"Você tem o coração de um líder. E a alma de um dragão."
Por mais que muitos ainda a diminuam diante das concorrentes Disney e Pixar, a DreamWorks Animation possui, desde sua estreia com o excelente Formiguinhaz, sua parcela de filmes interessantes e ambiciosos, seja tecnologicamente – o próprio Formiguinhaz foi pioneiro em recriar em CGI as propriedades da água -, seja tematicamente – o estúdio parece sempre discutir um tema recorrente em suas produções, o (não)pertencimento do indivíduo a um meio e a luta por tornar-se aceito por si mesmo. Assim, por mais que o estúdio frequentemente lance continuações que nada acrescentam às suas produções além de cifras monetárias, não é difícil aguardar com certa ansiedade um filme como esse Como Treinar o Seu Dragão 2, ainda mais se, como eu, você for fã do primeiro.
Assim, foi com medo de assistir um mero repeteco do filme original que assisti os primeiros minutos de projeção, quando o filme parecia trair o desfecho da obra anterior ao novamente trazer Soluço (voz de Jay Baruchel) vivenciando a sensação de estar perdido em seu meio ao ver-se confrontado pelo pai, o rei Stoico (Gerard Butler), sobre a possibilidade de assumir o trono do reino de Berk, agora um local pacífico onde vikings e dragões convivem em harmonia. Porém, bastou ver o desenrolar da trama para ser desarmado por uma narrativa com identidade própria, que logo colocava os protagonistas em uma missão para encontrar o perigoso Drago (Djimon Hounsou), um misterioso homem que ameaça a paz entre homens e dragões ao reunir um exército dos animais para atacar Berk.
Iniciando com uma câmera que viaja pelo reino dos vikings acompanhada pela narração em off do protagonista que remete ao primeiro filme, Como Treinar o Seu Dragão 2 logo nos brinda com o aguardado voo ao lado de Soluço e seu adorável dragão, Banguela – cada vez com mais características de uma fusão de gato e cachorro -, resgatando o elo com aqueles personagens, agora cinco anos mais velhos. E ainda que o dilema do jovem viking seja uma reciclagem do filme anterior, não demora para que o filme justifique-o, promovendo um reencontro entre o personagem e sua mãe (Cate Blanchett), que era dada como morta e passou anos vivendo em meio aos dragões. É a partir desse encontro que Soluço passa a entender os ensinamentos de seu pai sobre ser um líder, com destaque para a frase que diz que “um verdadeiro líder protege os seus”.
É a partir desse momento que o filme se entrega à um tom épico que em nada deixa a dever para a batalha de Gondor vista em O Senhor dos Anéis – O Retorno do Rei, trazendo cenas de ação recheadas de personagens humanos e espécies conhecidas e novas de dragões – inclusive criaturas que ao invés de fogo soltam gelo pela boca -, culminando num belo travelling que passeia pelo violento campo de batalha e deixa claro o sentido de urgência que a narrativa passa a ostentar. E quando essa urgência faz uma vitima querida e os personagens se colocam lado a lado em uma chuva de flechas de fogo que homenageia postumamente aquela figura se torna difícil conter a emoção. Mas não se engane. Como Treinar o Seu Dragão 2 não se entrega à ação descerebrada. A batalha aqui é sempre acompanhada de motivações, mesmo para seu vilão, que exibe no corpo mutilado – e é interessante a coragem que o filme demonstra ao exibir os ferimentos de seus personagens, algo que já ficava claro ao trazer o memorável plano do primeiro filme que trazia Banguela apoiando um Soluço que ainda aprendia a caminhar sem uma perna – o medo de que os dragões invistam em uma guerra definitiva contra a humanidade e para ele a única forma de conter aquelas criaturas é dominando-as.
Equilibrando com eficiência o drama na narrativa com a comédia, normalmente proveniente dos hormônios dos agora jovens adultos personagens – Soluço e a bela Astrid (America Ferrera) agora são um casal inseparável; já Perna de Peixe (Christopher Mintz-Plasse) e Melequento (Jonah Hill) disputam a atenção de Cabeça Quente (Kristen Wiig), despertando o nojo do irmão gêmeo da garota, Cabeça Dura (T.J.Miller) –, Como Treinar o Seu Dragão 2 pode até ser levemente inferior ao seu antecessor, mas ao acompanhar os créditos finais, acompanhados das melodias inspiradas em canções nórdicas, e relembrar de seus carismáticos personagens, é difícil conter o sorriso de satisfação no rosto.
O 1º é excelente...
Sua crítica só me fez criar expectativas boas para esse...
(SPOILER) A dreamworks teve muita coragem, pelo menos na minha opinião, na cena em que o banguela mata o Stoico. Pegar o "queridinho" do publico e coloca-lo matando alguém,mesmo que "possuído" é algo que nunca vi na Pixar e Disney. Não sei como os pequenos reagiram a cena ...
Melhor do que eu esperava , não é uma mera continuação caça-níquel, mas ficou um pouco abaixo do primeiro filme
MUITOS SPOILERS:
Pedro (belo nome, a propósito), acho a DreamWorks injustiçada com relação à DIsney e a Pixar. Apesar de amar os dois estúdios e gostar de apenas algumas produções da "rival", não pra dizer que a DreamWorks não é corajosa, eles filmaram um massacre violento em Formiguinhaz digno de O Resgate do Soldado Ryan; no primeiro Como Treinar o Seu Dragão eles discutem com talento e sutiliza a questão da deficiência física, culminando naquela cena linda do Banguela ajudando o Soluço a andar; e nessa continuação, além da bela cena que você citou, tem também toda a questão do Drago mutilado, por conta dos dragões e etc...
Admito que não reparei na reação dos pequenos, mas acho que isso talvez tenha chocado até mais os pais que acompanhavam eles, por não esperar algo assim em uma animação - "coisa de criança" pra muitos...
Ah, sobre o que falou, acho que a Disney e a Pixar possuem muitas cenas chocantes tbm, como os minutos iniciais de Up ou a morte do Mufasa.