A sequência de uma declaração de amor, por Paulo, o português.
Ora bem, vamos à história pessoal outra vez! Naquilo que eu creio ter sido um golpe de sorte, vi Bonecas Russas no dia a seguir a ter visto Albergue Espanhol. Uma bela maneira de apreciar a trilogia de Klapisch, na minha opinião! Juntando a isso o facto de eu estar todo emocionado do filme anterior, o de esse dia não me ter corrido mal e o de eu estar de férias na altura, a experiência foi para lá de gratificante. Acabei a sessão encantado, embora menos do que no primeiro da trilogia. Porquê menos? Isso já vou explicar. Pronto, a história já acabou; vamos ao filme! XD
O filme começou da forma mais promissora possível, prometendo o regresso das mais bem-amadas personagens do original (se bem que houve exceção para a bela Anne-Sophie...uma pena!) e uma grande fidelidade ao anterior. Porém, se cumpriu a segunda promessa, deixou a desejar na primeira. Ou seja...logo na reta inicial do filme eu senti falta de algo. Motivo: o filme começa por prometer uma reunião daquela gente boa no casamento de William, mas depois passa praticamente 90 minutos sem o mostrar! Durante grande parte da primeira hora do filme - a parte mais aborrecida da obra, por sinal - eu só pensava "Está bem, está bem; deixa lá isso. Onde está o grupo de Barcelona, onde está o casamento?". É assim, eu percebo que quisessem mostrar o ano de Xavier e de outros para dar um contexto ao casamento, mas deixar assim o espetador à espera de algo que ainda vai demorar bastante é um pouco contraproducente. Tira a atenção do espetador para o que vem antes. E esse truque narrativo do eu-vou-falar-de-X-mas-antes-vamos-recuar-um-ano é uma jogada arriscada que poucos conseguem dominar com mestria. How I Met Your Mother conseguiu.
Assim, a primeira metade do filme tem essa sensação de carência. O que é uma pena. Por outro lado, como disse, cumpre a promessa de ser fiel ao original; quem se afeiçoou a Xavier ou à sua história de vida deve gostar. De resto, o filme acerta ao dar destaque à adorável Wendy. Antes uma bonequinha fofa, agora simplesmente uma mulher linda. E aquele sotaque continua um charme, hehe...na sequência do meu comentário para Albergue Espanhol, achei que Wendy foi a melhor escolha como personagem a recuperar. E como par romântico para Xavier. Ainda bem que deram mais tempo no ecrã a Wendy, pois até aí o filme não estava tão interessante assim.
Muita coisa acontece pelo meio, ainda sem mostrar o bendito casamento. A cena em que William conhece Natasha é a melhor desse período, se não contarmos com as cenas que juntam Wendy e Xavier. Mas todo, todo o restante, pura e simplesmente empalidece, desvanece, verga-se ante um e um só momento, uma pérola do cinema discretamente colocada no meio deste belo mas modesto filme: o discurso de Wendy no comboio. Uma das cenas mais delicadas, comoventes e belas que a sétima arte já nos trouxe! É incrível como cada palavra e cada sorriso sincero causam mais e mais comoção!
It's just how I am.
...
Maldição, Wendy, não acredito que disseste isso! Como é que é possível? Como é que alguém pode reagir a isso? Seja o espetador ou o próprio Xavier. Que é que ele pode responder? Depois de um discurso desta magnitude, tudo o que ele disser pode parecer...banal!
De tantos detalhes grandiosos que esta cena tem, destaca-se um: ela é completamente inesperada! Aparece assim, puf!, sem que nada a faça prever. Porque quem diria que Wendy se sentia assim? Alguém desconfiava que Xavier significava assim tanto para ela? Sei lá, este discurso aparece de repente; Xavier e Wendy namoram, Xavier vai viajar, chegam à estação...e de repente aquilo! Uma pessoa, no meio da comoção, fica a pensar: "Wow...de onde é que isso veio?". E imagino que Xavier também tenha ficado assim (teria havido um bocado de sentimento de culpa no olhar dele?). Pois é, Xavier, és um homem com sorte. Tomara muitos conviver com uma ruiva linda que fosse capaz de lhe dedicar um discurso tão belo e honesto. Se eu estivesse no teu lugar, Xavier, esquecia Celia e ficava com a maravilhosa Wendy.
