A Árvore da Vida, obra-prima máxima do enigmático diretor Terrence Malick, definitivamente, é um filme para poucos. As reações confusas das pessoas que acabam de sair do cinema demonstram isto. Enquanto algumas pessoas dizem tratar-se de um filme horrível e sem nexo, outras o idolatram e o reverenciam como uma fantástica obra-prima. Isto é resultado, sem dúvidas, do cinema de reflexão praticado pelo seu diretor, Terrence Malick, que preza por um estilo espiritual e metafórico, optando por analisar questões filosóficas através de seus filmes sensoriais, fazendo o seu expectador redescobrir o significado do amor e da vida. O cinema praticado por Malick é raro nos dias de hoje – não se veem mais Kubrick’s por aí, obviamente – um verdadeiro exemplar de um cinema reflexivo que não está preocupado com agitadas cenas de ação, grandes bilheterias e verborragia, mas, sim, preocupado em tocar a alma de seus expectadores através de uma abordagem mais metafísica e panteísta. Na realidade, A Árvore da Vida não deveria nem ser identificado como um filme, e, sim, um verdadeiro tratado filosófico sobre Deus, o universo e a vida, devido a alta densidade com que trata os referidos temas. Palmas para Malick.
Recheado de significados sutis e alegóricos e esteticamente perfeito, A Árvore da Vida é uma obra singular que debate - de forma não linear e tradicional - a existência humana diante de toda a grandiosidade da vida, caindo, até mesmo, no onírico, através do retrato de uma família texana, evidenciando a relação entre pais e filhos e a busca pelo amor e pelo perdão de Deus.
A sinopse do filme, por si só, já é misteriosa: ‘’Conta a história que aproxima o foco na relação entre pai e filho de uma família comum, e expande a ótica desta rica relação, ao longo dos séculos, desde o Big Bang até o fim dos tempos, em uma fabulosa viagem pela história da vida e seus mistérios, que culmina na busca pelo amor altruísta e o perdão.’’ Abstrato e misterioso, o polêmico filme que causou estranheza nos críticos em Cannes, retrata os mistérios da vida e da criação do universo, desde o Big-Bang até a década de 50, onde uma família texana sofre de problemas que acometem toda a humanidade. A película não consiste numa história tradicional, e, sim, revestida de uma característica tarantinesca: a não linearidade do roteiro. Dessarte, não há lógica narrativa e cronológica. Mas isto não consiste num defeito, longe disto. Assim como nossas memórias são dispersas e confusas, o andamento do filme é exatamente igual: são as memórias de Jack, o filho mais velho do casal O’Brien, que são retratadas ao longo das mais de duras horas de duração do filme.
Terrence Malick - professor de Filosofia antes de seguir a carreira de diretor - expõe questões filosóficas tão densas no filme, a ponto de ele ser equiparado a filósofos da Grécia Antiga. Os pensamentos que atormentam Jack adulto, interpretado por Sean Penn, nos remetem à sua infância, na década de 50, no âmbito das relações instáveis da família texana O’Brien. A instabilidade apenas aumenta com o processo de amadurecimento de Jack sob o forte impacto da morte de seu irmão mais novo R.L.. Diferenciando Graça e Natureza no prelúdio do filme, chegamos à ilação de que seu pai – interpretado pro Brad Pitt - assemelha-se à um verdadeiro animal: rude, rígido e intolerante, contendo, claramente, características da Natureza. Por outro lado, sua mãe possui as características peculiares da Graça: amável, carinhosa e afetuosa em relação aos seus filhos. Em crescimento, Jack é tomado por tempestuosos conflitos internos (Graça versus Natureza); ao mesmo tempo em que ele desaprova as atitudes do pai em relação a ele e prefere a amabilidade de sua mãe, descobre-se, no fundo, que ele é ‘’tão mau’’ quanto seu pai (quando este desabafa com Jack após ter perdido o emprego). Questionando a própria fé e permeado de dúvidas a respeito de Deus, Jack é tomado por uma grande fúria por ser obrigado a ter fé em um Deus que não responde aos seus anseios. Malick, deste modo, expõe o quão ínfima é a humanidade perante a grandiosidade do mundo e, especialmente, da vida, ao retratar os questionamentos de Jack em paralelo às sequências poéticas e abstratas da criação da vida. Como conseguimos acreditar que possuímos algum tipo de importância dentro do mundo diante de toda a sua grandiosidade (crive-se: exposta de maneira sublime por Malick)? Com efeito, o diretor procura, a todo tempo, pela nossa razão de ser e existir neste imenso universo.
A psicodélica e surreal cena que retrata a criação da vida (realizada sob a coordenação de Douglas Trumbull de 2001: Uma Odisseia no Espaço), apresentando, desde o prelúdio de tudo, com o Big-Bang e a origem vital em nosso planeta, passando, até mesmo, pelo surgimento dos dinossauros, e chegando até nossos dias é belíssima. Tal sequência imediatamente nos remete a 2001: Uma Odisseia no Espaço, seja pela abordagem feita através da evolução da vida, seja pelos longos minutos sem a presença de qualquer tipo de diálogo. Aliás, assim como 2001, Á Árvore da Vida é um daqueles verdadeiros poemas visuais, que não prezam a verbalização, contando com muito pouco tempo de diálogos. Malick realiza uma verdadeira celebração da natureza através da exposição de imagens absurdamente belas e uma fotografia magistral. Aliás, o diretor de fotografia mexicano Emmanuel Lubezki realiza um trabalho sublime neste filme, tendo como resultado uma das fotografias mais belas da história do Cinema.
Acredito que a verdadeira mensagem desta misteriosa obra é nos fazer perceber a nossa insignificância diante da imensidão do universo, partindo, de início, das instáveis relações familiares dos O’Brien para, assim, realizar a reconstrução do universo e da vida. O deprimido Jack adulto não se tornou esta pessoa apenas pela morte de seu irmão (foi suicídio? Não tem relevância) ou, então, pela rígida educação que sofreu de seu pai austero. O que realmente importa é o que já foi exposto: Jack, assim como todos nós, não é, nada mais, nada menos, do que um ser humano insignificante em meio à imensidão do universo.
A mística obra de Terrence Malick é sublime em vários aspectos, desde suas belas sequências poéticas e sua fotografia deslumbrante, até a fantástica trilha sonora do francês Alexandre Desplat e as poderosas interpretações de seus atores. Um filme (seria um filme mesmo? Ou talvez a mão de Deus interferindo diretamente em nosso planeta?) recomendado a todos que apreciam a arte do cinema reflexivo. Um verdadeiro monumento à vida e a Sétima Arte. Sublime!
Esta e outras resenhas podem ser encontradas no: http://this-is-cult-fiction.blogspot.com/
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