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Críticas

Cineplayers

Recomeçar é preciso.

7,0

Duas tragédias são catalisadoras de O Que Traz Boas Novas: o suicídio de uma professora primária em plena sala de aula, durante um intervalo (visualmente apenas sugerido no filme) e o assassinato por motivos políticos de uma família argelina (mencionado nos diálogos) são responsáveis por juntar os alunos de uma escola canadense e o professor e imigrante Bachir Lazhar. A empatia mútua, apesar de conflituosa, que surge entre alunos e professor, é abordada por Farladeau de forma delicada porém impactante: são indivíduos com o estado emocional em cacos, tentando se recuperar, precisando admitiar certas mentiras e situações pouco convenientes que ninguém gostaria de enfrentar.

Nome em ascensão no Canadá, Farladeau é um diretor que cada vez mais refinante em sua proposta de falar sobre tragédias e angústias de forma leve, evitando os excessos normalmente utilizados nesse tipo de história; os conflitos são sempre palpáveis, mas seus personagens sempre tentam reagir às realidades que lhes são impostas, nem sempre da maneira mais sensata e racional. Isso era verdade tanto em Não Sou Eu, Eu Juro! (C'est Pas Moi, Je Le Jure!, 2008) quanto aqui, onde ironicamente um protagonista nem um pouco preparado para lidar com crianças se chama Bachiar Lazhar, “o que traz boas novas” em sua língua. O nome, da forma que Farladeau constrói, é menos uma predestinação e mais uma profissão. Não importa tanto os dons, mas o esforço constante em educar jovens invídiuos, fazer com que eles falem sobre seus problemas, passar por cima da política pedagógica tradicional, envolvendo-se emocionalmente com seus alunos.

Suas existências tempestuosas são o mote principal do filme. Por motivos diversos, seus personagens se identificam e tornam-se cúmplices através de situações tragicômicas que enfocam desde o ponto mais baixo até a reestruturação. Isso não depende apenas de admissão, mas de ações; da criação de uma consciência, de extravar seus problemas, com o filme construindo isso ao longo da projeção ao invés de preparar surpresas e desenlaces. Ser criança é muito difícil. Lidar com a morte, igualmente. Ainda que não seja essencialmente um grande filme, O Que Traz Boas Novas não arrisca em sua intenção original e sempre mantem-se fiel. A abordagem leve não aposta seu lado cômico em gags ou piadas, mas antes em situações inusitadas, em pequenas ironias, dos diálogos ternos que dão conta tanto de exprimir a dor quanto de buscar comunicação.

Esquemático em seu desenvolvimento, o grande mérito de O Que Traz Boas Novas é, mesmo que esteja fazendo um filme que busque valores como a beleza e a ternura humanas, jamais negar o lado feio, os defeitos de seus personagens, as tragédias horríveis que nos acometem, os estados emocionais abalados, a vontade mas dificuldade de se comunicar. Farladeau não tem medo de tratar desses assuntos nem de fugir de um didatismo melodramático óbvio para apostar no que, para ele, é belo: o ato de resisteñcia humano contra uam realidade que insiste em decepcioná-lo o tempo todo.

O universo composto para o filme é tipicamente contemporâneo: passado no Canadá, país onde se fala tanto inglês e francês, onde se é tanto uma democracia quanto uma monarquia. Esse paradoxo da formação da civilização canadense, na América, o continente onde grande parte das culturas interage e coexiste que move e compõe a diegese de O Que Traz Boas Novas, um filme típico do nosso século – entra em desacordo com a narração tradicional que insiste em ir apenas nos pontos fortes da história; Farladeau valoriza os momentos introspectivos, se preocupa com o mundo interno de seus personagens, insite para que eles sejam sempre mais importantes que conflitos externos.

Os personagens do filme de Farladeau vagam por um país frio e caloroso ao mesmo tempo em busca da solução para seus conflitos à primeira vista impossíveis de se resolver – mas com o desenrolar da história, por consciência e admissão, podem dar o primeiro passo. Sem final feliz óbvio, apenas uma abertura de porta para algo que cabe aqueles indivíduos responder.

Comentários (1)

Anderson de Souza | sexta-feira, 31 de Maio de 2013 - 19:44

Vi esses dias...achei que o diretor fez mto melhor em Não Sou Eu, Eu Juro!

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