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Críticas

Cineplayers

Apesar de parecer um exercício fútil de montagem, filme agrada pela tensão e boas cenas de ação.

6,0

Ponto de Vista é a síntese do cinemão norte-americano para as massas: apesar de tentar apresentar pinta de inteligente, não passa de um produto para alienar consumidores sedentos por uma diversão passageira e descompromissada. Seu conteúdo é praticamente nulo, mas é tão bem enfeitado e intenso (como entretenimento) que o resultado final é, no mínimo, curioso. É o tipo de filme que pode fazer os amantes de cinema de verdade sentirem-se culpados ao notarem que gostaram – de uma certa forma – do que acabaram de assistir e, enquanto o lado racional entende que o roteiro é manipulador e absolutamente inverossímil, o lado emocional sente-se extasiado pelas engenhosas cenas de ação, dignas dos bons thrillers que Hollywood produziu nos últimos anos.

O filme pode irritar o público que possui tendências anti-americanas: passa-se na Europa, mostra um presidente norte-americano idealista, o mocinho é um cidadão comum que na hora do aperto vira o herói da história e os bandidos têm relações com o Terceiro Mundo. O jeito é ignorar a falta de realismo do roteiro do estreiante Barry Levy e tentar – pelo menos tentar – curtir tudo como uma sessão besteirol. Leve tudo na gargalhada que o resultado pode terminar sendo bastante agradável. Isso porque, após contar e recontar a mesma história várias vezes sob diversos pontos de vista (daí vem o título), no ato final tudo se encaixa e deslancha, e daí para frente é segurar-se na poltrona, colocar o volume lá no alto (ou esperar que a sala de cinema tenha um bom sistema de som) e aproveitar a montanha-russa.

O chamariz do trabalho é sua montagem que, a cada nova revisão dos acontecimentos, vai mostrando, através de ângulos novos, informações que dão uma dimensão cada vez maior à história. No final tem-se um plano elaboradíssimo (e que só funcionaria mesmo no cinema) que realmente prende a atenção do espectador – desde que ele aceite, como foi comentado, a manipulação desenfreada proposta pelo filme. Mas não há porque negar que a idéia de contar a mesma história de diferentes formas sempre adicionando elementos novos a cada versão, se não é lá muito original, pelo menos foi bem executada aqui: o diretor Pete Travis (também novato no cinema), criou um filme de ritmo muito bom. Sobre a estrutura da narrativa, Rashomon é o filme mais óbvio que me vem à cabeça, embora seja bastante diferente – lá são três versões diferentes da mesma história, aqui é sempre a mesma versão, mas com acontecimentos novos sendo mostrados a cada nova versão.

O elenco é muito forte, tanto que se dá ao luxo de colocar uma atriz como Sigourney Weaver como mera coadjuvante no primeiro ato do filme e fazê-la desaparecer para sempre depois disso. Dennis Quaid continua firme em sua carreira (para felicidade de seus fãs) e leva um papel extremamente físico e ágil com bastante carisma. Já Forest Whitaker, no pouco tempo que tem em tela, consegue representar pelo menos um grande momento: o telefonema que recebe de sua família no final do filme (sim, a cena é manipulativa ao extremo, mas a expressão de felicidade e emoção no rosto do ator foi magnífica). Tecnicamente o destaque vai mesmo para a montagem (imagine o trabalho para filmar a mesma cena de dezenas de ângulos diferentes) e a trilha sonora, que, quase despercebidamente, ajuda a criar tensão nos momentos apropriados.

Ponto de Vista só não se sai melhor por ser um exercício quase que puramente técnico e, ignorando cenas isoladas (como o momento com o ator Forest Whitaker citado acima), sem emoção humana alguma. O diretor Pete Travis conseguiu estreiar no cinema de massa com bastante competência, talvez seja um nome do gênero que venha a ter bastante sucesso no futuro (isso é apenas um palpite grosseiro, até porque não há nenhum trabalho seu programado para o futuro no momento). Em uma época em que é cada vez mais difícil impressionar platéias já acostumadas a verem quase “tudo” em termos de ação, há alguns momentos genuinamente excitantes no filme, e se isso não é o suficiente para fazê-lo ser um grande trabalho, pelo menos merece uma recomendação para quem gosta desse tipo de material.

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