Para Stephen King, escritor do conto no qual o filme foi baseado, Conta Comigo (ou “O Corpo”, no original) não é mais que um resgate de suas memórias de garoto no interior americano na década 50, época na qual a narrativa se situa; para mim, mero espectador, que nasci várias décadas depois, é o mais próximo de uma viagem de volta ao passado, às tardes na casa da minha avó, em minha antiga rua, com queridos amigos, parceiros de aventuras e colegas de brincadeiras, alguns dos quais, como King ou mesmo Gordie, protagonista dessa história e seu alterego, já não tenho contato há vários anos.
Nostalgia é algo difícil de racionalizar sobre, e é estranho e ao mesmo tempo admirável como um filme como Conta Comigo une tantas gerações, do material original com King recobrando parte de sua vida enquanto moleque junto dos seus colegas até aqueles que acompanharam as reprises vespertinas na TV aberta principalmente na década de noventa (meu caso foi numa sessão perdida do Corujão da Globo, já na década de 2000), em torno de um mesmo tempo: a infância. Não há nada mais inocente e facilmente identificável, tenha-se hoje 20, 30 ou sei lá 70 anos, que a jornada de quatro garotos que partem em uma aventura pelo bel prazer de descobrir, de se aventurar e viver coisas plenamente possíveis se você for criança e tiver amigos ao seu lado.
O tratado sobre amizade ainda no conto de King, que ganhou no título dessa adaptação para o cinema um reforço, é mais do que tudo um tributo à infância, ao período onde qualquer andança que ultrapasse os limites da vizinhança já é a maior das jornadas, quando o desejo de descobrir, como os moleques aqui estão ávidos a verem o corpo de um garoto próximo a um trilho de trem, custe o que custar, justamente porque as consequências não são exatamente bem calculadas quando se é um menino e cada passo fora da zona conhecida já é a possibilidade de um mundo novo. Os meninos de Conta Comigo, dessa forma, não são muito diferentes de qualquer outros de qualquer outro lugar; são uma espécie de alquimia de características reconhecíveis em cada um, na verdade – todos que se identificam com o filme foram ou tiveram amigos como aqueles, à sua maneira.
Partindo dessas figuras facilmente identificáveis, Conta Comigo, que nos oferece o ponto de vista de Gordie, o único deles que se deu bem na vida, realizou o sonho de ser escritor e é agora o narrador-protagonista de suas memórias de criança, transforma os três amigos em entidades, que funcionam como símbolos de um tempo, entalhados por boas recordações, como aquele filme que você não vê há anos e que permanece maravilhoso na sua memória, aquela comida que você provou há anos e que na sua cabeça mantém-se maravilhosa ou mesmo aquele seu saudoso amigo que não vê há bastante tempo com o qual teve momentos fantásticos e talvez ache que ainda possam se dar bem.
Mas, como informa o narrador ao final, não há amigos como aqueles de quando você tinha 12 anos de idade, quando a inocência e o espírito de aventura eram pulsantes. Infelizmente, crescer é inevitável, e para isso, como fez Gordie, é necessário guardar todas aquelas aventuras pueris, as brincadeiras com a garotada, e muitos daqueles amigos, que eram as pessoas mais legais do mundo em algum lugar da memória – que eventualmente torno a recobrar sempre que resolvo assistir Conta Comigo mais uma vez.
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