Christopher Nolan revolucionou os filmes de super-heróis com “Batman Begins” em 2005, e elevou a algo muito maior em 2008, com “O Cavaleiro das Trevas”, que superou as expectativas do público e dos críticos. Quatro anos depois, Nolan retorna com o terceiro e último filme de uma franquia que renovou o homem morcego e todos os filmes do gênero, com “O Cavaleiro das Trevas Ressurge”, que consegue igualar-se ao dito insuperável filme anterior e, até mesmo, em alguns momentos, ser superior ao que teve como destaque Heath Ledger como o perverso e psicopata Coringa.
E já que o Coringa, o tradicional vilão de Batman, foi citado, começarei a crítica falando do tão comentado vilão Bane, interpretado por Tom Hardy. A cena inicial do longa, semelhante à primeira do anterior, começa nos introduzindo a uma sequência que tem como função mostrar o vilão que Batman enfrentará e toda a periculosidade que há em torno de si. A estória começa com o sequestro – liderado por Bane – de um avião que está transportando um físico nuclear, Dr. Pavell, que vai servir para muitos planos destrutivos do vilão. É realmente uma sequência muito bem filmada e dirigida, embalada por uma trilha sonora explosiva, forte e tensa que Hans Zimmer compôs. Na cena, podemos perceber toda a aura brutal e sinistra que Bane possui, seja pela sua voz grossa e abafada pela máscara, que dá um tom de monstruosidade e crueldade, seja pelo olhar que Tom Hardy insere para mostrar o quão maldoso e perigoso é seu personagem, que tem a grande missão de substituir o insuperável Coringa do filme anterior, que teve a atuação insana e inquieta de Heath Ledger, o qual imprimiu uma personalidade única para o mais famoso dos inimigos do homem morcego. Tom Hardy, felizmente, não faz feio. Sim, aqui não temos cenas em que o ator realmente se solta, mostra toda a sua maldade de forma nua e crua como o Coringa, até porque Bane é um personagem com outras intenções, com outros costumes, com outras concepções, mesmo que o cerne seja a mesma anarquia desejada pelo Coringa, mas um personagem mais sóbrio, menos carismático, mais sério e mais contido. O roteiro e a direção de Christopher Nolan, principalmente, são essenciais para mostrar o poder e força física e psicológica que ele é capaz de gerar nas pessoas – Bane aparece quase sempre acima da câmera, o que dar a ele um ar de superioridade e autoridade. O roteiro tem a responsabilidade em mostrar todos os seus maléficos planos, que tem como função destruir a cidade de Gotham, tornando-a, praticamente, uma cidade apocalíptica, com explosões em série, prédios sendo explodidos, pontes sendo derrubadas, um estádio de futebol americano sendo alvo de bombas e outra série de acontecimentos apavorantes, como a tomada da cidade por perigosos criminosos, que saem da prisão e tomam casas, destroem lares, assaltam pessoas, tudo que Gotham City já presenciou e nós, como espectadores, também, mas em proporções muito maiores. Se antes o Coringa apavorava as pessoas e inquietava e deixava Bruce Wayne cheio de dúvidas com suas ameaças psicológicas, Bane ameaça de forma física e brutal, espancando Batman até seu limite e deixando uma grande interrogação na cabeça de quem assiste: qual será o limite de tamanha força brutal?
A estória, como sempre, mantém o tom real que Christopher Nolan resolveu inserir nessa trilogia, porém “O Cavaleiro das Trevas Ressurge” é o menos real dos três, o que possui cenas de ação muito mais épicas e grandiosas que qualquer outro dos dois filmes passados. Como já dito, as proporções que a trama toma são gigantescas. Aqui há a ameaça de uma bomba nuclear destruir a cidade de Gotham e realmente levá-la a seu fim. E para suprir tanta ameaça, Bruce Wayne terá que – depois de oito anos recluso em sua enorme mansão, sob os cuidados do mordomo Alfred – voltar à ativa, por meio do pedido do jovem policial John Blake, depois de o Comissário Jim Gordon sofrer um grave acidente em um dos esgotos das ruas de Gotham, ao estar investigando os movimentos suspeitos que a parte subterrânea da cidade está presenciando desde a chegada de Bane.
