Amor, morte e renascimento segundo Aronofsky.
“Lançamo-nos sempre para o proibido e desejamos o que se nos nega; assim o doente aproxima-se das águas proibidas”.
Ovídio.
“Se o tempo encontra o seu sentido na eternidade, é preciso então que seja compreendido a partir dela”.
Martin Heidegger.
Fonte da Vida é um daqueles filmes que provocam sentimentos variados e reflexões sobre a vida e sua relação perante o universo.
O filme aborda a história do casal Tommy (Hugh Jackman) e Izzi (Rachel Weisz) e a dificuldade do marido em aceitar a doença de sua esposa afligida por um tumor no cérebro. Tom é cientista e procura desesperadamente a cura para salvar seu grande amor. Izzi é escritora, e já conformada com o seu destino, somente deseja passar os últimos dias de sua vida ao lado de seu marido.
Este é o pathos da narrativa: Tommy é a figura do homem moderno, “racional”, que acredita que a ciência é o único meio de alcançar a felicidade. Ver a morte como uma doença que deve ser encontrada a cura. Izzi é a figura da resignação. Entende a morte como parte da existência de todos os seres do universo.
A temporalidade do filme se divide em três partes: na Espanha de 1500, nos tempos atuais e no futuro em 2500. O filme foi muito criticado pela forma supostamente confusa que os eventos são colocados. Obviamente, uma pessoa acostumada com filmes de narrativa linear terá dificuldade, mas isso pouco atrapalha na compreensão do enredo. Fonte da Vida faz parte do seleto grupo de grandes filmes de narrativa complexa. Um exemplo disso é 2001: Uma Odisséia no Espaço. Não é a toa que as duas películas compartilham temáticas semelhantes: enquanto Kubrick analisa a existência humana a partir da evolução biológica e tecnológica, Aronofsky utiliza o amor como ponto de partida para análise do ser humano perante o universo.
A parte técnica do filme não é menos impressionante. O diretor soube com utilizar os mais variados planos. Os cortes de continuidade durante a narrativa não são gratuitos. Isto fica bem claro na cena em que Izzi convida seu marido para ver a neve. A belíssima fotografia em tons amarelados complementa de forma ainda mais relevante o enredo do filme, pois o amarelo é a cor de Shibalba, a nebulosa. Seu significado para a cultura maia é a questão central que permeia o filme. Outro acerto da obra são os efeitos especiais, frutos de experiências químicas feitas em laboratório. Para Aronofsky, o CGI (o mais comum nos filmes atuais) faria o filme envelhecer com o tempo.
Fica difícil imaginar os personagens principais sem os atores Hugh Jackman e Rachel Weisz. O primeiro foi uma grande surpresa, interpretando de forma intensa e dolorosa o seu personagem em três momentos (conquistador espanhol, cientista e cosmonauta). Não tenho dúvida que é o ponto alto da carreira de Jackman até o momento. Já Weisz, com sua beleza estonteante, convence de forma delicada e contundente a escritora e a rainha. Os personagens secundários complementam de forma simples e importante a narrativa.
A trilha sonora de Clint Mansell (criador da marcante música-tema de Réquiem para um Sonho) tocada pelo quarteto de cordas americano Kronos Quartet e a banda de rock escocesa Mogwai é mais uma vez espetacular. As músicas no filme conseguem de forma primorosa a harmonia entre as imagens e os diálogos.
Fonte da Vida é um dos grandes momentos da sétima arte neste início de século. Uma obra ambiciosa e profunda que será apreciada pelas pessoas que conseguem ver o cinema enquanto arte, no sentido mais intenso do termo.
“O espaço e o tempo medidos pelo coração. Isso é o amor”.
Marcel Proust.
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