Muito se fala que o Cinema nacional não produz filmes de gênero para o grande público (no circuito independente a história é outra). Em parte, até concordo, visto que por alguns anos nos acostumamos com dois tipos de produções: aquela que retrata o crime e a violência no país, ou as comédias pastelões que encontraram em Leandro Hassum seu maior representante, infelizmente. Felizmente, porém, há filmes como este "O Lobo Atrás da Porta", ou mesmo o recente lançamento "Entre Abelhas", estrelado por Fábio Porchat, que remam contra a maré e se arriscam a sair desse lugar comum.
Na trama, quando Sylvia (Fabiula Nascimento) vai à delegacia dar queixa do sequestro de sua filha na creche, Bernardo (Milhem Cortaz) - seu marido - é chamado para depor. Durante o depoimento, acaba revelando que possui um relacionamento extra-conjugal, e sua amante, Rosa (Leandra Leal) acaba se tornando a principal suspeita do crime. A pergunta é: as aparências revelam o que realmente aconteceu nesse caso?
Com movimentos de câmera instigantes e uma montagem que foge do padrão nacional, Fernando Coimbra constrói um thriller de suspense que prende o espectador a todo momento, usando os enquadramentos à favor da narrativa e sabendo utilizar muito bem o recurso de flashbacks. O diretor, em seu longa-metragem de estreia, mostra-se conhecedor de técnica cinematográfica, entregando um filme coeso, dinâmico e arrojado, somado ainda a uma trilha sonora apropriada, que dita o sentimento de cada cena.
O roteiro, também escrito por Coimbra, evita apostar em soluções fáceis para entregar aquilo que o espectador espera, e esse talvez seja seu grande trunfo. Não espere que "O Lobo Atrás da Porta" entregue soluções convencionais para os enigmas que a trama expõe, pelo contrário, espere ser surpreendido pelo que está por vir. E qualquer coisa que eu possa dizer além disso pode ser considerado spoiler, então paro por aqui.
No elenco, destaca-se a presença de Leandra Leal (Mato Sem Cachorro), que entrega uma personagem cheia de nuances, livre de qualquer esteriótipo, que certamente mexe com a percepção do espectador com relação à suas atitudes em cena. Milhem Cortaz (Tropa de Elite 2), por sua vez, soa deveras caricato em determinados momentos, o que não torna seu trabalho aqui tão memorável como em outras oportunidades. A surpresa certamente é Thalita Carauta (S.O.S. Mulheres ao Mar), que surge como uma espécie de alívio cômico da trama e cai como uma luva para não mergulhar o espectador na obscuridade que a narrativa propõe.
Por tudo que entrega em pouco menos de duas horas de duração, "O Lobo Atrás da Porta" se mostra um suspiro artístico do cinema nacional, que atualmente se vê ávido por grandes bilheterias e esquece aquilo que faz do audiovisual fascinante, a capacidade de mexer com nossa emoção e percepção de maneira única. Não que as comédias pastelões ou os filmes que exaltam a violência no país não consigam fazer isso, alguns conseguem, mas é preciso diversidade em nossas salas de cinema, e esse é um belo exemplar.
Crítica originalmente publicada no meu blog pessoal:
http://cinefiloemserie.blogspot.com.br/2015/05/critica-o-lobo-atras-da-porta.html
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