Só que não. Eu não sei o que faria se estivesse no lugar de Xavier. Aliás, eu não devo julgá-lo com severidade justamente porque não estou na pele de Xavier. Já diz o ditado, e muito bem: "Quem não passa por ela arma-se em forte.". Acontece que nenhum de nós sabe pelo que Xavier passou até aí, por isso não é justo censurá-lo. Não sei o que eu faria; talvez fosse na mesma e terminasse a relação com Celia, talvez ficasse logo ali com Wendy, talvez até apanhasse o comboio e, consumido pelo arrependimento, apanhasse logo o comboio de volta. Esta última é bem provável, tendo em conta como eu sou "maluquinho"...mas não sei, é impossível saber o que eu faria. Mas sei uma coisa: que a declaração de Wendy me deu vontade de a abraçar e chorar de comoção. Quão tocante é o teu amor, Wendy...
Depois de uma cena tão impactante, fica difícil não torcer por que Wendy e Xavier dêem certo - o tapa que Wendy dá mais tarde a Xavier mais parece um tapa na cara do espetador. Seja como for, Xavier segue o seu caminho e, consequentemente, também o filme. Seguem-se algumas cenas, umas melhores e outras piores. Até que os 7 amigos se juntam para o bendito casamento. Depois de hora e meia de filme! Já não era sem tempo...naturalmente, devido ao tapa - o físico, sim, mas sobretudo o metafórico - o ambiente está mais tenso, mas isso faz parte. O filme sobe consideravelmente no interesse e...bem, temos o final com a fofa e desejada reconciliação. Ainda bem! :) E os créditos acompanham-na com serenidade e respeito (Deus do céu, que música linda!)
Com tudo isto, Bonecas Russas mostra-se um digno sucessor do primeiro da trilogia, com duas horas de qualidade. É provavelmente um filme melhor quando revisto - eu acho, pelo menos -, pois na revisão já estamos prevenidos para a forma como Klapisch nos promete o casamento e nos deixa, carentes, à espera dele durante um bom tempo (aff, isso não interessa, salta lá para o casamento!). E a fidelidade ao primeiro filme está lá, em tudo. Sim, até na ingenuidade! Porque esta sequência continua a fazer uso da "fantasia" na sua história. E nem estou a falar de Xavier e Wendy viverem bem da sua escrita porque isso, embora seja uma lotaria, é possível. Não; estou a falar mais do D. Juan Xavier. É que, ao longo do filme, o francês tem um total de quatro - sim, quatro - parceiras sexuais. Ou cinco, se contarmos com Isabelle (ba dum tss! :D). Não deixa de ser interessante que toda a ação do filme se passe no período de um ano. É que, de acordo com as estatísticas, sabem qual é a média de parceiros sexuais que o adulto comum tem entre os 25 e os 44 anos? Seis! Seis parceiras num período de 19 anos! E Xavier consegue quatro em apenas um ano! Dá um tempo!
Note-se que não estamos a falar de casos de uma só noite; falamos daquilo a que Xavier chamou "namorada". A que mais se aproxima de ser um caso de uma só noite é Martine, mas mesmo essa esperava um relacionamento mais duradouro. Além de que ela e Xavier tinham um passado. Enfim...há mais exemplos de ingenuidade ao longo da sessão, mas este é dos mais evidentes.
Para os devidos efeitos (expressão adorável, hehe...), conclui-se que Bonecas Russas é um filho legítimo do anterior, o que a meu ver é muito bom. Não é tão caloroso quanto o anterior, nem tão preciso, nem tão cativante, mas tem a mais valia do casal Xavier-Wendy (bolas, isto de não lhes darem um sobrenome é tramado! :P), do casamento e do monólogo assustadoramente bonito de Wendy. É uma boa escolha para uma comédia romântica e a forma ideal de qualquer pessoa se apaixonar pela linda Kelly Reilly - não vou esquecer o que fez aqui, sra. Reilly! Tem aqui um fã para a vida!
Ah, e...voltar a relegar Soledad para um papel em que não faz quase nada? Nada bom, sr. Klapisch; nada bom.
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