Mesmo dando um escorregão ou outro Steven Spielberg conta com uma carreira inegavelmente invejável e por isso é, merecidamente, lembrado por apreciadores da sétima arte (e até mesmo por espectadores mais casuais) como um dos maiores diretores do cinema. Spielberg tem em seu currículo obras significativas e magníficas como Tubarão, Jurassic Park, A Lista de Schindler, E.T. - O Extraterrestre (o meu favorito) e a Quadrilogia Indiana Jones. É uma pena, portanto, que os trabalhos mais recentes do cineasta não cheguem nem perto da qualidade de seus primeiros filmes. Com exceção de As Aventuras de Tintim, os outros três longas do diretor representam uma frustração: Mesmo gostando de Guerra dos Mundos tenho que reconhecer os problemas de seu ato final (especialmente na conclusão totalmente inverossímil); Já Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal conseguia resgatar o clima de aventura da trilogia original, mas perdia muitos pontos pelo live-action exagerado em praticamente todas as sequências de ação; E Cavalo de Guerra mostrou ser vazio e irritante, ao mesmo tempo que abusava de cenas que estavam ali apenas para fazer o espectador derramar lágrimas da maneira mais forçada possível.
É natural, portanto, que antes de ser visto Lincoln dava a impressão que o cineasta estivesse se repetindo e lançando outro Cavalo de Guerra: A premissa do filme e sua duração davam oportunidade para que Spielberg pudesse fazer mais um melodrama arrastado e entediante, repleto de cenas desnecessárias e que manipulasse as emoções do espectador da forma mais cafajeste possível. Felizmente, Lincoln é exatamente o oposto do que se espera: Os diálogos são inspirados, o diretor conseguiu conter desviar do drama e dar mais atenção à política e assuntos históricos, além de (isso sim é uma surpresa imensa) dar um ritmo menos torturante. E mesmo que não seja, nem de longe, um dos melhores filmes do ano, o favoritismo de Lincoln entre os candidatos de premiações é algo totalmente justificável, afinal temos aqui três ícones americanos reunidos em um único filme: Além de Steven Spielberg, temos Abraham Lincoln e Daniel Day-Lewis.
Abordando o momento em que Lincoln tentava que a 13º Emenda fosse aprovada, terminando não apenas com a Guerra Civil Americana como também a escravidão nos Estados Unidos, Lincoln é uma verdadeira aula de história que não necessita de longuíssimas narrações em off para introduzir o público não americano na trama, além disso o roteiro de Tony Kushner também sabe encaixar os diálogos uns nos outros fazendo com que o filme flua melhor – algo importantíssimo, já que a fita se sustenta basicamente em cima das conversas entre os personagens. O filme ainda conta com uma belíssima fotografia e uma sutil e eficiente direção de arte, além de uma trilha sonora extremamente mais contida do que nos outros longas recentes do diretor.
É uma pena, portanto, que Spielberg construa a imagem do presidente americano de maneira rasa e pouco explorada, não apostando nenhum segundo sequer na complexidade de Abraham Lincoln insistindo em trata-lo como e mostra-lo como uma figura que deve ser venerada pela plateia. Felizmente Daniel Day-Lewis contorna esse problema na construção de seu personagem com uma atuação absolutamente espetacular que enche o personagem título de força e inteligência, apenas para expor sua fragilidade emocional minutos depois. É exatamente por isso que a melhor cena de todo o filme não se concentra em discussão democráticas e antiescravista, mas sim na relação entre o protagonista e sua esposa, no momento em que Sally Field pede para que o marido não deixe seu filho ir para lutar na guerra. Aliás, mesmo que Field esteja bem (mas consegue mostrar seu potencial em duas ou três cenas, já que a maioria de seus momentos em tela poderiam ser facilmente cortados), o elenco de apoio da fita é um tanto decepcionante: Joseph Gordon-Levitt tem seu talento (já comprovado) desperdiçado, e Tommy Lee Jones que pouco impressiona, mas também é frustrante já que sua atuação está sendo tão exaltada pela crítica.
Pecando na conclusão que tenta ser um pouco menos melodramática, mas que acaba sendo o momento mais meloso e anti-climático de toda a produção, Lincoln é uma imensa surpresa para quem – como eu – esperava mais um filme maçante, com ritmo insuportável e demasiadamente longo. Ok, tem uma quantidade imensa de defeitos, mas ao colocar tudo na balança o resultado é muito melhor do que o esperado.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário