A evolução humana ao longo dos tempos: o tema central de 2001: Uma Odisseia no Espaço, filme do diretor intimista Stanley Kubrick. Esta película é um verdadeiro poema visual de seu grande cineasta. Kubrick não está preocupado com diálogos, diferentemente do que ocorreu com Dr. Strangelove, onde o diretor priorizou a verbalização. 2001 é, deste modo, uma verdadeira experiência visual, e não verbal, já que há apenas um pouco mais de quarenta minutos de diálogos em duas horas e pouco de filme (o primeiro diálogo humano demora 20 minutos para aparecer). O filme tem o dom de atingir o subconsciente de seus apreciadores de um modo poético e filosófico. Uma experiência subjetiva única na história do cinema que faz tal filme ser equiparado à outros tipos de expressão artística, como a música e a pintura. Com efeito, 2001 não é um filme para qualquer um, ressaltando, desde já, que é preciso muita paciência (principalmente pelo seu ritmo lento) e, realmente, ser um cinéfilo fã de Kubrick para apreciar esta maravilha da sétima arte. Palavras de Stanley Kubrick: ‘’... o filme funciona a um nível muito mais próximo da música e da pintura que das palavras impressas, e como é óbvio, um filme oferece a possibilidade de transmitir conceitos complexos e abstrações sem o tradicional apoio nas palavras.’’
Como já dito, o filme narra e evolução humana ao longo dos tempos: desde os primórdios, com nossos ancestrais, até o surgimento de uma nova raça, o bebê-estrela, no espaço.
Kubrick, em uma cena antológica, retrata a conquista da ferramenta pelos macacos, quando ele percebe que é possível utilizar o osso de outro animal como uma arma, e como ele usou-a para ter supremacia sobre o próximo. Através desta grande descoberta (a conquista da ferramenta), foi possibilitado ao grupo de macacos soberano alimentar-se melhor e defender seu território de maneira mais efetiva.
Kubrick nos presenteia, então, com mais uma cena marcante (aliás, acredito que 2001 é o filme que possui mais cenas marcantes para a história do cinema): o momento em que o macaco joga a ferramenta para o alto e, então, em câmera lenta, o osso vai subindo até surgir uma nave espacial, demonstrando, por conseguinte, um fantástico salto evolucional da raça humana sem precedentes. Despontam, a partir deste salto, o baile das naves espaciais ao som de Danúbio Azul de Johann Strauss e nós assistimos a isto tudo emocionados e extasiados. Sublime. Acredito que este é o maior corte já visto no Cinema. Simplesmente genial. Em pouco mais de dez minutos, Stanley Kubrick conseguiu realizar um pequeno resumo de toda a evolução humana em milhões de anos. A trilha sonora (genial) completa de forma antológica esta emocionante cena ao som de ‘’Assim Falou Zaratrusta’’ de Strauss. Fantástico!
Aliás, a fina trilha sonora deste filme cumpre um papel de importante destaque, combinando perfeitamente com as cenas em que são utilizadas. Kubrick utilizava o som para criar uma complexa paisagem auditiva. No prelúdio, assistimos a várias cenas de natureza imponente sem utilização de qualquer espécie de som, evidenciando o vazio na evolução. Após o surgimento do monólito (que aparece mais vezes no filme e tem um papel importante no entendimento da obra), a trilha sonora surge com ‘’Assim Falou Zaratrusta’’ e ‘’Danúbio Azul’’, conforme já dito. O espaço é demonstrado de maneira silenciosa e misteriosa, enquanto no interior da Discovery ouvimos os sons neutralizantes e, de certo modo, confortantes de HAL 9000, o enigmático computador de bordo criado pelo homem. Merece ser lembrada ainda a fantástica cena final do surgimento do bebê-estrela ao som de Richard Strauss.
No espaço, o homem, que era soberano na Terra, é apenas mais um na imensidão do universo. Isto é demonstrado pela falta de controle sobre as suas próprias coisas, como a falta de gravidade que o espaço proporciona. No espaço, o homem precisa reaprender a andar e ir ao banheiro. As ferramentas tornaram uma forma humana e o homem perdeu o controle sobre elas. Percebemos aqui o estágio que a evolução humana atingiu: a falta de controle sobre suas próprias invenções. HAL 9000, o supercomputador, numa marcante cena já demonstrada aqui no blog, tenta apoderar-se da estação espacial Discovery eliminando o homem (fantástica a demonstração do conflito homem x máquina). Que antagonismo perfeito, não?
Ao conseguir deter sua própria invenção, o homem, novamente, salta evolutivamente para o bebê-estrela, em uma cena psicodélica e sem precedentes na história do Cinema. Aliás, a presença do monólito em três momentos no filme, demonstra estes saltos evolutivos, aparecendo sempre em tempos de mudanças para a raça humana. Quando surgiu pela primeira vez nos primórdios, o homem conquistou a ferramenta, deixando ser caça para tornar-se caçador. Quando aparece pela segunda vez na Lua, de outra banda, o homem cria HAL 9000 para lhe ajudar na Missão Júpiter. Após a morte de HAL 9000, sua própria invenção, o monólito surge exatamente antes da transformação do ser humano em bebê-estrela (a nova raça que surge). No prelúdio e no final do filme, uma determinada força exterior (qual a origem do monólito? Deus? Mistério...) desencadeia a subida de um degrau na escala evolutiva. O homem, em nenhum momento, deixou de matar para proteger seu território e sobreviver, seja matando outros macacos com sua ferramenta, seja matando HAL 9000, a sua própria ferramenta. Com efeito, a questão que surge é a seguinte: a evolução para bebê-estrela mudará alguma coisa ou a verdadeira natureza do homem permanecerá igual?
Como se tem por óbvio, tal interpretação realizada aqui é apenas uma forma pessoal de entendimento deste misterioso filme, considerado por muitos como um (se não for o) dos mais complexos da história. Afinal, Kubrick já dizia: "Todos são livres para especular o significado alegórico e filosófico de 2001".
Ganhador, merecidamente, do Oscar de Melhores Efeitos Especiais (o único que Kubrick ganhou), 2001 revolucionou para sempre o Cinema. Desde o seu surgimento em 1968, o filme tem assumido uma certa misticidade e continua intacto com a passagem do tempo. Um filme eterno, um verdadeiro poema visual, uma obra-prima de Kubrick que merece ser assistida por todas as pessoas fascinadas por Cinema. Um verdadeiro culto aos deuses da Sétima Arte!
Esta e outras resenhas podem ser encontradas no: http://this-is-cult-fiction.blogspot.com/
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