E as coisas não estão mal apenas para a alegórica cidade, mas também para Bruce Wayne, que está fraco e debilitado, aposentado da armadura de Batman há oito anos, depois da morte de Harvey Dent, o que ocasionou a reclusão do símbolo de Gotham City e sua culpa pela morte do “incorruptível” promotor. Tudo muda, porém, quando Selina Kyle entra em sua vida, ou melhor, em seu quarto, fazendo com que Bruce perceba que a sensível e aparentemente fraca serviçal da mansão tem, pendurado em seu pescoço, um colar que era da mãe do protagonista. A aparente sensibilidade de Selina, em poucos segundos, desfaz-se, e vemos surgir uma incrível Mulher-Gato, que mesmo não tendo seu alter-ego pronunciado uma vez sequer durante as duas horas e trinta e cinco minutos do filme, nem tenha seu chicote e o miado de gato, cumpre seu papel com uma eficiência tão grande que temos várias cenas sensuais e brutais da personagem, atuada de forma inspirada e maravilhosamente bem pela linda Anne Hathaway, que vinha sendo alvo de dúvidas dos fãs e dos críticos, mas que graças ao seu talento, sua beleza e sensualidade, consegue roubar todas as cenas em que aparece – e que não são poucas – e carimbar sua passagem pela trilogia de Nolan de forma louvável, seja pelo seu jeito misterioso de andar, e principalmente de falar – note que Anne respira pouco durante as falas, reforçando sua maneira cautelosa e perspicaz de roubar, ser irônica, ser sensual e ser misteriosa. (As sequências em que Selina Kyle aparece pilotando a moto de Batman são inesquecíveis, seja pelas piruetas que dá, seja pela empinada que dá em seu corpo). Aos poucos, Bruce Wayne vai conhecendo melhor a personagem, é roubado por ela, mas mesmo assim confia – duas vezes – uma missão muito importante a ela. Primeiramente, Bruce Wayne como Batman, propõe dar-lhe o Ficha Limpa – um equipamento ideal para apagar os dados da ladra das delegacias de polícia –, mas com uma condição: levá-lo a Bane e acabar com todas as ameaças que esse representa à cidade. No entanto, a ladra trai a confiança do milionário, já que sua vida corria perigo, pois ameaçou Bane e John Dagget, o chefe daquele, que contratou-a para roubar as digitais de Wayne para planejar assumir a presidência da Wayne Enterprises. Resumindo: Selina entrega Batman para Bane.
E é justamente neste período dos acontecimentos, que o terceiro filme dessa franquia toma proporções nunca antes vistas num filme de Batman. Agora mais do que nunca, Bruce Wayne está vulnerável às crueldades e planos de Bane e sujeito a condições subumanas na prisão inferno em que Bane, diz a lenda, viveu durante toda a infância, uma prisão subterrânea praticamente impossível de fugir. E enquanto isso, vemos a cidade tão corrompida e propensa à corrupção em chamas, nas mãos dos criminosos mais horrendos da cidade, liderados por Bane, e a população trancada em suas casas, temerosas em relação às suas vidas e o que poderá acontecer a elas e às suas famílias, já que uma boa parte da polícia da cidade está soterrada sobre escombros ocasionados pela destruição em massa que as bombas detonadas por Bane causaram. Batman e Jim Gordon conseguiram, durante oito anos, manter a ordem na cidade pela Lei Harvey Dent. Foram oito anos de paz, de uma tranquila paz, proporcionada por uma mentira arranjada por Gordon e Wayne. Uma mentira, que se revelada, pode acabar com a ordem na cidade. E é justamente isso que acontece com o decorrer dos acontecimentos. Aos poucos o crime volta a tomar conta da cidade, até o terror predominar e Gotham entrar num período que nunca havia entrado: num estado de sítio.
Gotham não tem mais prefeito; está sob o comando do povo, ou melhor, dos criminosos. Os policiais que não ficaram soterrados por meses nos escombros, corriam riscos de vida ao ficarem nas ruas. Eram caçados como cachorros pelos perigosos ex-presidiários. O terror gerado pelo vilão foi total. E Batman, o guardião da noite, o guardião silencioso, um Cavaleiro das Trevas, preso numa cela apertada, com dores extremas no corpo, num lugar distante de sua Gotham.
