Vivemos em um mundo em que realidades próximas conseguem ser extremamente opostas. Alguns vivem de forma simples, despreocupado. Tem acesso a conhecimento e o abraçam por puro prazer. Outros nascem em ambientes estranhos, e tem uma vida diferente. Nem sempre podem ser despreocupados, às vezes acabam convivendo cedo demais com o lado sujo do mundo. Não tem acesso ao conhecimento como deveriam, e acabam por conhecer cedo demais coisas que não deveriam. É mais que a velha história de “o pobre e o rico”, seria como “o que nasceu bem, e o que nasceu mal”. Porém, ainda que dois indivíduos tenham nascido em lados opostos, sempre existe a possibilidade de mudança, de encontro e a chance de uma vida nova. Em partes, Stella é sobre isso.
O filme gira em torno da menina do título, Stella. Logo na abertura somos apresentados a personagem pela imagem que inicialmente a descreve. Stella, dançando em trajes que não condizem a sua idade (apenas 11 anos), ao redor de adultos. Apesar de tudo, uma criança, expressa inocência, mas não a tem completa. Stella é um paradoxo, sabe de muitas coisas do mundo adulto (“[...]Sei dos times de futebol. Sei fazer coquetéis e jogar fliperama. Sei as regras do bilhar e sei jogar cartas. Sei várias letras de música de cor. Sei quem é sincero e quem mente. Sei como se fazem bebês e como se transa. [...]) e ao mesmo tempo, continua sendo apenas uma menina (“Só que no resto... sou péssima”). Os pais de Stella são donos de um bar, e assim a menina viveu cercado por elementos de credibilidade duvidosa, como criminosos, bêbados e prostitutas. Porém, é tão acostumada a esse mundo que tem amigos nele, e está acostumada. Esse é o mundo de Stella.
Mas as coisas mudam quando a menina vai para uma escola de crianças ricas. Sendo a única a não ser uma “criança protegida”, no começo Stella se sente completamente isolada, tentando apesar suportar a escola para poder retornar ao seu mundo. As coisas mudam quando ela entra em contato com Gladys, a filha de um psiquiatra. Aos poucos elas se tornam amigas, e Stella é apresentada a um mundo totalmente novo. Por isso Setlla é um filme também sobre amadurecimento, sobre ritos de passagem da infância para a adolescência. Um filme sobre descobertas, de si mesmo e do outro, do que se quer e não se quer.
A abordagem da estreante Sylvie Verheye é delicada, e é notável seu esforço para aproximar a personagem do público. A narração da própria Stella é a principal responsável por seu sucesso nesse ponto. Além disso, Sylvie mostra certo apuro técnico em sua forma de filmar, e tem a ajuda de um competente elenco (com destaque a Léora Barbara, a protagonista) para compor cenas marcantes.
O fotografia do filme é discreta, mas bonita, mas o que mais trouxe beleza ao filme foi sua ambientação: os anos 70 franceses. Os figurinos, os personagens, e principalmente a trilha sonora. As músicas dão o tom certo para cada cena e são lindas. Principalmente nas cenas no bar dos pais de Stella, ela cria uma imersão incrível.
Passamos a admirar também de certa forma esse ambiente boêmio. E ao mesmo tempo, algumas horas nós o desprezamos. O filme se sustenta nesse paradoxo entre o doce e o amargo. Assim como sua própria musa, de temperamento hora angelical e as vezes violento. As melhores cenas do filme para mim são as que Stella passa ao lado de sua “amiga do norte”, Ginneviève. O encontro dessas duas pessoas de histórias semelhantes, mas agora anseios diferentes. E principalmente, esse primeiro momento do filme em que veremos que por maiores que sejam em mente, ainda são meninas.
Stella tem apenas alguns defeitos. O primeiro deles é perder a qualidade conforme vai se aproximando dos momentos em que Stella vai descobrindo seus sentimentos. Há um fato que poderia ter sido bem mais marcante, mas o filme passa quase por cima. Parece que simplesmente depois de uma hora e vinte de metragem, o filme perde o fôlego e acaba quase se entregando nos minutos finais. Mas ainda sim, os momentos finais de Stella voltam a ter certo brilho.
Por fim, o resultado é satisfatório. Stella é um filme que consegue cumprir o seu o objetivo, e é competente nisso. É um filme sobre a evolução de um personagem, ou simplesmente: o amadurecimento de uma menina. E ao final de tudo, uma frase resume a trajetória: “Ela começou lá de baixo, e conseguiu evoluir”.
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