Podem dizer que Bertolucci foi corajoso em abordar um tema tão polêmico, que este filme rompeu e quebrou tabus no mundo cinematográfico, que estabeleceu novos mecanismos na concepção de produção, que influenciou diversos outros profissionais, tudo isto e muito mais, só que ao assistir O Último Tango em Paris infelizmente não pude compreender aonde se faz tantas qualidades, tendo em vista que me pareceu uma obra extremamente vazia em termos de história e conteúdo, restando pouquíssimos bons momentos. Marlon Brando é a grande estrela do filme (e em minha opinião o maior ator de todos os tempos), onde o mesmo garante passagens realmente inspiradoras, mas muito pouco para segurar e carregar um filme inteiro nas costas, papel duro até mesmo para alguém de seu calibre. Uma premissa interessante e de muitas possibilidades fora jogada pela janela por Bertolucci quando este passa a visar apenas passagens desconexas e sem fundamento, ao invés de aprofundar em seus personagens centrais.
Brando desempenha um ótimo trabalho como de costume, e os melhores momentos são protagonizados pelo mesmo, como o fantástico monólogo ao lado do caixão de sua ex-esposa, momento este que é possível enxergar todo o drama e a tristeza em seu olhar e demais expressões, geniais como sempre. É neste instante, em que compreendemos mais a fundo a personalidade confusa e perdida do personagem, entregue ao marasmo de uma vida que parece ter perdido o sentido há muito tempo, encontrando seu ápice com o suicídio de sua mulher. Paul não é um homem fácil de lidar, possuidor de uma personalidade bastante complexa, que encontra no sexo uma fuga da realidade dura e cruel que se encontra. Aqui entra o papel fundamental de Jane, sofredora idêntica, que embarca de cabeça neste universo paralelo e dúbio, passado em um quarto de hotel vazio e obscuro, tanto quanto a mente dos personagens.
O Último Tango em Paris causou muita controversa ao ser lançado, o que não é novidade para ninguém que conhece pelo menos um pouco da história do cinema, levando em consideração o conteúdo prestes a incendiar a tela envolvendo o casal que se mostra incapaz de se apresentarem um ao outro, bem como se separar e dar fim a esta loucura toda. Desde o primeiro instante em que se encontram, parece ser a insanidade que move os personagens, reflexo de vidas distintas, mas incrivelmente parecidas quando o assunto é descrença da vida e sentimentos, perspectiva esta que vai se modificando ao longo do filme, já que Ele e Ela se apaixonam e não serão capazes de viver longe um do outro. Passagens clássicas esquentam esta relação improvável, como os memoráveis momentos da manteiga e dos dedos de Jane dentro de Paul, que não só contribuem para chocar o telespectador, como para garantir tais passagens dentre as mais memoráveis do cinema contemporâneo.
Bem diferente de Os Sonhadores de 2003, que possuía um belo atrativo por trás da nudez, que era praticamente uma declaração de amor ao cinema, com os personagens capitaneando uma verdadeira aula sobre a arte, Bertolucci aqui até tenta realizar característica parecida, mas fracassa vertiginosamente. Para isso, cria o personagem Tom (Jean Pierre Leaud, estrela de A Noite Americana, de Truffaut, lançado no ano seguinte), só que o mesmo se mostra um completo inútil na construção da personalidade da protagonista ou da condução da história. Se no exemplar de 2003, o cinema e as referencias dentro do contexto nos permitia ajudar a compreender a mentalidade dos personagens, aqui se faz completamente desnecessária, aumentando o tédio que reina praticamente em toda a projeção. A sensação é que quando Brando não está em tela, o desinteresse aumente bruscamente, deixando tudo mais arrastado e entediante. Os diálogos e as passagens que envolvem Tom são chatas e sem cunho produtivo para o roteiro, a não ser o de encher lingüiça.
O roteiro é por muitas vezes confuso e sem nexo algum com nada, em um vai e vem amoroso que ultrapassa os limites do aceitável e do ridículo. Paul faz o que quer de Jane, ao ponto que esta não se submete a revidar em momento algum, para ao final, como se num passe de mágica, contornasse sua personalidade enfadonha e submissa, para dar lugar finalmente a uma mulher de personalidade ou caráter. Demais personagens como a sogra de Paul ou até mesmo o já citado Tom são desperdiçados e mortos com passagens inteiramente gratuitas e sem lógica para a trama e seu desenvolvimento. Bertolucci apenas insere tais personagens para preencher um espaço comum, ao invés de utilizá-los para adentrarmos mais a fundo nas mentes perturbadas dos protagonistas, como também o personagem que se revela amante da esposa de Paul, em um papel totalmente obscuro e de que nada oferece à trama.
O Último Tango em Paris é um exemplar fraquíssimo que não consegue cumprir seus objetivos de entreter, muito menos de emocionar ou chocar o público, seja lá qual for sua mensagem. Nem reflexivo o mesmo se mostra capaz de ser, já que as situações mais para o final acabem por se tornar ridículas demais e fugirem do campo do aceitável e apreciável. O desfecho não poderia ter sido pior, totalmente previsível, barato e sem criatividade, embora Brando contribuísse em deixar tudo um pouco mais verossímil e envolvente, o que obviamente, não fora necessário para salvar este filme da vergonha. Pouquíssimos momentos divertidos, pouca energia e até mesmo pouco amor, sem contar a total falta de humor ou quaisquer derivados do gênero, mesmo que por instantes. Um drama que beira o medíocre reina na maior parte da projeção, enfraquecendo o poder intimidador transmitido pelo roteiro de Bertolucci, que ao final das contas, não se passava algo limitado e só.
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