Ao assistir o Homem de Mármore, uma coisa ficou um tanta clara para mim: Andrew Wajda não é só um dos grandes diretores do cinema polonês (que tanto já entregaram ao cinema como um todo), ele é o Glauber Rocha polonês, ou o Costa Gravas nascido em Suwalki.
Este exemplar é um daqueles feitos durante a famosa Cortina de Ferro na Europa, que dividia o velho continente em Ocidente Capitalista e Oriente Comunista/Socialista (inclusive, em uma propaganda socialista presente no filme, o governo polonês chama a arte e os costumes ocidentais capitalistas como "degenerados e desumanos).
É de grande autoria que Wajda entrega essa obra, com uma trilha-sonora um tanto mesclada com gêneros, em uma espécie de canto polonês eletrônico. É de ressaltar a sua coragem ao produzi-la. O Homem de Ferro tem ares de Cidadão Kane, uma das grandes obras do cinema norte-americano, em que passava de boca em boca para descobrir mais sobre o passado de um antigo jornalista milionário com um passado misterioso. A diferença aqui é que o entrevistador é protagonista junto com o personagem mítico. Ou seja, a jovem diretora Agnieszka (interpretada pela famosa atriz polonesa Krystyna Janda) quer ir contra tudo e todos ao fazer um documentário sério (toda vez que alguém no filme se refere ao documentário como sério, dá para se ter uma ideia do controle de mídia que se tinha naquela época sobre o passado da Polônia) sobre um antigo líder dos trabalhadores, um heroi nacional esquecido, o sempre presente mas também misterioso Mateusz Birkut.
Mateusz Birkut nunca aparece em cena no presente (Cracóvia no ano de 1976), sua esposa, seu filho e seus amigos ou conhecidos sim, mas ele, nunca, jamais. Mas está sempre presente, como Charles Foster Kane estava na grandiosa obra de Orson Welles. Sabemos tudo a respeito do jovem, seja pelo que é contado pelos seus próximos ou seja pelo que a imagem (ainda que a mesma possa ser manipulada) conta.
O Homem de Mármore é grandioso como cinema, é cheio de duplo-sentido, de metalinguagem: ele mostra o que uma jovem diretora é capaz de fazer para buscar a verdade, ou até mesmo algum relativo sucesso; mostra como o passado do país era tão injusto quanto o agora, e que apesar desse passado ter formado as bases de um país relativamente desenvolvido, também formou seres embrutecidos, corruptos e corruptores; de como é fácil construir e derrubar herois, quando eles se tornam necessários para uma população, e de quando eles precisam ser esquecidos. Enfim, Wajda atira para todos os lados e acerta todos os alvos. Neste filme com mais de duas horas e que ainda teria uma espécie de continuação: O Homem de Ferro de 1981, vencedor da Palma de Ouro em Cannes.
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