Um filme tão intenso e tenso como “O Cavaleiro das Trevas Ressurge” – marcado por uma direção espetacular de Christopher Nolan, que confirma de uma vez por todas o seu talento no cinema – é marcado por uma trilha sonora forte e explosiva, pautada por batidas fortes e pesadas para expressar todo o tom de urgência que a estória tem para oferecer. Se uma excelente trilha sonora de Hans Zimmer ainda não é o suficiente para carimbar num filme todo o tom de urgência, temos uma excelente montagem, que mais uma vez destaca-se em criar sequências que mostram diversas cenas acontecendo ao mesmo tempo em locais diferentes, o que só faz aumentar a tensão que permeia do primeiro ao último segundo do longa. A fotografia, diferentemente do filme anterior, apresenta cores mortas e escuras, num tom por vezes azul. É uma imagem pesada – uma alegoria de que Gotham está passando por um grande inverno, sem esperança, sem chances de voltar a ser o que foi, sem nunca ter sido, pois por mais tranquilidade que a cidade tenha passado durante oito anos, a criminalidade nunca deixou de tomar conta da cidade, pelo contrário, esteve mais ativa do que nunca, mas por debaixo dos lençóis.
“O Cavaleiro das Trevas Ressurge” consegue se igualar a “O Cavaleiro das Trevas”, disso não há a menor dúvida. Claro que há muitos defeitos neste último filme, algo que não teve no segundo, mas fomos compensados com outros privilégios que os outros dois não tiveram. Um dos defeitos, e o principal deles, foi a tão comentada personagem Miranda Tate, de Marion Cotillard, que começa como uma personagem qualquer, aparece pouco durante a projeção, mas aos poucos vai ganhando um maior espaço, mesmo sem mostrar a que veio, apenas nos minutos finais do filme. O problema não reside aí, mas sim pelo fato de ser uma estória inventada de forma visivelmente forçada. O segundo filme quase de nada dependia dos acontecimentos do primeiro filme, que mostrava a Liga das Sombras de Ra’s Al Ghul. O primeiro filme mostrou uma coisa e o segundo mostrou outra completamente diferente no que diz respeito aos inimigos de Batman. Obviamente que nunca passou na cabeça de Nolan que Heath Ledger morreria em 2008. Isso complicou as coisas, e por isso foi preciso voltar à Liga das Sombras, pois certamente se Ledger não tivesse morrido, ele estaria de alguma forma neste filme. Com isso, foi preciso criar toda uma interligação com o primeiro filme, para dar aquela sensação de entrançamento entre os filmes. Não digo que não gostei de Miranda Tate, pelo contrário, gosto de personagens que crescem durante uma estória, mas seu papel poderia ter sido melhor formulado. Outro ponto que deve ser levado em conta de forma negativa são algumas soluções fáceis que o roteiro toma, como, por exemplo, a morte de um personagem, que merecia um toque mais especial e épico. Contudo, se houve pontos negativos, Christopher Nolan nos brinda com cenas de ação nunca antes vistas em nenhum dos outros dois filmes. Temos a sequência da explosão das bombas, dando um tom de grandiosidade nunca antes proporcionada, e à batalha final, entre a polícia e os criminosos, e Batman e Bane, sem falar da perseguição de Batman no veículo voador Morcego a um personagem que não deve ser mencionado, e claro, à Selina Kyle na moto do Batman. E para tantas cenas de ação bem orquestradas, é preciso excelentes efeitos visuais, os quais são absolutamente espetaculares, praticamente sem nenhum defeito – a única cena que tem efeitos artificiais é quando Batman vê-se cercado pela polícia, dá um tiro de canhão num guincho, e pega impulso com a moto –, mas toda a cena de destruição do campo de futebol, a sequência das bombas destruindo parte da cidade, dos mísseis perseguindo o Morcego, e a tantas outras, apresentam efeitos especiais de excelente qualidade, convincentes e realistas que devem ser indicados ao Oscar de Efeitos Visuais e provavelmente ganhe, dependo dependendo da qualidade dos de “O Hobbit”.
Com todos os atributos que os outros dois não tiveram, “O Cavaleiro das Trevas Ressurge” consegue compensar alguns equívocos que cometeu e fechar com chave de ouro uma franquia que deu seriedade e respeitos aos filmes de super-heróis, que surgem aos montes em Hollywood, mas nenhum com a qualidade de “Batman”, de Nolan. É sem dúvidas um filmaço, com um bom roteiro, boa direção, boas atuações, bons efeitos visuais, boa montagem e edição, e sem dúvidas um dos melhores filmes desse ano e o melhor do gênero desse ano, deixando todos os outros do gênero para trás no seu conjunto completo. Filme que merece ser visto e revisto nas telas grandes e em casa, quando for lançado em DVD e Blu-Ray.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário