamente à ideia da morte. Com Ozon, o protagonista Romain (Melvil Poupaud) transmite as mesmas emoções com uma força impressionante, mas isso só acontece no início do filme, quando vamos acompanhando a rápida transição na vida do personagem. Em um momento, ele está em ascensão na carreira como fotógrafo e logo a seguir recebe, com direito a toda carga de tensão que exala dessa condição, o diagnóstico de que está com câncer metastático.
Só que as dores e sofrimentos, desdobramentos do câncer são postos de lado e ficamos com os aspectos psicológicos e comportamentais do protagonista. A sua relação com os pais, a avó, com a irmã e com o namorado, que mora consigo, é central no enredo.
Quanto a isso, o filme passa a ideia de uma sociabilidade muito superficial proveniente de Romain. Sua relação com os parentes parece mecânica, a não ser com a sua avó, única pessoa com quem ele compartilha a notícia da doença. “Porque você gosta de mim e vai logo morrer”, ele lhe diz.
Conhecemos pouco sobre a personalidade dele, mas o diretor vai entregando o que importa para construir uma mudança psicológica do protagonista. Romain não gosta de crianças, nem mesmo dos filhos da irmã, mas, após receber um convite de um casal, cujo homem é estéril, para dormir com a esposa, após a recusa inicial, volta até eles e resolve aceitar. Essa subtrama artificial dá resultado a uma cena que chega a ser constrangedora, pois enquanto a mulher transa com Romain, o marido conserva-se ao lado dela, olhando-a como se tratasse de um parto, como quem diz “força, estou aqui com você”, enquanto ela aproveita a situação.
Outras mudanças vão acontecendo, como com a relação com a irmã e com o ex-namorado, com quem havia rompido em decorrência da doença. Ele se prepara para morrer sem deixar pendências.
Ozon não me parece ser um diretor apelativo. As mesmas críticas dirigidas a O Tempo Que Resta são feitas a outra realização sua, O Refúgio (2008), que é sobre uma jovem cujo namorado morre de overdose e ela se descobre sozinha e grávida, e apesar de buscar o isolamento, mantém uma fresta aberta para voltar a ser feliz.
O realizador francês conseguiu em O Tempo Que Resta fazer uma história com sua marca e que, apesar de não transbordar de emotividade, é tocante de uma forma sensível.
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