Por: R. S. Franco
27/02/2010
É preciso olhar com os olhos de uma criança, no primeiro momento isso pode parecer fútil e inocente, mas ao decorrer dos cento e um minutos que o filme tem de duração, você irá logo perceber que ser criança é algo complexo como todo o filme em si, dentro de uma guerra de sentimentos humanos bons e ruins que estão sendo moldados na pessoa que mais tarde você irá se tornar.
Onde vivem os monstros, passa como primeira impressão que é apenas mais um filme infantil do qual já conhecemos o universo, assim como os belos filmes da Disney sempre repletos de lições. Entretanto, Onde vivem os monstros, explora um lado totalmente complexo do ser humano a partir do seu principio, sua fase quando criança, o filme irá fazer uma analise dos sentimentos com uma profundidade que logo fará você admitir que não se trata de um filme para “crianças”.
Assim que o filme começa, você já pode perceber que está mergulhando em um universo o qual você colocou de lado, os símbolos da Warner Bross e os demais estão rabiscados, como toda criança adora fazer com coisas que os adultos julgam ser importantes, aí uma criança vai lá e rabiscas tais documentos dando um sentido real, mas os adultos não entendem. É como a primeira passagem do livro O pequeno Príncipe, quando é descrito que o garoto havia lido sobre jibóias, então o menino desenha uma grande jibóia marrom digerindo um elefante, mas como ele ainda é uma criança aos olhos de um adulto eles somente conseguem ver um chapéu, pois isso é raciocínio de uma pessoa que teve de trancar seus sonhos numa gaveta para se tornarem homens de negócios preocupados apenas com os bens materiais.
A primeira cena do filme então demonstra toda turbulência e ousadia do filme. O garoto está correndo pela casa atrás do seu cachorro, mas para ele não é seu cão e sim um monstro o qual ele tem de derrotar. Ele está em seu universo, o qual seus olhos imaginam envolta da solidão. Quando, enfim, ele consegue construir um abrigo seguro, é rapidamente destruído pelas amigos de sua irmã, ele se vê mais desamparado com isso. Não existe lugar seguro.
Sua revolta causada pela falta de estrutura de sua família e por ele não ser o centro das atenções como toda criança deseja, ele mergulha numa jornada onde sua imaginação será o chão. E é ai que tudo realmente começa, quando a história nos leva ao mundo dos monstros, o mundo de Max, onde ele tudo é capaz.
Todavia, seu mundo é um grande deserto onde todos os seus medos vivem. Ao chegar no seu mundo ele é rapidamente coroado rei por seus monstros, que são seus medos, sentimentos humanos que se refletem por meio deles: ira, amor, inveja, sinceridade e tantos outros sentimentos.
Por mais que ele faça suas escolhas pensando no bem de todos, ele vai percebendo que é impossível ser bom para todos. Tudo se tem um preço, o que mantém a balança da vida em equilíbrio: bem e o mal, luz e trevas, amor e ódio...
O roteiro não tem pressa, ele vai criando todo o universo lentamente e mostrando com detalhes a essência do garoto, a essência de um ser humano se formando. Esse ritmo me lembra muito A viagem de Chihiro, pouco a pouco vai criando um mundo tão complexo cheio de crenças e profundidade assustador, fazendo a personagem principal amadurecer e conhecer a si mesmo.
Ser rei de sua própria vida é uma fase de autoconhecimento e isso pode ser algo esmagador para um ser humano que está acostumado ao decorrer de sua vida usar mascaras para esconder quem realmente é. Ter de encarar a si mesmo é uma batalha assustadora.
Com os olhos de uma criança é possível perceber também que os monstros não seguem nenhuma estética padronizada no que é belo ou feio. Os olhos de uma criança são puros e não vêem como o “mundo” destrói as pessoas dizendo que elas não se encaixam dentro do padrão, que elas são feias ou coisa do tipo. “O que você vê e ouve depende do lugar em que você está como também depende de quem você é”, C. S. Lewis. O que é belo ou feio, certo ou errado, bom ou ruim para cada um de nós depende da nossa visão, do que te alegra, do que te assusta, do que te da tesão, de como você foi criado, as vezes parecemos robôs sendo programados segundo o capitalismo e nos esquecemos dos valores e da ética, nos acomodamos e não paramos para pensar. “Não importa quão delicada seja uma situação, sempre haverá dois lados”, Shakespeare. No entanto nos esquecemos de tudo isso.
E nesse complexo universo do qual é analisado a formação da personalidade de um homem – no caso o garoto – tendo de enfrentar seu grande deserto. Tudo que já fomos um dia até se tornamos o que cada um de nós somos hoje, domar o animal que existe dentro de cada um.
Lembre-se, quando for assistir essa doce obra-prima, assista com os olhos de uma criança, só assim você irá conseguir enxergar através dos diálogos inocentes do roteiro a verdadeira magia, complexidade e profundidade.
Onde vivem os monstros? Dentro de cada um de nós. Dentro do nosso deserto. Dentro do nosso mundo. Dentro das nossas mentes.
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