É muito comum que histórias de sucesso estejam associadas não apenas às virtudes do indivíduo, mas também à sorte. O diretor de O Galante Mr. Deeds, Frank Capra (1897-1991), não escapa à essa fórmula. Nascido no sul da Itália, numa família em que todos eram analfabetos, e cujo pai plantava laranja e limão para sustentá-la até se mudarem para os Estados Unidos, bastaram apenas 12 anos desde que lançou seu primeiro longa, até que Capra, naturalizado americano em 1920, ganhasse o seu primeiro Oscar (somente como melhor diretor foram três ao longo da carreira). A sua genialidade, no entanto, poderia nunca ter ido parar nas telas do cinema. Formado em Engenharia Química em 1918, no Troop Polytechnic Institute, ele não conseguia emprego em virtude da guerra e, até lançar seu primeiro filme, sobrevivia vendendo livros, fotos e outras quinquilharias.
Falando em sorte, o protagonista de O Galante Mr. Deeds, longa lançado em 1936, tirou uma grande. Herdeiro de uma fortuna de 20 milhões de dólares do seu tio, do qual mal guardava recordações, Longfellow Deeds (Gary Cooper) é alçado a uma realidade completamente distinta da sua, vivida na pequena cidade de Mandrake Falls, onde a ética do dinheiro e da cobiça ainda não classificou os indivíduos pelo valor da conta bancária. Ele deve ir imediatamente a Nova York, acompanhado de funcionários do falecido tio, para assumir o patrimônio.
Em Nova York, Deeds vive um choque de realidade. Ladeado por bajuladores sempre prontos a lhe tirar até o último centavo, ele desconfia das intenções de todos à sua volta, à exceção de Louise 'Babe' Bennett (Jean Arthur), uma astuta jornalista que, se passando por frágil mocinha do interior, arranca seguidos furos de reportagem acerca do novo milionário novaiorquino. Sem perceber as reais intenções de Bennett, Deeds acaba se apaixonando pela jornalista, que, por sua vez, notando inexistir qualquer traço de maldade no comportamento de Deeds, se vê envolvida pelo rapaz, comovendo-se diante do mal que causou a ele. O filme encontra no arrependimento e na superação os alicerces para o seu desfecho.
Capra foi um diretor criticado pela forte carga de patriotismo, sentimentalismo, moralismo, conformismo e por sua apologia ao amor eterno. Visto pelos olhos do público do século XXI, cada vez mais integrado entre si através de uma rede invisível que conecta toda a humanidade de uma forma impensada para aquela época, um público cada vez mais padronizado e subordinado às posses materiais, Longfellows Deeds será habitualmente incompreendido e, provavelmente, até irritante.
É impensável nos depararmos com sujeito tão idealizados e puros como o protagonista, mesmo para a época do filme. Os demais personagens, em sua maioria, ambiciosos e covardes, no entanto, são tão comuns e habituais à nossa realidade que não nos causa estranhamento. É esse contraste entre o indivíduo puro e bom e o indivíduo comum, ganancioso, que o torna tão intenso e sensível. Sua mensagem é fortemente positiva, ignorando uma série de variáveis que agem sobre a subjetividade humana e que fazem com que o indivíduo tome decisões primeiro pensando em si e depois nos demais.
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